Audiência de Custódia: Os Limites da Atuação do Juiz e a Garantia dos Direitos Fundamentais
Introdução
A audiência de custódia, instituída no ordenamento jurídico brasileiro por meio da Resolução nº 213/2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), é um instrumento essencial para a garantia dos direitos fundamentais dos indivíduos submetidos à prisão. Nesse contexto, o juiz desempenha um papel crucial na condução da audiência, devendo atuar dentro dos limites legais e constitucionais. Este artigo tem como objetivo analisar os limites da atuação do juiz na audiência de custódia, à luz dos princípios e normas que regem o processo penal brasileiro.
Fundamentos Jurídicos da Audiência de Custódia
A audiência de custódia encontra respaldo em diversos dispositivos legais e internacionais. O artigo 7º, item 5, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), da qual o Brasil é signatário, prevê que toda pessoa presa deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz. No âmbito nacional, o artigo 5º, inciso LXII, da Constituição Federal estabelece que a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente.
Além disso, o Código de Processo Penal, após a alteração promovida pela Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime), passou a prever expressamente a realização da audiência de custódia no artigo 310, determinando que, em até 24 horas após a prisão em flagrante, o preso deverá ser conduzido à presença do juiz para ser ouvido.
Limites da Atuação do Juiz na Audiência de Custódia
Durante a audiência de custódia, o juiz deve atuar dentro dos limites estabelecidos pela lei e pela Constituição Federal, sempre observando os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Alguns aspectos importantes da atuação do juiz incluem:
- Verificação da legalidade da prisão: O juiz deve analisar se a prisão em flagrante foi realizada em conformidade com os requisitos legais, avaliando a existência de indícios de autoria e materialidade do delito.
- Análise da necessidade e adequação das medidas cautelares: O juiz deve verificar se a prisão preventiva é necessária e adequada, considerando a gravidade do crime, as circunstâncias do caso concreto e a presença dos requisitos previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal. Caso entenda que a prisão preventiva não é cabível, o juiz pode aplicar medidas cautelares diversas, como a fiança, o monitoramento eletrônico ou a proibição de manter contato com determinadas pessoas.
- Vedação à discussão do mérito: Na audiência de custódia, o juiz não deve adentrar no mérito da acusação, evitando antecipar um juízo de culpabilidade. O objetivo da audiência é verificar a legalidade da prisão e a necessidade de medidas cautelares, não sendo o momento adequado para a produção de provas ou a análise aprofundada do caso.
- Garantia do direito ao silêncio: O juiz deve assegurar ao preso o direito de permanecer em silêncio, não podendo interpretar o silêncio em prejuízo da defesa, conforme prevê o artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal.
- Investigação de indícios de tortura ou maus-tratos: Caso o preso alegue ter sofrido tortura ou maus-tratos durante a prisão, o juiz deve adotar as medidas cabíveis para a investigação das denúncias, acionando os órgãos competentes, como a Corregedoria da Polícia e o Ministério Público.
- Imparcialidade e equidistância: O juiz deve manter uma postura imparcial durante a audiência de custódia, tratando a acusação e a defesa com equidistância e evitando emitir juízos de valor sobre o caso.
Conclusão
A audiência de custódia é um instrumento fundamental para a garantia dos direitos dos indivíduos submetidos à prisão, permitindo o controle judicial imediato sobre a legalidade e a necessidade da medida. O juiz, como figura central na condução da audiência, deve atuar dentro dos limites estabelecidos pela lei e pela Constituição Federal, observando os princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.
A atuação do juiz na audiência de custódia deve ser pautada pela verificação da legalidade da prisão, pela análise da necessidade e adequação das medidas cautelares, pela vedação à discussão do mérito, pela garantia do direito ao silêncio, pela investigação de indícios de tortura ou maus-tratos e pela manutenção da imparcialidade e equidistância em relação às partes.
Somente com o respeito aos limites da atuação do juiz e com a observância das garantias fundamentais do preso, a audiência de custódia poderá cumprir seu papel de salvaguarda dos direitos humanos e de promoção de um processo penal mais justo e equilibrado.
Referências:
- Constituição Federal de 1988
- Código de Processo Penal
- Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica)
- Resolução nº 213/2015 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
- Lei nº 13.964/2019