Agravo em execução

EXMO. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DE EXECUÇÕES PENAIS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

CES 000000/04881-1

Rg: 

, já qualificado nos autos do processo, vem, pelo Defensor Público infra-assinado, não se conformando com a decisão de fls. 0006/0007 que RECONSIDEROU a decisão que havia deferido pedido de comutação interpor o presente recurso de

Agravo à Execução

com fulcro no art. 10007 da Lei 7210/84, pelos fundamentos de fato e de direito apresentados nas razões anexas.

Indica, nessa oportunidade, as peças a seguir relacionadas a serem transladas, necessárias à formação do instrumento:

Carta de Execução de Sentença, fls. 02;

Folha de cálculo de pena, fls. 20/21 ;

Parecer do Conselho Penitenciário fls. 3000/40;

Ficha disciplinar, fls.61;

Decisão Agravada, fls. 0006/0007.

Nestes Termos,

P. Deferimento.

Rio de Janeiro, 08 de novembro de 2019.

RAZÕES DE AGRAVANTE

Agravante: 

EGRÉGIO TRIBUNAL, 

COLENDA CÂMARA 

Em que pese a acuidade, o espírito humanitário e profundo conhecimento da ciência jurídica, o MM. Juiz prolator da decisão agravada, não fez desta vez a costumeira justiça ao reconsiderar a decisão que havia deferido COMUTAÇÃO DE PENA formulado pelo agravante.

O recorrente, com base no Decreto nº 3.226/000000, em seu art. 2º, requereu a concessão da comutação de pena, vez que preenchia todos os requisitos objetivos e subjetivos necessários, a saber, lapso temporal, não cometimento de falta grave nos últimos doze meses e pareceres favoráveis 

Contudo, o i. Juízo a quo , em interpretação extensiva, estendeu o art. 7º do Decreto Presidencial, por disposição expressa, aplicável somente ao indulto, também ao benefício da comutação, e consequentemente indeferiu este benefício por ter o Requerente, em evidente desrespeito aos princípios insculpido na Constituição da República Federativa do Brasil e no direito material e processual penal.

Urge esclarecer que conforme entendimento já pacificado a concessão de indulto e comutação é medida de natureza extraordinária, de competência privativa do Presidente da República (art. 84, XII e parágrafo único da CRFB/88), que pode, portanto, impor restrições ao benefício, assim, não se discute quanto ao não cabimento de indulto aos crimes hediondos  e aos praticados com emprego de arma, em que pese a injustiça cometida. Porém, como a elaboração do Decreto por previsão constitucional é atribuição do Presidente não pode o julgador, por entendimento próprio, ampliar a incidência da restrição, não apenas pela possibilidade de desvio de função, como também por constituir violação às notórias regras constitucionais. 

A fundamentação esposada na decisão ora agravada de que haveria de se entender a comutação como uma subespécie de indulto não merece prosperar, pois além da desconformidade com todas as regras de hermenêutica existentes, viola, também, o senso lógico em comparação aos Decretos dos anos anteriores, que estendiam, expressamente, as restrições à concessão do indulto ao benefício da comutação, que ora se requer.

Inobstante as considerações já expostas com relação a tese da decisão agravada da vedação da possibilidade de obtenção da COMUTAÇÃO pelo apenado por força do emprego da arma de fogo, que não merece prosperar conforme orientação dos princípios basilares do direito penal e das regras de interpretação, o que com todo o rigor se demonstra.

Como é cediço, comutação “é indulgência consistente em se mudar ou tocar (comutar) uma pena por outra. É substituir a primitivamente imposta, que era de caráter mais grave por outra mais benigna ou menos grave” (Vocabulário Jurídico, 4ª ed. Ed. Forense, de Plácido e Silva, PAG, 460), ao passo que indulto, derivado do latim indultus, significa perdoar, indulgenciar.

Cumpre consignar, também, a área de incidência dos efeitos de ambos, delimitando as suas consequências. Ora, a comutação é causa de DIMINUIÇÃO DA PENA, enquanto que o Indulto é causa de EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE, atingindo os efeitos executórios penais da condenação, abrangendo as medidas de segurança e as penas acessórias, inobstante deixe íntegros os efeitos da condenação na esfera da responsabilidade civil.

Diga-se que, muito embora, ambos tenham assento Constitucional, como originários de ato privativo do Presidente da República, abrangendo, de forma genérica, a todos os que preencham os requisitos exigidos no Decreto, não se pode tratá-los como espécie e gênero.

Isto porque, com efeito, não existe extinção parcial da punibilidade! O âmbito de realização de consequências, são diversos, aquela diminui o tempo de cumprimento da pena, e este a elimina.

Ademais, se assim o entendesse, o legislador não precisaria lançar mão de novo vocábulo, bastaria consignar as condições para a concessão do Indulto parcial.

Neste sentido, vale colacionar a ementa abaixo;

“Não se confunde indulto com comutação de vez que, no primeiro há perdão da pena, ao passo que na segunda se dispensa o cumprimento de parte da pena. O indulto, tal como dispõe o art. 107, II, do CP é causa de extinção da punibilidade, o que não ocorre com a comutação que é tão-somente uma simples diminuição do quantum da reprimenda, um abrandamento da penalidade” (TJSP – Rec. Rel. Weiss de Andrade – RJTJSP 33/247).

Merece aduzir que, sob o ponto de vista da interpretação, também não há amparo legal para deixar de concedê-lo. Senão vejamos:

Convém trilhar-se o caminho dos princípios e regras de hermenêutica, salientando-se que: a lei não contém palavras inúteis; aonde o legislador não impôs restrição, não cabe ao intérprete fazê-lo e por fim, em matéria penal, a interpretação deverá sempre ser in dubio pro réu.

Ora, a dúvida surgiu por conta da supressão do parágrafo único do art. 2º, que tratava da Comutação, e que, sempre consignou a impossibilidade de obtenção de Comutação aos delitos hediondos e equiparados, bem como com relação ao item IV do art. 7º em confronto “esteja sendo processado” e “condenado”.

Com efeito, em que pese a discussão, fica clara a intenção do legislador em seguir a teoria moderna do direito penal liberal, em que se diminui ou substitui a pena privativa de liberdade, pois na dúvida, caso houvesse,  dever-se-ia seguir a mens legis, sendo retirada a restrição relativa ao indulto da comutação de pena. 

Fugir do raciocínio aqui traduzido é violar a Constituição, é chamar a si ato privativo do chefe do Poder Executivo, conforme já mencionado no art. 84, VII da CRFB/88, é criar novo Decreto, impondo restrições inexistentes. Repita-se, a lei não contém palavras inúteis, não cabendo ao intérprete limitar, onde não há previsão legal.

Neste sentido, permite-se a defesa colacionar a ementa a seguir:

“O decreto concessivo de indulto deve ser interpretado em sentido amplo. Desde que o texto legal não faça restrição a que a comutação atinja aqueles que já a obtiveram anteriormente, ou os que se encontram gozando os benefícios do livramento condicional, nada impede que possam ser atingidos por nova comutação” ( TJSP rec. Rel. Weiss de Andrade, RJTJSP 33/247).

Cabe colacionar, ainda, recente decisão da 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça deste estado, no HC nº 3.204/000000, tendo como relator o Des. Sérgio Verani:

“H.C. EXECUÇÃO. COMUTAÇÃO DE PENA. DECRETO Nº 3.226, DE 2000.X.000000. APLICABILIDADE AO CONDENADO POR CRIME HEDIONDO. O Decreto nº 3.226/000000 (Indulto de Natal) estabelece que o “o indulto não alcança os condenados por crimes hediondos” (art. 7º, I), mas ao contrário dos Decretos anteriores, não estende tal restrição à comutação, cujos requisitos para o seu benefício estão limitados aos artigos 2º e 3º desse Decreto. 

Se a norma do art. 7º refere-se apenas ao indulto, não se pode ampliar o conteúdo dessa norma penal, criando-se uma restrição não prevista legalmente. A hermenêutica, em Direito Penal, é restrita, não se podendo estender o alcance da norma em desfavor do condenado, excluindo-se o seu direito à comutação. 

Ordem concedida parcialmente.” (Acórdão – H.C. nº 2012.05000.03204 – TJRJ – 5ª Câmara Criminal – Rel. Des. Sérgio Verani).

  Pedimos vênia para transcrever trechos do voto do Presidente do aludido acórdão, que enfoca hipótese absolutamente igual à do caso, e que esperamos seja a decisão, a ser exarada no presente processo, exatamente igual a que passaremos a transcrever:

“ O advogado Dr. Fábio Santos Carreiro impetrou Habeas-Corpus em favor de Vanderlei de Oliveira Souza, apontando como autoridade coatora o Juízo da Vara de Execuções Penais – VEP, da Comarca da Capital, alegando que o Paciente tem direito à comutação da pena, conforme o Decreto 3226, de 2000.10.000000, mas esse direito foi indeferido ilegalmente, pois o art. 7º daquele decreto refere-se apenas ao indulto, vedando-o para os crimes hediondos, não mencionando a comutação; alega também que o cálculo da pena está equivocado…e pede que seja cassada a decisão que indeferiu a comutação…

Parecer do Procurador de Justiça a fls. 4000/4000v, opinando pela denegação.

O Decreto nº 3226/000000, estabelece, no seu art. 7º , I, que “o indulto previsto neste Decreto não alcança os condenados por crimes hediondos e pelos crimes de tortura, terrorismo e tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins”.

Esta restrição, ao contrário do que dispunham os Decretos anteriores – “os benefícios previstos neste Decreto não alcançam” – não abrange a comutação, pois é limitada expressamente ao indulto. E não se pode ampliar o alcance da norma, face a natureza restrita da hermenêutica em Direito Penal. Se a norma se refere apenas ao indulto, limitando a sua abrangência, não se pode estender o conteúdo dessa norma à comutação, cujos requisitos constam dos artigos 2º e 3º.

O Decreto 3.226/000000 pretendeu minorar, um pouco, o excessivo e desumano rigor com que se tratam os crimes hediondos…

Nenhuma contradição existe nesta nova regulamentação do Decreto 3226. O indulto e a comutação, modalidades do histórico direito de graça, têm pressupostos diferentes para a sua concessão, e diferentes são os resultados da sua aplicação. Por isso mesmo, aparecem diferenciados no Decreto 3.226/000000. 

Assim, não se pode aplicar à comutação o disposto no art. 7º desse Decreto…

Concede-se a ordem, parcialmente, para desconstituir a decisão que indeferiu a comutação, outra proferindo-se desconsiderando-se a proibição do art. 7º , do Decreto 3.226, de 2000.10.000000.” 

A defesa, espera e confia que seja acatado a mens legis, conferindo-se ao apenado a COMUTAÇÃO, como forma de efetivação do respeito dos direitos fundamentais do homem em limitação ao poder de punir do Estado, refletindo-se tal decisão o acatamento ao princípio da legalidade.

    Assim, os doutos conhecimentos jurídicos que tão bem caracterizam esta Colenda Corte, o emprego da equidade e o senso humanitário que regem os atos de tão importantes autoridades, certamente, serão luzes para um julgamento justo e equânime.

Confiando no alto espirito de Justiça desta Colenda Côrte e nos conhecimentos jurídicos que certamente serão trazidos à baila pelos Eméritos Julgadores, o agravante requer e espera que o presente agravo seja conhecido e provido, para que lhe seja concedido o benefício da comutação de pena, nos termos do art. 2º, do Decreto nº 3.226/000000.

Salienta, outrossim, para fins específicos de PREQUESTIONAMENTO, que o não provimento do presente Agravo, nos termos supra explanados, levaria à ofensa aos princípios constitucionais fundamentais da legalidade estrita, do favor rei e do devido processo legal, insertos no art. 5.º, caput, incisos II, XXXIX, LIV, da Carta Magna, e do art. 1.º do Código Penal, art. 2.º do Decreto 3.226/000000 e art. 2.º da Lei 8.072/0000.

Nestes Termos,

P. Deferimento

Rio de Janeiro, 08 de novembro de 2019.