Alegações Finais – Furto Qualificado – Princípio da Insignificância

art. 155, § 4º, incisos II e IV do Código Penal c.c. o artigo 244-B da Lei 8.069/90

EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUIZA DE DIREITO DA 4ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE PIRACICABA.

PROCESSO nº 0017099-32.2016.8.26.0451

XXXX, já devidamente qualificado nos autos da AÇÃO PENAL em epígrafe, que lhe move o MINISTÉRIO PÚBLICO do Estado de São Paulo, vem, respeitosamente, a presença de Vossa Excelência, por meio de sua advogada que esta subscreve apresentar as presentes ALEGAÇÕES FINAIS, aduzindo, o quanto segue:

I – DOS FATOS

O Acusado foi denunciado em 27/07/2017 pela prática do crime previsto no art. 155, § 4º, incisos II e IV do Código Penal c.c. o artigo 244-B da Lei 8.069/90, na forma do artigo 69 do Código Penal, por supostamente em 14/07/2016 na rua Saldanha Marinho, nº 1885, Vila Independência, este em conjunto com sua companheira Kaira Gonçalves França Belem, teriam subtraíram de um imóvel em obras e desprotegido de propriedade do Sr. Gabriel Delazeri, que não se preocupou em registrar o boletim de ocorrência por “falta de tempo” (fls. 05).

· Fios e cabos;

· Uma escada;

· Ferramentas manuais;

· Canos de PVC;

· Carrinho de mão; e

· Batente de alumínio.

Às fls. 53-58, as folhas dos antecedentes certificam que O ACUSADO É PRIMÁRIO!

Foi recebida a denuncia somente em 06/09/2017 nos termos da decisão de fls. 60-61, a qual determinou a citação do Acusado e apresentação de sua defesa.

Às fls. 67 o cartório certificou que o Acusado é morador de rua e por isso deixou de expedir o mandado de citação, após o Ministério Público indicou novos endereços requerendo nova citação.

Às fls. 89 o Acusado foi citado à Rua Algemiro Coelho Ramos, nº 188, Bairro Jardim Oriente, e às fls. 90 esta advogada conveniada foi nomeada e intimada às fls. 95 para apresentação de defesa preliminar.

É a síntese do necessário.

II – MÉRITO

II.I DO PRINCIPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – ABSOLVIÇÃO

O laudo pericial de fls. 33-37 realizado quase um ano após as datas dos fatos que em nada provou quanto à materialidade do suposto crime:

“Realizado exame “in loco”, objetivando atender a requisição, considerando-se o período decorrido entre a data do fato (14/07/2016) com a requisição do exame (15/07/2017) protocolada neste Instituto de Criminalística e o local modificado, não foram constatados vestígios relacionados com a natureza da requisição.

“Conforme termos de declarações, a via de acesso dos (s) autor (res) ao interior do imóvel em obras, ocorreu mediante escaladas de uma das janelas instaladas no limite com o passeio, após a remoção do tapume, consequentemente, subtraíram vários objetos, os quais constam no histórico do boletim de ocorrência.”

Acompanha o presente laudo uma captura de imagem: agosto 2016 via Google Maps do estabelecimento em obras (…)” (g.n)

Como sabido, o direito penal moderno não deve mais servir como instrumento de reprimendas a ações menores, de nenhuma importância social, de pequena ou inexistente lesividade patrimonial, uma vez que o furto de pequeno valor não autoriza a incriminação e muito menos qualquer reprimenda.

Não obstante, em face do princípio constitucional da ampla defesa, a conduta do Acusado merece ser analisada sob o prisma da extrema necessidade aliada as condições sociais e econômicas, consignando sua vulnerabilidade social por ser morador de rua à época dos fatos e usuário de drogas.

Ora, a vítima não se preocupou em registrar o boletim de ocorrência devido a irrelevâncias dos bens da obra subtraídos. O laudo pericial realizado quase após um ano após os fatos não conseguiu auferir se houve de fato o arrombamento e, se o mesmo resultou em prejuízo para a vítima, sendo certo que a janela de frente pra a calçada estava aberta e tampada apenas com um “tapume”.

Ressalta-se que não constou o valor total dos bens supostamente furtados, sendo certo que pela própria descrição elaborada pelo parquet tratou-se de produtos comuns, de pouco valor.

Para a configuração do delito de tentativa de furto significante e necessária a relevância da materialidade, ou seja, ser intenso o grau da lesão produzida. In casu, o valor da res furtiva é ínfimo, desprezível, não merecendo a tipicidade material.

Desta forma, inquestionável a irrelevância do fato delituoso com a recuperação dos bens furtados, sem prejuízo substancial para a vítima devendo o Acusado ser absolvido sumariamente.

É cediço que a concepção de aplicabilidade da reprovação penal no contexto atual não mais se restringe a subsunção de fato delitivo à norma incriminadora insculpida, mas também a necessária presença de uma terceira condicionante, a lesividade da conduta para vítima.

Há necessidade de se aferir a elevada despesa desencadeada por processos de ação penal, conjugando os princípios da celeridade e da razoável duração do processo, que só podem ser efetivados com apropriado juízo de admissibilidade.

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal criou requisitos que devem ser observados na hora da aplicação do princípio da insignificância. O STF decidiu que o princípio da insignificância não deve ser aplicado tomando-se por base tão somente o valor do bem jurídico, mas também deve-se observar os seguintes requisitos: i) mínima ofensividade da conduta do agente; ii) nenhuma periculosidade social da ação; iii) reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada.

No presente caso verifica-se que todos os requisitos para aplicação do princípio da insignificância encontram-se presentes, já que os bens furtados foram de pequeno valor, a conduta foi praticada porque o imóvel estava em obras e completamente desprotegido, já que a porta de entrada e janelas ficam na calçada, as quais estavam desprotegidas à época dos fatos (primeira imagem fls. 26), sendo certo que não ocorreu nenhuma escalada.

Os fatos ocorreram durante a madrugada o que não gerou riscos para os vizinhos, o crime não foi praticado com violência e ainda houve a restituição dos objetos à vítima.

Ademais, nesta ação há o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento, principalmente por a vítima ter deixado seu bem imóvel desprotegido.

Destaca-se que a posição de que vem se acentuado cada vez mais na doutrina e na jurisprudência, é que se apresenta irrelevante à concessão do Princípio da Insignificância as condições pessoais do Acusado, tal como a sua reincidência, uma vez que se trata de causa de exclusão da tipicidade. Nesse sentido o Supremo Tribunal Federal postulou em seu Informativo 610 que: “admite a aplicação do princípio da insignificância, mesmo para o agente que pratica o delito reiteradamente.”.

II.II – DA ATENUANTE DE CONFISSÃO

Como sabido, a confissão espontânea é considerada um serviço para justiça, pois simplifica a instrução criminal e confere ao julgador a certeza para uma condenação justa.

Nesse sentido, o Acusado colaborou tanto confessando em sede de inquérito, quanto na instrução. O que foi confirmado pela testemunha policial Marcos em seu depoimento em juízo.

Assim, necessária a aplicação da atenuante de confissão, confirme determina a Súmula 545 do Superior Tribunal de Justiça, cujo teor diz que:

“quando a confissão for utilizada para a formação do convencimento do julgador, o réu fará jus à atenuante prevista no art. 65, III, d, do Código Penal”.

Outrossim, esse é entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça, nos casos em que a confissão do Acusado serviu como um dos fundamentos para a condenação, logo, deve ser aplicada a atenuante em questão, pouco importando se a confissão foi espontânea ou não, se foi total ou parcial, ou mesmo se foi realizada só na fase policial, com posterior retratação em juízo (AgRg no REsp nº 1412043/MG. Rel. Min. Sebastião Reis Júnior. Sexta Turma. Julgado em 10 de março de 2015).

Igualmente é esse o entendimento do Supremo Tribunal Federal, conforme se verifica no julgado abaixo transcrito, confira-se:

(…) CONFISSÃO ESPONTÂNEA. ALEGAÇÃO DE INCIDÊNCIA DA CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE: POSSIBILIDADE. PRECEDENTES (…) A circunstância atenuante pertinente à confissão espontânea, ainda que parcial, é aplicável àquele que confessa a autoria do crime independentemente da admissão do dolo ou das demais circunstâncias narradas na denúncia. Precedentes (…) (STF. HC 99.436/RS. Rel. Carmen Lúcia. T1. Julg. 26.10.2010).

Dessa forma, tendo o Acusado confessado os fatos a ele imputados, mesmo que parcialmente, tendo o magistrado se utilizado disso na sentença para firmar o seu convencimento na condenação, é inequívoco o direito ao reconhecimento da atenuante.

III – PEDIDOS

Ex positis, requer-se a Vossa Excelência:

i) Acolher a presente tese da defesa em alegações finais para absolver o Acusado acusada do crimes que lhe fora imputados na exordial;

ii) Alternativamente, requer-se seja aplicada a atenuante de confissão, com base no art. 65, II, alínea d, do Código Penal;

iii) Ainda, caso Vossa Excelência entenda pela condenação do Acusado, o que não se espera, deve ser aplicada as medidas restritivas de direito alternativas à prisão;

iv) Em caso de condenação requer-se o direito de apelar em liberdade;

vi) Por fim, fica expressamente requerida a análise dos argumentos nessas alegações finais para fins de prequestionamento em eventuais aos Tribunais Superiores.

Termos em que,

p. deferimento.

Piracicaba, 24 de outubro de 2018.

XXXXXXXX

OAB/SP 00000