Agravo em execução – estupro, crime hediondo

EXMO. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DE EXECUÇÕES PENAIS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

Tombo VEP.: 2019/01753-3

Rg: 

, já qualificado nos autos do processo, vem, pelo Defensor infra assinado, não se conformando com a decisão de fls. 0008/000000 que indeferiu pedido de comutação interpor o presente recurso de

Agravo à Execução

com fulcro no art. 10007 da Lei 7210/84, pelos fundamentos de fato e de direito apresentados nas razões anexas.

Indica, nessa oportunidade, as peças a seguir relacionadas a serem trasladas, necessárias à formação do instrumento:

Carta de Execução de Sentença, fls. 2;

Folha de cálculo de pena, fls. 22/23;

Parecer do Conselho Penitenciários fls.70/71

Ficha disciplinar, fls. 88/V;

Decisão Agravada, fls. 0008/000000.

Nestes Termos,

P. Deferimento.

Rio de Janeiro, 10 de maio de 2019.

Defensor 

EGRÉGIO     TRIBUNAL

Proc.  nº2.757/000000

APLTE:     

APLDO:    MINISTÉRIO PÚBLICO

COLENDA CÂMARA CRIMINAL

O ilustre Magistrado de 1ª grua indeferiu o pedido de comutação de pena formulado pelo apenado, baseado no singelo argumento de ter aquele praticado crime hediondo,  não tendo assim direito ao benefício ora pretendido.

Ocorre que Pretório Excelso em decisões recentes, utilizando-se de uma interpretação literal da lei dos crimes hediondos, vem entendendo que o crime de estupro e atentado violento ao pudor na sua modalidade simples não são considerados hediondos.  Para serem enquadrados no restrito grupo dos crimes hediondos, elencados pela lei 8.072/0000, é indispensável que ocorra lesão corporal de natureza grave ou morte da vítima, ou seja, tem de haver a conjugação, seja do artigo 213 ou 214 com o artigo 223 do CP.  Vejamos.

Decisão publicada no informativo 213 do STF:

“Não se consideram hediondos os crimes de estupro e atentado violento ao pudor (CP, arts. 213 e 214), quando deles não resultar lesão corporal grave ou morte. Com base nesse entendimento, a Turma deferiu habeas corpus para afastar da condenação do paciente pela prática dos mencionados crimes a qualificação do crime como hediondo e estabelecer o regime inicialmente fechado como o de cumprimento da pena. HC 80.47000-RJ, rel. Min. Nelson Jobim, 5.12.2000. (HC-8047000) “

Informativo 207 do STF:

” Crime Hediondo e Atentado Violento ao Pudor 

Considerando que a qualificação de hediondo contida na sentença condenatória do paciente repercute no seu direito de ir e vir, a Turma deferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que entendera pelo não cabimento do writ – no qual se pretendia, com base em precedente do STF (HC 78.305-MG, publicado no DJU de 1º.10.000000), fosse afastada a classificação de hediondo da condenação do paciente pelos crimes de estupro e atentado violento ao pudor, pois deles não resultara lesão corporal grave ou morte – e determinou a remessa dos autos àquela Corte para, afastada a questão do cabimento do habeas corpus, decida a impetração como entender de direito. HC 80.438-SP, rel. Min. Octavio Gallotti, 17.10.2000.(HC-80438)”

Permita-nos ainda transcrever duas decisões do STF sobre a matéria:

 HC 80.47000

Relator Ministro Nelson Jobim

Segunda Turma

Ementa: Habeas Corpus. penal. processo penal. estupro e atentado violento ao pudor. crimes hediondos. regime de cumprimento de pena. extensão da decisão ao corréu.

Os crimes capitulados nos arts. 213 e 214 do CP, para serem considerados como crimes hediondos, devem resultar em lesão corporal de natureza grave ou morte. Precedente. No caso, resultaram apenas lesões leves.  O paciente deve cumprir a pena em regime inicialmente fechado.  Na hipótese de concurso de agentes, o CPP contempla a possibilidade de um dos réus aproveitar a decisão proferida em

recurso de outro, desde que os motivos não se fundem em caráter exclusivamente pessoal (CPP, art. 580).  A decisão que o paciente pretende ver estendida não se fundamentou em aspectos de ordem exclusivamente pessoal.

Habeas deferido.

HC 78.305

Relator Ministro Néri da Silveira

Segunda Turma

Habeas Corpus. 2. Atentado violento ao pudor e crime hediondo. Regime de cumprimento da pena. 3. Hipótese enquadrada nos arts. 214 e 224, letra a, e não nos arts. 214 e 223, caput e parágrafo único, todos do Código Penal. 4.Para que o atentado violento ao pudor possa ser classificado como crime hediondo, nos termos da Lei nº 8072/10000000, art. 1º, inciso VI, é necessário que do fato resulte lesão corporal de natureza grave ou morte (art. 214 combinado com o art. 223, caput e parágrafo único). 5. Não se podendo, desse modo, enquadrar o crime a que condenado o paciente (CP, arts. 214 e 224, letra a) como hediondo, Lei nº 8072/10000000, o regime de cumprimento da pena a que foi condenado somente pode ser o inicialmente fechado e não o regime fechado durante o período integral de sua duração. 6. Dessa maneira, se não

procede o fundamento da petição inicial do habeas corpus, com base na Lei nº 000455/10000007, que, de acordo com a jurisprudência do STF, é aplicável, tão-só, ao crime de tortura e não aos demais delitos tidos como hediondos pela Lei nº 8072/10000000, cabe, aqui, deferir o habeas corpus, porque o crime de atentado violento ao pudor, pelo qual condenado o paciente (CP, arts. 214 e 224, letra a), não se enquadra entre os delitos hediondos, ut art. 1º, inciso VI, da Lei nº 8072/10000000, visto que do fato não resultou nem lesão corporal grave nas vítimas, nem morte (art. 214, em combinação com o art. 223, caput e parágrafo único, do Código Penal). 7. Habeas Corpus deferido para garantir ao paciente a progressão no regime de cumprimento da pena, que se há de ter, tão-só, como inicialmente fechado.

Seguindo orientação da Suprema Corte do País, o STJ mudou de posição em relação a natureza dos crimes de estupro e atentado violento ao pudor em sua forma simples e vem entendendo que esses crimes só são considerados hediondos quando há a conjugação do artigo 213 ou 214 com o 223 do CP.  Eis:

Data:02/04/2012

Relator(a) Min. José Arnaldo da Fonseca 

Data da decisão 1/03/2012 

Órgão julgador T5 – Quinta Turma 

Ementa 

Habeas corpus. penal e processo penal. estupro. representação da ofendida ou de seu representante legal. desnecessidade de rigor formal. Miserabilidade da vítima. Atestado de pobreza. desnecessidade. Estupro tentado, na sua forma básica (art. 213, caput, c.c. o art. 14, II, ambos do cp). Delito não considerado hediondo. possibilidade de progressão de regime. 

Em sede de crime de ação penal pública condicionada a representação não se exige fórmula sacramental para a manifestação de vontade do ofendido no sentido de que se promova a responsabilização do autor do delito. Precedentes.  De outro lado, a miserabilidade da vítima ou de seus pais pode ser comprovada por simples declaração verbal ou escrita, ou até pela notoriedade do fato, sendo prescindível o atestado de pobreza. Consoante entendimento recentemente adotado pelo Col. STF, secundado por julgados desta Corte, os crimes de estupro e atentado violento ao pudor, quando cometidos em sua forma simples ou com violência presumida, não se enquadram na definição legal de crimes hediondos (art. 1º, da Lei 8.072/0000), mas somente recebem essa qualificação quando deles resultarem lesão corporal de natureza grave ou morte da vítima, vale dizer, quando for o caso de enquadramento típico no art. 223, caput, ou no seu parágrafo único, do Código Penal.  Hipótese dos autos em que não incide a regra proibitiva da progressão de regime inserta no § 1º do art. 2º da Lei 8.072/0000. Modificação do entendimento deste Relator.

Ordem parcialmente concedida, de ofício.

Finalmente cabe aqui registra a posição do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro sobre a caracterização dos crimes do artigo 213 e 214 do CP.

O TJRJ, em sintonia com as mais altas Cortes do nosso País ( STF e STJ ), também evoluiu em seu entendimento e vem adotando posição de que o para serem considerados hediondos os crimes do artigo 213 ou 214 do CP é necessária a combinação com o 223, todos do CP.  Ouçamos:

Processo : 2000.050.02842 
Apelação criminal crime contra os costumes estupro crime hediondo provimento parcial. 
CRIME CONTRA OS COSTUMES. Estupro. Absolvição. Insuficiência de provas. Não ocorrência. Regime carcerário. Minoração. Demonstrando as provas dos autos, de forma cabal, que o agente praticou os atos delituosos em apuração, correto se revela o juízo de reprovação, que não está a merecer reparo. Impõe-se a minoração do regime carcerário para o inicialmente fechado, tendo em vista que o estupro somente é considerado crime hediondo quando em combinação com o artigo 223, caput e parágrafo único, ou seja, quando do estupro resulta lesão corporal de natureza grave ou a morte da ofendida. 
Tipo da Ação: Apelação Criminal Número do Processo: 2000.050.02842 Data de Registro : 0000/03/2012 Órgão Julgador: SÉTIMA CAMARA CRIMINALJDS. DES. MOACIR PESSOA ARAUJO 
Revisão criminal Progressão de regime prisional estupro 
Habeas corpus julgamento conjunto. Estupro progressão de regime. Progressão de regime. Transgressão ao artigo 213 do código penal. não havendo combinação com o artigo 223, caput e parágrafo único, afasta-se a tipicidade do crime hediondo elencado na lei 8. 072/0000, fazendo jus o apenado a progressão do regime, contudo, já tendo sido negado provimento ao apelo interposto e transita em julgado a sentença, resta ao paciente a via da revisão criminal. não tem o mandamus forca suficiente para a modificação pretendida. 
Tipo da Ação: HABEAS CORPUS Número do Processo:2000.05000.03268 Data de Registro : 0000/02/2012Órgão Julgador: OITAVA CÂMARA CRIMINALDES. LIBORNI SIQUEIRA 
Roubo qualificado estupro valor da palavra da vítima regime de cumprimento da pena 
Crimes de roubo qualificado e estupro Prova: palavra da vítima; Validade pena: menoridade imputável: meio de prova – regime: estupro: inicial fechado nos crimes sexuais a palavra da vítima é decisiva para a condenação do acusado, mormente quando as partes envolvidas sequer se conheciam anteriormente. O reconhecimento efetuado em juízo, na presença das partes e do magistrado, possui eficácia processual idêntica aquele realizado com as formalidades prescritas no artigo 226 do CPP. nos termos do artigo 155 do CPP, abarcado pela súmula 74 do STJ, o reconhecimento da menoridade do acusado exige a prova através de documento hábil, não bastando a simples afirmativa do réu não contestada pelas partes.  0 Supremo Tribunal Federal vem reiteradamente decidindo que o crime de estupro em sua forma simples não é hediondo, posicionamento que também vem sendo adotado por esta Câmara, devendo a pena privativa de liberdade, sim, ser cumprida em regime inicial fechado, ressalvada a posição pessoal deste relator. Tipo da Ação: apelação criminal Número do Processo: 2000.050.00347Data de Registro : 24/11/2000 Órgão Julgador: QUINTA CAMARA CRIMINAL JDS. DES. MARCUS BA

Atentado violento ao pudor.  Violência presumida aumento especial da pena inaplicabilidade. Crime hediondo não caracterização. Progressão de regime prisional regime fechado 
Apelação. Atentado violento ao pudor. Prova. Inexistem dúvidas quanto `a autoria se a versão da vitima foi confirmada por sua mãe e seu pai, principalmente quando uma irmã do apelante, tia da vitima, afirma que já’ fora por ele molestada sexualmente quando pequena. Art. 000. da Lei 8.072/0000. Só’ haverá aumento de metade incidente sobre a pena-base se do estupro ou atentado violento ao pudor advier lesão corporal grave ou morte. Regime.  Os tipos básicos de estupro e de atentado violento ao pudor admitem a progressão do regime, conforme tendência jurisprudência dos Tribunais Superiores. Recurso a que se da provimento parcial. (GAS) Partes: CARLOS ALBERTO DE MORAIS CANDIDO MINISTERIO PUBLICOTipo da Ação: Apelação Criminal Número do Processo: 2000.050.02020Data de Registro : 05/04/2012 Comarca de Origem: BELFORD ROXO Órgão Julgador: QUINTA CAMARA CRIMINAL Votação : Unanime DES. MANOEL ALBERTO Julgado em 0000/11/2000 

É de nota que atualmente encontra-se pacificado nas instâncias Superiores da Justiça do nosso País que o crime de estupro ou atentado violento ao pudor na sua forma simples não é considerado hediondo.

Destarte, não assiste razão ao Magistrado de 1ª grua quando indefere o pedido de comutação de pena formulado pelo apenado sob o argumento de ser o crime cometido por ele hediondo, indicando há restrição contida no Dec.  para não concessão daquele benefício.

Ex Positis, confia a Defesa no reconhecimento em favor do apenado do benefício da comutação de pena,  por  ser  medida  da  mais  salutar     J U S T I Ç A,      o  mais  débil  dos  axiomas,   porém  o  de  maior  dignidade  jurídica.  

Rio de Janeiro, 11 de maio de 2019