Habeas corpus – liminar, da não produção de provas lícitas
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO TAL
FULANO DE TAL, NACIONALIDADE, advogado (a), inscrito (a) na OAB/UF sob o nº 000000, com escritório na Rua TAL, NA CIDADE/UF, com escritório profissional na Rua TAL, onde recebe intimações, vem respeitosamente perante esse Egrégio Tribunal, com fulcro no art. 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal de 1988 e artigos 647 e 648, ambos do Código de Processo Penal, impetrar o presente
HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO COM PEDIDO DE CONCESSÃO DE LIMINAR
em benefício do paciente NOME DO CLIENTE, nacionalidade, estado civil, profissão, portador do CPF/MF nº 0000000, com Documento de Identidade de n° 000000, residente e domiciliado na Rua TAL, nº 00000, bairro TAL, CEP: 000000, CIDADE/UF, atualmente recolhido na Penitenciária TAL, o qual vem sofrendo violenta coação em sua liberdade, por ato ilegal e abusivo do Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito da 00ª Vara Criminal da Comarca de CIDADE/UF, pelos motivos de fato e de direito a seguir delineados:
DA SÍNTESE DOS FATOS
Constam nos autos do processo criminal n.º 00000, o qual tramitou na 00ª Vara Criminal da Comarca de CIDADE/UF, que supostamente o paciente praticou o crime de TAL.
Chegando o fato ao conhecimento da autoridade policial, instaurou-se o inquérito policial para apurar eventual infração penal. Ouvido a vítima, acusado e testemunhas, a Delegada de Polícia Civil decidiu por indiciar FULANO DE TAL pela prática descrita no artigo 00 do Código Penal, bem como representar por sua prisão preventiva.
Em depoimento na esfera policial (discorrer fatos).
O ilustre representante do “Parquet” denunciou o ora paciente nas condutas previstas nos artigos 00 e 00 todos do Código Penal. Em DIA/MÊS/ANO o Excelentíssimo Juiz decretou a prisão preventiva de FULANO DE TAL, fundamentando (discorrer fatos).
Ocorre Nobre Julgador, que a decretação da prisão preventiva do paciente não encontra qualquer respaldo no ordenamento jurídico, motivo de sua ilegalidade.
DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 prescreve em seu art. 5º, inciso LXVIII, que será concedido “habeas corpus” sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.
Em igual substrato, o Código de Processo Penal contempla em seus artigos 647 e 648:
“Art. 647. Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar;”
“Art. 648. A coação considerar-se-á ilegal:
I – quando não houver justa causa; (…)”
Há que se mencionar ainda o Pacto de São José da Costa Rica, recepcionado em nosso ordenamento jurídico brasileiro, que em seu art. 7º, é taxativo ao expor que toda pessoa tem direito a liberdade, sendo que ninguém pode ser submetido ao encarceramento arbitrário.
Assim, para ocorrer o cerceamento da liberdade de qualquer cidadão deve-se observar os princípios e garantias previstos na Carta Magna, o que foi gritantemente violado, além de, vislumbrar que, no caso em tela, não ocorreram os requisitos do artigo 312 do CPP (prisão preventiva) do paciente que foi determinada com base em suposições que não encontram qualquer amparo nas provas colhidas, consubstanciando ainda no presente writ, a exacerbação e reiterados erros na aplicação da dosimetria da pena.
DAS NULIDADES
De acordo com Tourinho Filho “todo ato viciado ou com algum defeito, por ter sido praticado sem a observância da forma legal, é passivo de receber a sanção penal chamada de nulidade. A nulidade apresenta-se como a sanção penal aplicada ao processo, ou há algum ato processual defeituoso e com vícios, praticado sem observância da forma prevista em lei ou em forma proibida pela lei processual penal”. Desta forma, o motivo para a existência das nulidades é a necessidade de um procedimento processual feito de acordo com as formalidades exigidas para os atos processuais, já que é garantia para as partes ter um processo justo e regular, como preceitua a Constituição Federal de 1988.
DA VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA
É cediço que no antigo sistema inquisitório (o qual surgiu logo após o acusatório clássico), dentre outras peculiaridades, as provas eram calculadas conforme cálculo matemático em que se distribuíam pontos dentre cada prova apresentada e ao final, a somatória de tais pontos determinava a condenação ou absolvição do réu. Neste sistema havia o “xeque-mate da ação penal”, o qual possuía o nome de Rainha das provas, que consistia na apresentação de uma prova que automaticamente decretasse a condenação ou absolvição do acusado (exemplo: confissão). Apresentada tal prova a instrução penal não se fazia mais necessária e o juiz então, considerando aquela prova como suficiente, condenava ou absolvia o réu.
Com o novo sistema inquisitório (parte da doutrina diz sistema inquisitório misto) este sistema de valoração de provas caiu por terra, vez que entendeu-se que a rainha das provas poderia vir acompanhada de algum vício, como por exemplo uma confissão para livrar outra pessoa, bem como deveria se considerar a aplicação de princípios basilares do direito penal como o favor rei (favor libertatis), que tão importante se fez acabou por consolidado no artigo 386, inciso VII do Código de Processo Penal pátrio, in verbis:
Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça:
(…)
VII – não existir prova suficiente para a condenação
Trazendo tais informações para os autos, o que se vê é utilização por parte do Meritíssimo Juiz de direito da 00ª Vara Criminal de CIDADE/UF do instituto da rainha das provas, considerando que o único indício de uma conduta reprovável por parte do paciente parte do depoimento de uma única testemunha que sequer presenciou os fatos.
DA NÃO PRODUÇÃO DE PROVAS ILÍCITAS
O processo como um procedimento em contraditório gira em torno da sentença, ou seja, do provimento final, a qual nada mais é do que o resultado do procedimento. As provas, principalmente testemunhais, devem ser lícitas e estarem sem qualquer tipo de contaminação, uma vez que maculada, também contaminam a sentença, tornando sua eficácia neutralizada.
Assim diz a Constituição Federal:
Artigo 5º (…)
LVI – são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.
(Discorrer sobre os fatos)
O Código de Processo Penal em seu artigo 213 diz:
Art. 213. O juiz não permitirá que a testemunha manifeste suas apreciações pessoais, salvo quando inseparáveis da narrativa do fato.
Como o próprio artigo diz, só é admitido a manifestação de apreciações pessoais quando estas são inseparáveis do fato, o que NÃO OCORRE no presente caso. (Discorrer sobre os fatos).
Pode-se citar neste caso a teoria da árvore dos frutos envenenados (fruits of poisonous), que ao falar do processo penal diz que a simples prova obtida por meio ilícito, contamina todas as demais provas, tornando todo o procedimento nulo. No caso em tela, (discorrer sobre os fatos).
Pelo exposto Nobre Desembargador, pôde-se analisar que as nulidades foram referentes a princípios basilares dos direitos e garantias fundamentais do cidadão, conforme a Constituição Federal de 1988. Sendo assim, tais princípios violados impossibilitaram o regular procedimento do feito, tornando o processo nulo/nulidade absoluta, visto que o corolário de todos os princípios constitucionais é o devido processo legal, que foi notoriamente ferido.
AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS DA PREVENTIVA
É evidente que a Constituição Federal também possibilita a decretação de prisão provisória antes de uma sentença condenatória transitada em julgado, entretanto, essas prisões têm caráter eminentemente cautelar e, como toda medida dessa linhagem, para serem legitimamente decretadas devem preencher os requisitos cautelares do fumus comissi delicti e periculum in libertatis, sendo imprescindível, portanto, que a existência do crime esteja devidamente comprovada e que haja, pelo menos, indícios mínimos de autoria (fumus boni iuris), além de comprovação da necessidade da prisão, ou seja, risco para o transcurso normal do processo, caso não seja ela decretada (periculum in mora).
Em suma, a prisão cautelar só poderá ser decretada, quando, havendo indícios de autoria e prova da materialidade, for necessária para a garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal (artigo 312 do Código de Processo Penal). Assim, ainda que Vossas Excelências considerem haver indícios suficientes de autoria, o mesmo não se pode dizer com relação ao periculum in libertatis, pois essa exigência cautelar aqui não se encontra presente.
Não há nos autos elementos que façam supor que o paciente, que sequer registra outros processos criminais tramitando em seu desfavor, pretendia se furtar à apuração de sua responsabilidade criminal ou influir no depoimento de testemunhas, com o objetivo de obstaculizar o decurso da instrução processual, ou seja, não se vislumbra, nesse caso, o risco que a liberdade do expoente poderia oferecer ao deslinde da instrução processual, à ordem pública, tampouco à aplicação da lei penal, ausentes, portanto, os requisitos para a decretação da prisão preventiva.
Diga-se que as justificativas de uma prisão cautelar devem ressurgir de elementos de convicção existentes nos autos, ou seja, a declaração da vítima de um suposto crime cometido, que ao menos fora investigado, ocorrido há mais de trinta anos não pode ser considerada como argumento para a caracterização do periculum in libertatis. Essa, aliás, é a lição de Luís Flávio Gomes, que com extrema propriedade doutrina “que a prisão cautelar é excepcional e instrumental. Desse modo, só se justifica quando o juiz, motivadamente, demonstra seu embasamento fático e jurídico, valendo das provas produzidas dentro do processo” (Direito de Apelar em Liberdade, Ed. RT, p. 39).
Destaca-se que a simples alegação de gravidade do delito não é suficiente a sustentar decreto prisional cautelar, posto que como pacífico entendimento doutrinário e jurisprudencial, a necessidade da medida deve ser comprovada por fatos concretos e não apenas na afirmação de que a gravidade do crime afeta a paz social e deixa abalada a comunidade local.
Neste sentido já decidiram o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça:
Boletim Informativo nº 213 do STJ. DECISÃO DA 6ª TURMA. PRISÃO PREVENTIVA. REQUISITOS. FUNDAMENTAÇÃO. A gravidade do delito mesmo quando praticado crime hediondo, se considerada de modo genérico e abstratamente, sem que haja correlação com a fundamentação fático objetiva, não justifica a prisão cautelar. A prisão preventiva é medida excepcional de cautela, devendo ser decretada quando comprovados objetiva e corretamente, com motivação atual, seus requisitos autorizadores. O clamor público, por si só, não justifica a custódia cautelar. Precedentes citados: HC 5.626-MT, DJ 16/6/1997, e HC 31.692- PE, DJ 3/5/2004. HC 33.770-BA, Rel. Min. Paulo Medina, julgado em 17/6/2004.
Assim, não se pode compreender na expressão garantia da ordem pública, a questão do clamor público, porque não estaria sendo aferido neste caso o perigo que a liberdade do paciente poderia acarretar, mas tão somente a gravidade objetiva do crime e os anseios da sociedade.
Em relação à aplicação da lei penal, não há fundamento para a decretação da prisão preventiva, pois não há receio de que o paciente, se solto, venha a evadir-se do distrito da culpa, uma vez que possui bons antecedentes, residência fixa, identidade certa e trabalho.
DOS PRESSUPOSTOS DA MEDIDA LIMINAR
Diante da flagrante ilegalidade da decretação da prisão do paciente, não pairam dúvidas para que, num gesto de estrita justiça, seja concedida liminarmente o direito à liberdade ao mesmo.
A plausibilidade jurídica da concessão da liminar encontra-se devidamente caracterizada. O “fumus comissi delicti”, significa a fumaça do cometimento do delito, o qual pelos elementos fáticos e jurídicos trazidos à colação não foram capazes de demonstrar a efetiva participação do paciente no crime emo comento. Por sua vez, no que concerne o “periculum libertatis” (perigo na liberdade do acusado), conforme demonstrado minuciosamente, não vislumbra-se qualquer justificativa plausível para a prisão cautelar do paciente.
Cabe citar os ensinamentos do jurista Alberto Silva Franco, veja-se:
“É evidente, assim, que apesar da tramitação mais acelerada do remédio constitucional, em confronto com as ações previstas no ordenamento processual penal, o direito de liberdade do cidadão é passível de sofrer flagrante coarctação ilegal e abusiva. Para obviar tal situação é que, numa linha lógica inafastável, foi sendo construído, pretoriamente, em nível de habeas corpus, o instituto da liminar, tomando de empréstimo do mandado de segurança, que é dele irmão gêmeo. A liminar, em habeas corpus, tem o mesmo caráter de medida de cautela, que lhe é atribuída do mandado de segurança”.
Frente ao exposto, a presente ordem de habeas corpus deve ser concedida liminarmente com o fim de obstar a prisão preventiva do ora paciente.
DOS PEDIDOS
Diante do exposto, resta induvidoso que o paciente sofreu constrangimento ilegal por ato da autoridade coatora, o Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito da 00ª Vara Criminal da Comarca de CIDADE/UF, circunstância “contra legem” que deve ser remediada por esse Colendo Tribunal. Isto posto, com base no artigo 5º, LXVIII, da CF, c/c artigos 647 e 648 do CPP, requer:
a) a oitiva da Douta Procuradoria de Justiça na condição de “custos legis”, para que apresente parecer;
b) a requisição de informações ao Meritíssimo Juiz da 00ª Vara Criminal da Comarca de CIDADE/UF, ora apontado como autoridade coatora;
c) a confirmação no mérito da liminar pleiteada para que se consolide, em favor do paciente FULANO DE TAL, a competente ordem de “habeas corpus”, para fazer impedir o constrangimento ilegal que o mesmo vem sofrendo, como medida da mais inteira Justiça, expedindo-se, imediatamente, o competente ALVARÁ DE SOLTURA, a fim de que seja o paciente posto em liberdade;
d) A intimação pessoal do Douto Advogado para a sustentação oral, a ser marcada em dia e hora por esta Colenda Câmara.
Pede Deferimento.
CIDADE, 00, MÊS, ANO
ADVOGADO
OAB Nº