Agravo em execução
EXMO. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DE EXECUÇÕES PENAIS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
CES 2002/0300022-0
RG: 841520003-3
, já qualificado nos autos, vem, pelo Defensor Público infra assinado, não se conformando com a decisão de fls. 105/106; que indeferiu pedido de comutação interpor o presente recurso de
Agravo à Execução
com fulcro no art. 10007 da Lei 7210/84, pelos fundamentos de fato e de direito apresentados nas razões anexas.
Seguem, nessa oportunidade, as peças a seguir relacionadas, necessárias à formação do instrumento:
Carta de Execução de Sentença, fls. 2;
Folha de cálculo de pena, fls70/71.;
Ficha disciplinar, fls. 65/ 68;
Decisão Agravada, fls. 105/106;
Nestes Termos,
P. Deferimento.
Rio de Janeiro, 27 de maio de 2019
RAZÕES DE AGRAVANTE
Agravante
RG: 1283428000-6
CES: 2002/0300022-0
EGRÉGIO TRIBUNAL,
COLENDA CÂMARA,
O Agravante não se conformou com a r. decisão recorrida que indeferiu o pedido de COMUTAÇÃO DE PENA formulado pelo agravante e, não obstante o brilho do magistrado que a proferiu, merece ser reformada pelas razões abaixo aduzidas:
Trata-se de Apenado condenado por infringência ao art. 214 do Código Penal c/c art.000 da Lei n. 8.072/0000 à pena de 0000 anos de reclusão, com regime inicial de cumprimento estabelecido como o SEMI-ABERTO que cumpriu mais de 1/4 da pena antes de 25/12/000000 e que não cometeu qualquer falta grave, conforme faz prova cópia do cálculo de pena e do histórico disciplinar. Ou seja, o Recorrente não incidiu na prática de crime hediondo uma vez que somente o estupro e atentado violento ao pudor com lesão corporal grave ou morte foram tratados como hediondos pela Lei 8072/0000, conforme entendimento proclamado pelo Supremo Tribunal Federal. Assim, com base no art. 2º do Decreto nº 3.226/000000, tem direito à comutação de pena, vez que preenche todos os requisitos objetivos e subjetivos necessários, a saber, lapso temporal, não cometimento de falta grave nos últimos doze meses, sendo certo que os pareceres da CTC e do Conselho Penitenciário são favoráveis.
Contudo, o i. Juízo a quo, indeferiu o benefício sustentando que a comutação é espécie do gênero indulto e, com isso, não pode ser concedida ao condenado por crime hediondo. Tal fundamento, evidentemente, não se aplica ao caso dos autos, pois o delito cometido pelo Agravante não é considerado hediondo, pois, consoante se vê da cópia da denúncia e sentença, não teve como resultado lesão corporal grave ou morte.
Ora, se o delito pelo qual foi condenado o Recorrente não foi alcançado pela Lei 8072/0000, não há qualquer óbice à comutação de pena e, consequentemente, não tem sentido a discussão sobre a natureza jurídica do citado instituto. Em verdade, sequer há óbice ao indulto previsto no Decreto 3226/000000, vez que o Agravante é primário e cumpriu mais de 1/3 da pena antes de 25/12/000000.
Transcreve-se, por oportuno, a tônica da posição jurisprudencial a respeito:
“PENAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. FORMA SIMPLES. CLASSIFICAÇÃO COMO CRIME HEDIONDO. COMUTAÇÃO DE PENA. INDULTO. POSSIBILIDADE.
O Supremo Tribunal Federal, analisando a controvérsia instaurada sobre o alcance da Lei 8072/0000, proclamou o entendimento de que os crimes de atentado violento ao pudor e estupro somente serão classificados como hediondo se do fato resultar lesão corporal de natureza grave ou morte (HC nº 78.305 – MG, Relator Ministro Neri da Silveira).
Precedente desta Sexta Turma (HC nº 10.620 – SP, Rel. Ministro Fernando Gonçalves).
O Crime de atentado violento ao pudor, praticado sem lesão corporal grave ou morte, não se encontra compreendido no conceito de crime hediondo, sendo susceptível de concessão de indulto.
Recurso especial conhecido e provido.
(STJ – 6ª Turma – unânime – RESP 20007.148 /SC – Rel. Min. Vicente Leal – julg. em 15.03.2012).
Na remota hipótese de entender que o delito em questão é hediondo, ainda assim não merece prosperar a decisão que indeferiu a comutação de pena, pois não se pode interpretar extensivamente norma restringe direitos, estendendo as restrições do art. 7º do Decreto Presidencial à comutação de pena, quando, por disposição expressa, o citado art. 7º somente é aplicável ao indulto.
Consoante entendimento já pacificado, a concessão de indulto e comutação é medida de natureza extraordinária, de competência privativa do Presidente da República (art. 84, XII e parágrafo único da CRFB/88), e, consequentemente, somente o Presidente pode impor restrições aos precitados benefícios. Assim, como a elaboração do Decreto, por previsão constitucional, é atribuição do Presidente, não pode o julgador, por entendimento próprio, ampliar a incidência da restrição, não apenas pela possibilidade de desvio de função, como também por constituir violação às notórias regras constitucionais.
A fundamentação esposada na decisão ora agravada no sentido de que a comutação é uma forma de indulto parcial não merece prosperar, pois, comutação “é indulgência consistente em se mudar ou tocar (comutar) uma pena por outra. É substituir a primitivamente imposta, que era de caráter mais grave por outra mais benigna ou menos grave” (Vocabulário Jurídico, 4ª ed. Ed. Forense, de Plácido e Silva, PAG, 460), ao passo que indulto, derivado do latim indultus, significa perdoar, indulgenciar.
Cumpre consignar, também, a área de incidência dos efeitos de ambos, delimitando as suas consequências. Ora, a comutação é causa de DIMINUIÇÃO DA PENA, enquanto que o Indulto é causa de EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE, atingindo os efeitos executórios penais da condenação, abrangendo as medidas de segurança e as penas acessórias, inobstante deixe íntegros os efeitos da condenação na esfera da responsabilidade civil.
Isto porque, com efeito, não existe extinção parcial da punibilidade! O âmbito de realização de consequências, são diversos, aquela diminui o tempo de cumprimento da pena, e este a elimina.
Neste sentido, vale colacionar a ementa abaixo;
“Não se confunde indulto com comutação de vez que, no primeiro há perdão da pena, ao passo que na segunda se dispensa o cumprimento de parte da pena. O indulto, tal como dispõe o art. 107, II, do CP é causa de extinção da punibilidade, o que não ocorre com a comutação que é tão-somente uma simples diminuição do quantum da reprimenda, um abrandamento da penalidade” (TJSP – Rec. Rel. Weiss de Andrade – RJTJSP 33/247).
Mas, ainda, que se entenda que a comutação é uma espécie de indulto parcial, como vem decidindo o STJ, as regras de hermenêutica existentes não permitem concluir que as restrições do art. 7º do Decreto 3226/000000 se estendem à comutação de pena. Tal conclusão viola o senso lógico se observada a estrutura da redação do precitado Decreto, bem como se comparado aos Decretos dos anos anteriores, que estendiam, expressamente, as restrições à concessão do indulto à comutação.
Transcreve-se, por oportuno, a ementa da decisão da 7ª Câmara Criminal do E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, relatada pelo eminente magistrado:
“EXECUÇÃO PENAL. Decreto nº 3226/000000. Comutação de pena. Extorsão, mediante sequestro. Aplicabilidade. A discussão sobre ser a comutação espécie de indulto, contida nestes autos, perde todo o sentido em face da estrutura da redação adotada no Decreto nº 3226/000000. Neste decreto, quando a matéria tratada se refere aos dois institutos, ou está consignada a expressão genérica “benefícios” (como se vê nos arts. 4º e 8º) ou está utilizada a expressão “indulto e comutação” (como se constata nos arts. 3º, 5º e 6º). Quando a matéria se refere apenas a um dos dois institutos, a referência é feita especificamente a ele, como se verifica nos §§ 1º e 2º do art. 1º e no art. 7º (indulto) e no parágrafo único do art. 5º (comutação). Assim, não há como se estender que a comutação, somente no art. 7º, esteja abrangida pela expressão “indulto”. (TJRJ – 7ª Câm. Crim. – por maioria – Agravo 2000.076.00831 – Rel. JDS Moacir Pessoa de Araújo – julg. em 24.04.2012) (grifos do original).
Convém trilhar-se, ainda, o caminho dos princípios e regras de hermenêutica, salientando-se que: a lei não contém palavras inúteis; aonde o legislador não impôs restrição, não cabe ao intérprete fazê-lo e por fim, em matéria penal, a interpretação deverá sempre ser in dubio pro reo.
Cabe colacionar, ainda, recente decisão da 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça deste estado, no HC nº 3.204/000000, tendo como relator o Des. Sérgio Verani:
“ H.C. EXECUÇÃO. COMUTAÇÃO DE PENA. DECRETO Nº 3.226, DE 2000.X.000000. APLICABILIDADE AO CONDENADO POR CRIME HEDIONDO. O Decreto nº 3.226/000000 (Indulto de Natal) estabelece que o “o indulto não alcança os condenados por crimes hediondos” (art. 7º, I), mas ao contrário dos Decretos anteriores, não estende tal restrição à comutação, cujos requisitos para o seu benefício estão limitados aos artigos 2º e 3º desse Decreto.
Se a norma do art. 7º refere-se apenas ao indulto, não se pode ampliar o conteúdo dessa norma penal, criando-se uma restrição não prevista legalmente. A hermenêutica, em Direito Penal, é restrita, não se podendo estender o alcance da norma em desfavor do condenado, excluindo-se o seu direito à comutação.
Ordem concedida parcialmente.” (Acórdão – H.C. nº 2012.05000.03204 – TJRJ – 5ª Câmara Criminal – Rel. Des. Sérgio Verani).
Face ao exposto, espera e confia que seja dado provimento ao recurso e reformada a decisão para conferir ao apenado a COMUTAÇÃO, como forma de efetivação do respeito dos direitos fundamentais do homem em limitação ao poder de punir do Estado, refletindo-se tal decisão o acatamento ao princípio da legalidade.
Nestes Termos,
P. Deferimento
Rio de Janeiro, 27 de maio de 2019.