PEDIDO DE LIBERDADE ASSISTIDA

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUÍZ DE DIREITO DO JUIZADO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE.

Súmula 492: “O ato infracional análogo ao tráfico de drogas, por si só, não conduz obrigatoriamente à imposição de medida socioeducativa de internação do adolescente” (margem a esquerda)

QUALIFICAÇÃO DO ADOLESCENTE RESPONSAVEL E ADVOGADO

I- DO NÃO CABIMENTO DA INTERNAÇÃO PARA ATO ANÁLOGO AO TRÁFICO DE DROGAS

É preciso ter em conta que mesmo em se tratando do tráfico de drogas, crime equiparado a hediondo (artigo 2º., da Lei 8.072/90 c/c artigo 5º., XLIII, CF), é fato que essa prática delitiva não conta com o elemento da violência ou da grave ameaça. A falta desses elementos da violência ou da grave ameaça tem sido interpretada pela jurisprudência do STJ, e que se cristaliza na Súmula 492, como óbice à decretação da medida de internação pelo E. Juízo da Infância e Juventude nos estritos termos do artigo 122, I, da Lei 8.069/90.

Neste sentido: (MARGEM A ESQUERDA)

ATO INFRACIONAL. TRÁFICO. ENTORPECENTES. ART. 122, ECA. O ato infracional equiparado ao crime de tráfico de entorpecentes e não cometido mediante grave ameaça ou violência à pessoa não justifica a medida sócio-educativa de internação. O art. 122 do ECA enumera taxativamente as hipóteses em que pode ser decretada a internação do adolescente infrator, não estando previsto o ato infracional equiparado ao tráfico de entorpecentes, apesar de sua gravidade. Precedentes citados: HC 9.619-SP, DJ 7/2/2000; HC 12.343-SP, DJ 12/6/2000; HC 10.938-SP, DJ 24/4/2000, e RHC 10.175-SP, DJ 2/10/2000. (STJ. HC XXXXX/SP. 5ª Turma, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, julgado em 28/11/2000).

II – DO CONCEITO DE REITERAÇÃO NO SISTEMA SOCIOEDUCATIVO

O que se depreende da leitura das decisões da lavra do Exmo. Magistrado acerca da internação provisória para tráfico é que o critério basilar utilizado é o adolescente está sendo acusado de outro ato infracional ou não, ou seja, nem mesmo pode se falar em reincidência.

Não obstante, somente se poderá cogitar de internação em tráfico havendo reiteração da conduta pelo adolescente, vez que esta é inegavelmente grave, embora não revestida das características da violência ou grave ameaça. É o que estabelece com clareza solar o artigo 122, II, da Lei 8.069/90.

Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando:

I – tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa;

II – por reiteração no cometimento de outras infrações graves;

III – por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta.

A reiteração, por sua vez, conforme entendimento balisado do STJ, só resta configurado com a prática de 3 (três) ou mais atos infracionais, pois se o legislador quisesse considerar como tal a prática de 2 (dois) atos infracionais, teria utilizado a expressão reinciência e não reiteração. Elenca-se os seguintes julgados neste sentido:

HABEAS CORPUS. PENAL. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES. APLICAÇÃO DA MEDIDA DE INTERNAÇÃO POR PRAZO INDETERMINADO. REITERAÇÃO DELITIVA NÃO DEMONSTRADA. ART. 122 DO ECA. ROL TAXATIVO. ILEGALIDADE CONFIGURADA. ORDEM CONCEDIDA.

  1. O art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece que a internação do adolescente será cabível quando o ato infracional é cometido com violência ou grave ameaça a pessoa ou na hipótese de reiteração no cometimento de outras infrações graves ou por descumprimento reiterado e injustificado de medida anteriormente aplicada.
  2. A prática de ato infracional análogo ao crime de tráfico de entorpecentes, em razão da sua gravidade abstrata, por si só, não autoriza a segregação do menor.
  3. É assente na jurisprudência o entendimento no sentido de que a reiteração no cometimento de infrações capaz de ensejar a incidência da medida socioeducativa da internação, a teor do art. 122, inciso II, do ECA, ocorre quando praticados, no mínimo, 3 (três) atos infracionais graves. (REsp XXXXX/RS, Rel. Min. Felix Fischer, 5.ª Turma, DJ 03.09.2007, p. 217)
  4. Ordem concedida para cassar o aresto impugnado, anulando-se a decisão de primeiro grau e determinando-se que outra seja proferida, autorizando o paciente aguardar em liberdade assistida o novo decisum (HC XXXXX/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, DJU 04.08.2008).(grifo nosso).

HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. WRIT IMPETRADO PERANTE O E. TRIBUNAL A QUO AINDA NÃO APRECIADO. DENEGAÇÃO DE LIMINAR. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO DELITO DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES. MEDIDA DE INTERNAÇÃO. EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA EXTREMA. SUPERAÇÃO DA SÚMULA 691 DO PRETÓRIO EXCELSO. FLAGRANTE ILEGALIDADE. ORDEM CONCEDIDA.

(…)

II – A medida sócio-educativa de internação está autorizada nas hipóteses taxativamente previstas no art. 122 do ECA. (Precedentes).

III – A gravidade do ato infracional equivalente ao delito de tráfico de entorpecentes não enseja, por si só, a aplicação da medida sócio-educativa de internação, se a infração não foi praticada mediante grave ameaça ou violência à pessoa, ex vi do art. 122, inciso I, do ECA. (Precedentes).

IV – A reiteração no cometimento de infrações capaz de ensejar a incidência da medida sócio-educativa da internação, a teor do art. 122, inciso II, do ECA, ocorre quando praticados, no mínimo, 3 (três) atos infracionais graves.(Precedentes). Habeas corpus concedido.(HC XXXXX/SP, Relator Ministro FELIX FISCHER, DJe 26.10.09). (grifo nosso).

HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO A FURTO. INTERNAÇÃO POR PRAZO INDETERMINADO. ROL TAXATIVO DO ART. 122 DO ECA. AUSÊNCIA DE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA. NÃO CONFIGURAÇÃO DE REITERAÇÃO NO COMETIMENTO DE OUTRAS INFRAÇÕES GRAVES. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO DO WRIT. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA, APENAS PARA ANULAR O ACÓRDÃO VERGASTADO, NO TOCANTE À MEDIDA DE INTERNAÇÃO, A FIM DE QUE OUTRO DECISUM SEJA PROLATADO, DEVENDO, ENQUANTO ISSO, PERMANECER O MENOR EM LIBERDADE ASSISTIDA, SE POR OUTRO MOTIVO NÃO ESTIVER INTERNADO.

  1. A medida de internação por prazo indeterminado é de aplicação excepcional, de modo que somente pode ser imposta ou mantida nos casos taxativamente previstos no art. 122 do ECA, e quando evidenciada sua real necessidade.
  2. O conceito de reiteração previsto nos incisos II e III do art. 122 não se confunde com o de reincidência. Segundo diretriz deste Colendo Tribunal, para ficar caracterizada reiteração no cometimento de outros atos infracionais graves urge, no mínimo, a prática de 3 atos anteriores, o que não se verifica na hipótese vertente.(HC XXXXX/SP, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe de 30.11.09). (grifo nosso).

Por tudo exposto, percebe-se que o fato de possuir o adolescente contra si um outro processo de apuração de ato infracional não pode ser caracterizado como “reiteração” e, sendo a conduta de tráfico de drogas sem violência ou grave ameaça, patente fica a ausência de requisitos para a manutenção da internação provisória.

III- DA EXCEPCIONALIDADE DA INTERNAÇÃO PROVISÓRIA

Insta averbar que a internação provisória é dotada de excepcionalidade, somente podendo ser decretada em hipóteses excepcionais, quando demonstrada a real necessidade de imposição desta medida cautelar, tendo em vista, por exemplo, a periculosidade do adolescente em razão de sua propensão a prática de atos infracionais ou a gravidade concreta do ato denotada pelo modus operandi.

Com efeito, vem assentando a Colenda Corte Superior de Justiça contundentemente que “a decisão que decreta a internação, antes da sentença, nos mesmos moldes de qualquer decisão que venha a restringir cautelarmente a liberdade individual de qualquer pessoa, deve conter fundamentação idônea, com a demonstração inequívoca da necessidade da medida excepcional (ex vi do art. 108 do ECA).” [1]

No caso em apreço, o adolescente não demonstram qualquer ameaça à ordem pública. Não revela propensão à prática delitiva capaz de gerar temor ao meio social. A propósito, contra o adolescente não existe QUALQUER processo de apuração de ato infracional além do presente.

Também não põem em risco a instrução processual e a aplicação da lei, posto que não há qualquer indicativo no feito de que possam vir a ameaçar testemunhas ou se evadir do distrito da culpa, bem como se comprometem a comparecer a todos os atos processuais, inclusive acompanhados dos responsáveis.

É de bom alvitre enfatizar que, consoante o preceituado no art. 108, parágrafo único, do ECA, a decisão que decreta a internação provisória “deverá ser fundamentada e basear-se em indícios suficientes de autoria e materialidade, demonstrada a necessidade imperiosa da medida.”.

Vale dizer, à luz do nosso Estado Democrático de Direito, as medidas constritivas de liberdade, notadamente em se tratando de adolescente sobre o qual recai a imputação de ato infracional equiparado a crime, somente podem ser determinadas quando houver efetiva e real ameaça à ordem pública a partir da análise dos elementos concretos contidos nos autos.

A título de reforço argumentativo, invocamos, outrossim, julgados do Superior Tribunal de Justiça no sentido da desnecessidade da constrição corporal do adolescente quando não há motivação idônea para tanto, in litteris:

HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. INTERNAÇÃO PROVISÓRIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. ARTIGO 108 DO ECA. ORDEM CONCEDIDA.

  1. A internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias, devendo a decisão ser fundamentada e basear-se em indícios suficientes de autoria e materialidade, demonstrada a necessidade imperiosa da medida.
  2. O art. 108 do ECA deve ser interpretado por analogia ao disposto no art. 312 do Código de Processo Penal, exigindo fundamentação objetiva e concreta.
  3. Ordem concedida para cassar a decisão proferida pelo Tribunal a quo nos autos do Agravo de Instrumento interposto pelo Ministério Público, a fim de que o paciente aguarde em liberdade o julgamento do mérito do agravo.

(HC XXXXX/SP, Rel. Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, SEXTA TURMA, julgado em 16/05/2006, DJ 26/06/2006, p. 212)

HABEAS CORPUS. RECEPTAÇÃO. MEDIDA DE INTERNAÇÃO PROVISÓRIA. FUNDAMENTAÇÃO. INEXISTÊNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL.

  1. A decisão que decreta a internação, antes da sentença, nos mesmos moldes de qualquer decisão que venha a restringir cautelarmente a liberdade individual de qualquer pessoa, deve conter fundamentação idônea, com a demonstração inequívoca da necessidade da medida excepcional (ex vi do art. 108 do ECA).
  2. Consoante entendimento desta Corte, a simples alusão a prática de um único ato infracional anterior, por si só, não justifica a aplicação da internação provisória.
  3. Ordem concedida.

(HC XXXXX/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 16/08/2012, DJe 27/08/2012)

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. CUSTÓDIA PROVISÓRIA DO ADOLESCENTE. INTERNAÇÃO PROVISÓRIA. GRAVIDADE DO ATO INFRACIONAL. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO.

ORDEM CONCEDIDA.

  1. Tem-se como fundamento insuficiente para a antecipação dos efeitos da tutela em agravo de instrumento interposto pelo Ministério Público, em que se pleiteia a internação provisória de menor representado pela prática de ato infracional equiparado ao delito de tráfico ilícito de entorpecentes, a mera referência ao art. 108 do ECA, dissociada de elementos concretos a demonstrar a necessidade de garantir a segurança do adolescente ou a manutenção da ordem pública.
  2. Ordem concedida para restabelecer a decisão que indeferiu o pedido de internação provisória do paciente.

(HC XXXXX/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 17/05/2007, DJ 11/06/2007, p. 337)

É de sublinhar-se que, para se decretar a internação provisória de adolescente em processo de apuração de ato infracional, a autoridade judicial deve se embasar nas hipóteses de decretação de prisão preventiva previstas no art. 312, do Código de Processo Penal, in verbis:

“Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.”

Assim, primeiramente deve-se haver convencimento, após uma análise sumária do mérito, de que há prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria.

Por fim, ainda que convencido da existência do crime e de indicativos de autoria do delito, a prisão preventiva só deve ser decretada acaso necessária para a garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal.

Compulsando os autos, infere-se que nenhuma dessas hipóteses se faz presente.

Dentre a controvérsia do que seja garantia da ordem pública, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem orientação de que esta seja a reiteração criminosa, o que não se vê presente nesse caso. Até porque, frise-se, não existem ações socioeducativas instauradas contra os adolescentes com sentença transitada em julgado, sendo eles tecnicamente primários.

Também não se vê presente o requisito da garantia da ordem econômica, pois a aplicação desse dispositivo incide mais nos casos de crimes que tem como bem jurídico afetado a ordem econômica, portanto, a aplicação desse dispositivo é útil nos crimes definidos na Lei nº 8.137/90 e não em atos infracionais desse jaez, desmerecendo, assim, maiores comentos.

Já no que diz respeito à conveniência da instrução criminal, não há notícia nos autos de que os representados estejam ameaçando testemunhas ou conturbando a colheita de provas.

Por fim, quanto ao requisito do asseguramento da aplicação da Lei Penal, também não há nos autos elemento fático que indique de modo concreto que o adolescente irão se evadir. Ademais, o mesmo se compromete a comparecer espontaneamente a todos os atos processuais a que forem intimados.

Diante dos aspectos acima analisados, requer a VOSSA EXCELÊNCIA:  

a) A liberação imediata do adolescente, uma vez que não vê presentes nos autos os motivos fáticos previstos no art. 108, da Lei nº 8.069/90 e art. 312 do CPP.

Pede deferimento.

CIDADE, ESTADO DATA

ADVOGADO

UF/OAB