Apelação Criminal

(furto qualificado)

EXCELENTÍSSIMO (A) SENHOR (A) DOUTOR (A) JUIZ (A) DE DIREITO DA XX VARA CRIMINAL DA COMARCA DE XXXXXXXXXX, ESTADO XXXXXXXXXXX.

Processo nº xxxx

XXXXXXXXXXXXXXXXX, devidamente qualificado nos autos do processo em epígrafe, que lhe move a Justiça Pública, por seu advogado e bastante procurador que este subscreve (procuração anexa), com escritório profissional situado na Rua Olavo Bilac, nº 3.997, Bairro Centro, Teresina/PI, vem, respeitosamente perante Vossa Excelência, com fundamento no artigo 593, inciso I, do Código de Processo Penal, interpor

RECURSO DE APELAÇÃO

contra a respeitável sentença condenatória de fls. xx.

Assim, requer seja o presente recurso recebido e, após as formalidades de praxe, seja remetido com suas inclusas razões ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Piauí.

Nestes termos,

Pede e espera deferimento.

Local…, Data…

Advogado (a)

OAB

RAZÕES DE APELAÇÃO

Processo nº xxxx

Apelante: XXXXXXXXXXXXXXX

Apelado: Ministério Público Estadual

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA;

COLENDA CÂMARA;

EXCELENTÍSSIMOS DESEMBARGADORES;

DOUTA PROCURADORIA DE JUSTIÇA:

Em que pese o notável saber jurídico do Meritíssimo Juiz de 1º grau, impõe-se a reforma da respeitável sentença condenatória proferida em face do apelante, pelas razões de fato e de direito a seguir expostas.

1 – SÍNTESE FÁTICA

O Ministério Público Estadual ofereceu denúncia contra o apelante pela prática do delito de furto qualificado pelo abuso de confiança, tipificado no artigo 155, § 4º, inciso II, do Código Penal, por supostamente ter subtraído valores e materiais do estabelecimento comercial onde trabalha.

Insta salientar que, tanto na fase investigatória quanto na fase de instrução criminal da Ação Penal em epígrafe, não restou, em momento algum, comprovada a autoria ou a participação do apelante no mencionado delito.

Ademais, conforme os depoimentos colhidos, soube-se que a subtração dos valores e materiais se deu em pleno horário de funcionamento do estabelecimento, ou seja, em um momento em que todos os empregados estavam presentes e desempenhando suas atividades, de modo que nenhum funcionário viu o apelante sequer próximo ao caixa.

Além disso, as filmagens do estabelecimento corroboram com os depoimentos colhidos, pois estas não registraram nenhum comportamento do apelante que se coadune com os termos da denúncia oferecida.

No entanto, ainda em sede de inquérito, mediante extrema coação da autoridade policial, o apelante confessou que se encontrava próximo ao caixa do estabelecimento, porém não subtraíra qualquer valor, tampouco quaisquer materiais.

Importante ressaltar, também, que somente o apelante fora chamado, reiteradas vezes, à delegacia de polícia para prestar esclarecimentos “complementares”, ocasião em que o delegado lhe fazia perguntas sempre com a mão em sua arma, rodando-a entre os dedos e posteriormente passando a carregá-la, obtendo, assim, a confissão do apelante.

Dessa forma, o juízo a quo proferiu sentença condenatória, no dia 07/11/2019, em desfavor do apelante com fundamento em sua confissão, mesmo tendo pleno conhecimento da forma como fora obtida, tendo em vista que o escrivão de polícia registrou a mencionada coação do delegado em seu depoimento em sede de audiência de instrução e julgamento.

Cumpre destacar que, não obstante o apelante seja réu primário, com bons antecedentes, o juízo de primeiro grau o condenou à pena privativa de liberdade de 8 (oito) anos, por infração ao artigo 155, § 4º, inciso II, do Código Penal, tendo fixado o regime fechado para o início de cumprimento da pena.

Saliente-se, ainda, que o regime fechado imposto na sentença condenatória está fundado nos seus maus antecedentes, os quais estão consubstanciados pela existência de um inquérito policial em que o apelante figura como indiciado pela suposta prática do delito de simulação de casamento, tipificado no artigo 239 do Código Penal.

Diante de tudo que fora exposto, verifica-se que a sentença condenatória proferida contra o apelante merece ser reformada, conforme adiante se demonstrará.

2 – PRELIMINARMENTE

2.1 DA INÉPCIA MATERIAL DA DENÚNCIA

Dispõe o art. 395, inciso III, do Código de Processo Penal, verbis: “Art. 395 A denúncia ou queixa será rejeitada quando: […] III – faltar justa causa para o exercício da ação penal”.

Nessa esteira, não existe justa causa para que o Ministério Público ofereça denúncia em face do apelante, isto porque tanto na fase investigatória quanto na fase de instrução criminal não restou, em momento algum, comprovada a autoria ou a participação do apelante no mencionado delito.

Ademais, conforme os depoimentos colhidos, soube-se que a subtração dos valores e materiais se deu em pleno horário de funcionamento do estabelecimento, ou seja, em um momento em que todos os empregados estavam presentes e desempenhando suas atividades, de modo que nenhum funcionário viu o apelante sequer próximo ao caixa.

Além disso, as filmagens do estabelecimento corroboram com os depoimentos colhidos, pois estas não registraram nenhum comportamento do apelante que se coadune com os termos da denúncia oferecida.

Acerca da questão aventada, veja-se a doutrina de Renato Brasileiro de Lima (2017):

“Por outro lado, a inépcia material se dá quando não há justa causa para a ação penal, ou seja, quando a peça acusatória não está respaldada por aquele lastro probatório mínimo indispensável para a instauração de um processo penal, hipótese em que a rejeição da peça acusatória terá como fundamento o inciso III do art. 395”. Grifou-se.

Portanto, considerando-se a flagrante inépcia material da denúncia, uma vez que inexistem provas de que o apelante tenha praticado ou participado do crime pelo qual foi condenado, melhor sorte não lhe assiste senão a sua rejeição, nos moldes do art. 395, inciso III, do Código de Processo Penal.

2.2 DA FALTA DE CONDIÇÃO PARA O EXERCÍCIO DA AÇÃO PENAL -ILEGITIMIDADE AD CAUSAM PASSIVA

Dispõe o art. 395, inciso II, segunda parte, do Código de Processo Penal, verbis: “Art. 395 A denúncia ou queixa será rejeitada quando: […] II – faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal”. Grifou-se.

Acerca da falta de condição para o exercício da ação penal, relativamente à ilegitimidade passiva, Guilherme de Souza Nucci (2014) entende que “verificando-se que a titularidade da ação penal não pertence a quem ingressa com a ação penal (ilegitimidade ativa) ou que o réu não é a pessoa a sofrer a imputação (ilegitimidade passiva), deve o juiz rejeitar a denúncia ou queixa”.

Neste cenário, verifica-se que o apelante não tem legitimidade para figurar como denunciado nos presentes autos, em razão de não ter praticado ou participado do crime pelo qual foi condenado, o que resta devidamente comprovado pelos depoimentos colhidos, bem como pelas filmagens do estabelecimento.

Diante disso, não havendo quaisquer provas de participação do apelante no crime que lhe é imputado, a rejeição da denúncia é medida que se impõe, nos moldes do que preceitua o art. 395, inciso II, segunda parte, do Código de Processo Penal.

Nesse sentido, é imperioso destacar o que dispõe o art. 564, inciso II, do Código de Processo Penal, verbis: “Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos: II – por ilegitimidade de parte”.

Nesse diapasão, considerando-se a ilegitimidade ad causam passiva, verifica-se na hipótese a existência, também, de causa de nulidade absoluta do processo, ante a impossibilidade de o apelante figurar no polo passivo da demanda, porque não praticara nem participara do crime narrado na denúncia.

2.3 DA ILICITUDE DA PROVA CARREADA AOS AUTOS

A Magna Carta dispõe em seu artigo 5º, inciso LVI, que “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.

Sobre o tema, veja-se a doutrina de Alexandre de Moraes (2014):

“São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos, garante o art. 5º, LVI, da Constituição Federal,1 entendendo-as como aquelas colhidas em infringência às normas do direito material1 2 (por exemplo, por meio de tortura psíquica, quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico sem ordem judicial devidamente fundamentada3), configurando-se importante garantia em relação à ação persecutória do Estado”.

Nesse mesmo sentido, preceitua o artigo 157 do Código de Processo Penal, verbis: “Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”.

Conforme consta dos autos, ainda em sede de inquérito, mediante extrema coação da autoridade policial, o apelante confessou que se encontrava próximo ao caixa do estabelecimento, porém não subtraíra qualquer valor, tampouco quaisquer materiais.

Importantíssimo ressaltar que, somente o apelante fora chamado, reiteradas vezes, à delegacia de polícia para prestar esclarecimentos “complementares”, ocasião em que o delegado lhe fazia perguntas sempre com a mão em sua arma, rodando-a entre os dedos e posteriormente passando a carregá-la, obtendo, assim, a confissão do apelante.

Nesse diapasão, é cristalino que a confissão do apelante está eivada de ilicitude, porque obtida mediante tortura psíquica, o que a consolida como prova ilícita, e, portanto, inadmissível para a instrução do processo, conforme dispõem os textos constitucional e legal.

Acerca da questão aventada, veja-se o entendimento jurisprudencial:

Ementa: EMBARGOS INFRINGENTES – TRÁFICO DE DROGA – PROVA OBTIDA POR MEIO ILÍCITO – OCORRÊNCIA – VIOLAÇÃO DE DIREITO FUNDAMENTAL – DESCONSIDERAÇÃO DA PROVA – NECESSIDADE – ABSOLVIÇÃO – CABIMENTO – PROVA INSUFICIENTE – IN DUBIO PRO REO – EMBARGOS ACOLHIDOS. 1. Necessário é o afastamento da prova colhida mediante violação de direito fundamental já que o acesso às conversas privadas e a dados contidos no celular do acusado ocorreu sem prévia autorização judicial. 2. Existindo meros indícios, prova nebulosa e geradora de dúvida quanto à autoria do delito, sendo essa negada pelo acusado, a absolvição é medida que se impõe em observância ao princípio in dubio por reo. 3. Embargos acolhidos.

(TJ-MG – Emb Infring e de Nulidade: 10140170003291002 MG, Relator: Pedro Vergara, Data de Julgamento: 23/07/2019, Data de Publicação: 29/07/2019). Grifou-se.

Desse modo, a ilicitude na obtenção da confissão do delito resta devidamente configurada pela coação psíquica a qual foi submetido o apelante, uma vez que a autoridade policial lhe fazia perguntas sempre com a mão em sua arma, rodando-a entre os dedos e posteriormente passando a carregá-la.

Assim, conclui-se pela absoluta ilicitude da prova que fundamentou a condenação do apelante, a qual deve ser reputada absolutamente nula e desentranhada dos autos, por ser medida da mais lídima justiça.

2.4 DA NULIDADE DA SENTENÇA E DO PROCESSO

Conforme se depreende dos presentes autos, o juízo a quo proferiu sentença condenatória em desfavor do apelante com fundamento em sua confissão, mesmo tendo pleno conhecimento da forma como fora obtida, tendo em vista que o escrivão de polícia registrou a já mencionada coação do delegado em seu depoimento em sede de audiência de instrução e julgamento.

Nessa senda, verifica-se que a sentença condenatória está fundada unicamente na confissão do apelante, a qual fora obtida de forma ilícita, o que enseja a nulidade da decisão, bem como de todo o processo.

Em caso semelhante, veja-se o entendimento jurisprudencial:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. SONEGAÇÃO FISCAL. LEI COMPLEMENTAR Nº 105/2001. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. PROVA ILÍCITA. NULIDADE. 1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 601.314, pela sistemática da repercussão geral, decidiu que a quebra de sigilo bancário pela Receita Federal, para fins de constituição de crédito tributário, feita com base no art. 6º da Lei Complementar nº 105/2001, é lícita. Todavia, não foi decidida a possibilidade da Receita Federal enviar ao Ministério Público, para fins de persecução penal, sem prévia autorização judicial, os dados bancários obtidos para a constituição do crédito tributário. 2. Prevalece a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido de que a possibilidade de quebra de sigilo bancário diretamente pela autoridade fiscal restringe-se à constituição do crédito tributário, não se estendendo para a ação penal, em relação à qual é necessária prévia autorização judicial. 3. O reconhecimento da ilicitude da prova torna prejudicial a análise do mérito e, como tal, conduz à nulidade absoluta do processo, já que a denúncia fundamentou-se em elementos probatórios obtidos por meio da quebra de sigilo bancário sem prévia autorização judicial. 4. Deve, assim, prevalecer o voto vencido, que, reconhecendo a ilicitude da prova, declarou a nulidade ab initio do processo, por ausência de justa causa para a persecução penal. 5. Embargos infringentes conhecidos e providos.

(TRF-3 – EIFNU: 00092656120104036109 SP, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO, Data de Julgamento: 20/07/2017, QUARTA SEÇÃO, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/07/2017). Grifou-se.

Portanto, demonstrada a nulidade em comento, consubstanciada na sentença condenatória fundada em prova ilícita, conclui-se pela nulidade absoluta da sentença, bem como de todo o processo penal, em conformidade com o entendimento jurisprudencial.

3 – MÉRITO

3.1 DA ABSOLVIÇÃO POR ESTAR PROVADO QUE O APELANTE NÃO CONCORREU PARA A INFRAÇÃO PENAL

Preceitua o art. 386, inciso IV, do Código de Processo Penal, verbis: “Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: […] IV – estar provado que o réu não concorreu para a infração penal”.

Conforme se infere dos autos, o apelante foi condenado pela prática do delito de furto qualificado pelo abuso de confiança, tipificado no artigo 155, § 4º, inciso II, do Código Penal.

No entanto, não há nos autos, quer em sede de investigação quer em sede de instrução, prova de que o apelante seja autor ou partícipe do delito pelo qual fora condenado, o que pode ser plenamente comprovado por meio dos depoimentos colhidos, bem como pelas filmagens do estabelecimento, os quais comprovam veementemente que o apelante não cometera a infração penal, ensejando a sua absolvição.

Nesse sentido, veja-se o entendimento jurisprudencial:

EMENTA: PENAL. CRIMES DE QUADRILHA E DE FURTO QUALIFICADO. ABSOLVIÇÃO. MODIFICAÇÃO DO FUNDAMENTO DA ABSOLVIÇÃO. POSSIBILIDADE. COMPROVAÇÃO NOS AUTOS DE QUE O REU NÃO CONCORREU PARA A INFRAÇÃO PENAL. Não evidenciada nos autos a participação do apelante no ilícito penal em debate, impõe-se a mudança do fundamento absolutório, nos termos em que requerido no apelo. Apelação provida para absolver o réu com fundamento no art. 386, inciso IV, do Código de Processo Penal.

(TJ-DF – APR: 20140111022708 DF 0024317-05.2014.8.07.0001, Relator: XXXXXXX, Data de Julgamento: XX/XX/XXXX, 1ª Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no DJE : XXX/XX/XXXXX . Pág.: 100). Grifou-se.

Forçoso é concluir, com respaldo nas provas carreadas aos autos, que o apelante não praticou ou participou do crime que lhe é imputado, devendo, assim, ser absolvido do crime de furto qualificado, conforme preceitua o art. 386, inciso IV, do Código de Processo Penal.

3.2 DA ABSOLVIÇÃO POR NÃO EXISTIR PROVA DE TER O APELANTE CONCORRIDO PARA A INFRAÇÃO PENAL

Preceitua o art. 386, inciso V, do Código de Processo Penal, verbis: “Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: […] V – não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal”.

Conforme se infere dos autos, a condenação do apelante está fundada em sua confissão, não obstante esta ter sido obtida de forma ilícita, via tortura psicológica. Ademais, o apelante confessou tão somente que se encontrava próximo ao caixa do estabelecimento comercial, fato que, por si só, não pode ser suficiente para a sua condenação.

Cumpre ressaltar, por oportuno, que o mencionado delito de furto ocorreu em pleno horário de funcionamento da confeitaria, ou seja, em um momento em que todos os empregados estavam presentes e desempenhando suas atividades, de modo que nenhum funcionário viu o apelante sequer próximo ao caixa.

Desse modo, ante a ausência de suporte probatório suficiente para a condenação, deve o apelante ser absolvido.

Nesse sentido, veja-se o entendimento jurisprudencial:

PENAL. PROCESSUAL PENAL. FURTO QUALIFICADO. ART. 155, § 4º, DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE DEMONSTRADA. AUTORIA NÃO COMPROVADA. ABSOLVIÇÃO. ART. 386, V, DO CPP. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Meros indícios ou conjecturas não bastam para um decreto condenatório, visto que no processo penal a busca é pela verdade real. 2. Por não existir prova de ter o réu concorrido para a infração penal (art. 386, V, do CPP), a sua absolvição é a medida que se impõe. 3. Apelo desprovido.

(TRF-1 – ACR: 00103836420134013800, Relator: XXXXXXXXXX (CONV.), Data de Julgamento: XX/XX/XXXX, QUARTA TURMA, Data de Publicação: XX/XX/XXX). Grifou-se.

Portanto, com lastro no entendimento jurisprudencial, conclui-se que ao apelante não pode ser imputada a prática do delito em comento, uma vez que não existem nos autos provas de que tenha concorrido para a infração penal, razão pela qual o apelante deve ser absolvido, com fundamento no art. 386, inciso V, do Código de Processo Penal.

3.3 DA ABSOLVIÇÃO DO APELANTE POR NÃO EXISTIR PROVA SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO

Preceitua o art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal, verbis: “Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: […] VII – não existir prova suficiente para a condenação”.

Conforme já delineado, tanto na fase investigatória quanto na fase de instrução criminal, não restou, em momento algum, comprovada a autoria ou a participação do apelante no mencionado delito, o que pode ser plenamente comprovado através dos depoimentos colhidos, pelos quais nenhum funcionário afirma ter visto o apelante sequer próximo ao caixa.

Cumpre destacar, também, que os depoimentos corroboram com as filmagens do estabelecimento, comprovando, portanto, que o apelante não participou da ação criminosa, seja como autor seja como partícipe, pelo que sua absolvição é medida de rigor.

Em caso idêntico, veja-se o entendimento jurisprudencial:

APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO SIMPLES (ART. 155, CAPUT DO CP). RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. SENTENÇA DO JUÍZO A QUO QUE ABSOLVEU O RÉU POR NÃO EXISTIR PROVA SUFICIENTE PARA A CONDENAÇÃO (ART. 386, VII, CPP). CONTEXTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. ACUSAÇÃO NÃO SE DESINCUMBIU A CONTENTO DO SEU ÔNUS PROBATÓRIO. PROVA INDICIÁRIA NÃO RATIFICADA EM JUÍZO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (Apelação Criminal nº 201900321768 nº único0007275-95.2018.8.25.0034 – CÂMARA CRIMINAL, Tribunal de Justiça de Sergipe – Relator (a): XXXXX – Julgado em XX/XX/XXX)

(TJ-SE – APR: 00072759520188250034, Relator: XXXXXXX, Data de Julgamento: XX/XX/XXXX, CÂMARA CRIMINAL). Grifou-se.

Nesse diapasão, considerando a inexistência de provas suficientes para a condenação, o apelante deve ser absolvido do crime de furto qualificado, por força do artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal.

3.4 DA DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO DE FURTO QUALIFICADO PARA O DELITO DE FURTO SIMPLES

O apelante foi condenado pela prática do crime de furto qualificado pelo abuso de confiança, infração penal prevista no artigo 155, § 4º, inciso II, do Código Penal.

Urge destacar que, a circunstância qualificadora do crime, qual seja, com abuso de confiança, decorre do fato de ser o apelante funcionário da Confeitaria Doce Ilusão, onde trabalha como confeiteiro.

Todavia, o referido vínculo empregatício, por si só, não pode qualificar o tipo penal em comento, tendo em vista que o apelante trabalha apenas como confeiteiro, vale dizer, não exerce qualquer função de gerência, administração ou fiscalização na mencionada empresa, circunstâncias capazes de caracterizar a mencionada confiança.

Acerca do tema em apreço, veja-se o entendimento jurisprudencial:

E M E N T A – RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO – FURTO QUALIFICADO PELO ABUSO DE CONFIANÇA NÃO CONFIGURADO – RECEPTAÇÃO QUALIFICADA NÃO CONFIGURADA – DESPROVIDO. A mera relação empregatícia é insuficiente para a configuração do furto qualificado pelo abuso de confiança. A primariedade e o pequeno valor da coisa objeto da receptação admite a figura privilegiada para o respectivo delito.

(TJ-MS 00312744720158120001 MS 0031274-47.2015.8.12.0001, Relator: XXXXXXXXXXXXXXXXXXXXX, Data de Julgamento: XX/XX/XXXX, 1ª Câmara Criminal). Grifou-se.

Nesse cenário, na remotíssima hipótese desse Egrégio Tribunal entender pela existência de conduta criminosa por parte do apelante, observa-se que este faz jus à desclassificação do delito de furto qualificado para o delito de furto simples, com amparo no entendimento firmado pela jurisprudência mais abalizada.

3.5 DA FIXAÇÃO DA PENA DEFINITIVA NO MÍNIMO LEGAL

Na remotíssima hipótese de o apelante ser condenado pelo crime de furto simples, a pena definitiva a ser aplicada deverá ser fixada no mínimo legal, ou seja, 01 (um) ano de reclusão e multa.

Tal deve ocorrer em razão do apelante não possuir quaisquer antecedentes criminais, sendo primário, pesando contra o mesmo apenas um inquérito policial instaurado para a apurar a suposta prática do crime de simulação de casamento, previsto no artigo 239 do Código Penal.

Com efeito, a tramitação do citado inquérito policial não pode configurar mau antecedente e, portanto, não pode servir de fundamento para agravar a pena, conforme infelizmente entendeu o juízo a quo.

Nesse exato sentido é a Súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça, verbis: “É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”.

A título de maiores esclarecimentos, veja-se o entendimento jurisprudencial:

EMENTA: EMBARGOS INFRINGENTES – ROUBO MAJORADO – CONDUTA SOCIAL DESFAVORÁVEL – AFASTAMENTO – INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 444 DO STJ. 1- A Conduta Social, enquanto Circunstância Judicial constante do art. 59 do Código Penal, deve ser tida como o comportamento do Agente no seio da sociedade, da família e do ambiente profissional. 2- Inquéritos Policiais e Ações Penais em andamento não se prestam a macular a Conduta Social do Agente, sob pena de afronta ao Princípio da Presunção de Inocência. Súmula 444 do STJ.

(TJ-MG – Emb Infring e de Nulidade: 10155170021044002 MG, Relator: XXXXXXXX, Data de Julgamento: 12/03/2019, Data de Publicação: XX/XX/XXXX). Grifou-se.

Dessa forma, caso esse Egrégio Tribunal rejeite todas as teses defensivas absolutórias e desclassifique o delito de furto qualificado para o delito de furto simples, e considerando, ainda, que na hipótese inexistem circunstâncias agravantes ou reincidência, que poderiam aumentar a pena do apelante, não há dúvidas de que a pena a ser aplicada deverá fixada no mínimo legal, por ser medida da mais lídima justiça.

3.6 DA SUBSTITUIÇÃO DA EVENTUAL PENA A SER APLICADA

Uma vez desclassificado o delito e aplicada a sanção mínima, verifica-se que a pena de reclusão será de 01 (um) ano, conforme dispõe o artigo 155 do Código Penal Brasileiro.

Nessa senda, é imperioso destacar a letra do art. 44, incisos I, II e III, do Código Penal Brasileiro, verbis:

“Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:

I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;

II – o réu não for reincidente em crime doloso;

III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. Grifou-se.

Nesse cenário, considerando-se que a eventual pena a ser aplicada não será superior a quatro anos, que o suposto crime não foi cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, que o apelante não é reincidente, bem como os antecedentes, a conduta social e a sua personalidade lhes são favoráveis, resta cristalino que a substituição da pena restritiva de liberdade por restritivas de direitos é medida de rigor.

Assim, para que não paire quaisquer dúvidas acerca do direito arguido, veja-se o entendimento jurisprudencial:

APELAÇÃO CRIMINAL. RECURSO DA DEFESA. FURTO SIMPLES. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. POSSIBILIDADE. APELO PROVIDO. – Uma vez preenchidos, cumulativamente, os requisitos dispostos no art. 44, incisos I, II e III do Código Penal, constitui direito subjetivo do Recorrente a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.

(TJ-AM 02575136320148040001 AM 0257513-63.2014.8.04.0001, Relator: XXXXXX, Data de Julgamento: XX/XX/XXXX, Segunda Câmara Criminal). Grifou-se.

Nessa vereda, na remotíssima possibilidade de condenação do apelante pelo crime de furto simples, a eventual pena de reclusão a ser aplicada deverá ser substituída por penas restritivas de direitos, uma vez que o plexo fático no qual se desenvolveu o suposto crime, assim como as condições de caráter subjetivo e objetivo, autorizam a mencionada substituição.

4 – PEDIDOS

Diante de tudo que fora exposto, requer o apelante o conhecimento e provimento do presente recurso de apelação, de forma que seja decretada:

a) a rejeição da denúncia por inépcia material (art. 395, III, do CPP);

b) a rejeição da denúncia por falta de condição para o exercício da ação penal (art. 395, II, segunda parte, do CPP);

c) a ilicitude da prova carreada aos autos por estar eivada de vícios (art. 5º, LVI, da CF/88 e art. 157 do CPP);

d) a nulidade da sentença condenatória e de todo o processo penal por estarem fundados em prova obtida por meio ilícito.

Contudo, não reconhecendo esse Egrégio Tribunal as preliminares acima apontadas, requer seja dado provimento ao presente recurso de apelação, com a reforma da sentença condenatória proferida e a consequente decretação de:

e) absolvição por estar provado que o apelante não concorreu para a infração penal (art. 386, IV, do CPP);

f) absolvição por não existir prova de ter o apelante concorrido para a infração penal (art. 386, V, do CPP);

g) absolvição do apelante por não existir prova suficiente para a condenação (art. 386, VII, do CPP);

Por fim, considerando o critério da eventualidade, em sendo mantida a decisão proferida pelo juízo a quo, o que não se espera, requer subsidiariamente:

h) a desclassificação do delito de furto qualificado para o delito de furto simples (art. 155 do CPB);

i) a fixação da pena definitiva no mínimo legal;

j) a substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos (art. 44, I, II e III, do CPB).

Nestes termos,

Pede e espera deferimento.

Local…, Data…

Advogado (a)

OAB