Resposta do acusado – estupro de vulnerável, tentativa, erro do tipo
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 00ª VARA CRIMINAL DA CIDADE – CE.
Ação Penal
Proc. nº. ……………………..
Autor: Ministério Público Estadual
Acusado: José das Quantas
Intermediado por seu mandatário ao final firmado, causídico inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do Ceará, sob o nº. 112233, comparece o Acusado, tempestivamente (CPP, art. 396, caput), com todo respeito à presença de Vossa Excelência, para apresentar, com abrigo no art. 396-A da Legislação Adjetiva Penal, a presente
RESPOSTA À ACUSAÇÃO,
evidenciando fundamentos defensivos em razão da presente Ação Penal agitada em desfavor de JOSÉ DAS QUANTAS, já qualificado na exordial da peça acusatória, consoante abaixo delineado.
1 – SÍNTESE DOS FATOS
Consta da denúncia que o Acusado, no dia 00 de maio do ano em curso, por volta das 21:45h, abordara a vítima, com idade de 13 anos e 7 meses, com o propósito de praticar ato sexual. Destaca ainda a peça acusatória que o Réu prometera a quantia de R$ 50,00(cinquenta reais) à infante, como pagamento por um “programa” com essa. Todavia, o ato não se consumou por razões alheias a vontade daquele.
Observa mais a peça acusatória que Acusado e vítima, diante da promessa de pagamento pelo ato sexual, foram no carro daquele ao Motel Xista. Passados alguns instantes, quando ambos encontravam-se no quarto, policiais militares adentraram ao recinto. Nessa ocasião, indagada à infante acerca de sua idade, essa prontamente declarou que era menor de idade. Ambos, segundo ainda a peça vestibular, estavam nus na cama, em uma situação que claramente apresentava o início da relação sexual.
Em conta disso, na data acima mencionada, o Acusado fora preso em flagrante delito.
Diante desse quadro, o Ministério Público denunciou o Acusado como incurso na pena descrita no art. 217-A, do Código Penal (Prática de ato libidinoso com menor vulnerável)
2 – NO ÂMAGO DA DEFESA
2.1. Atipicidade da conduta descrita – Ausência de Crime (CP, art. 20)
A peça acusatória é imprecisa, vaga e eivada de inverdades.
Na verdade, o Réu encontrava-se no restaurante denominado Beira Mar, por volta de 21:00h, sozinho, quando fora abordado pela menor. De início essa se mostrou interessada em saber qual a profissão do Réu, onde morava, seu estado civil etc. Todavia, quando esse indagou se aquela estudava ou mesmo trabalhava, a resposta fora rápida e sem qualquer inibição: fazia programas para sustentar-se. Prontamente o Acusado indagara a idade da vítima. A mesma respondera ter 16 anos de idade incompletos.
Desconfiado, o Acusado ainda não quis acreditar na resposta ofertada. Nesse momento, por prudência, questionou quando a garota fazia aniversário. Essa respondeu rapidamente que seria 15 de agosto, fazendo crer que a pronta explicação daria maior credibilidade ao que lhe fora questionada.
É preciso salientar que a infante apresentava características físicas de uma pessoa bem mais amadurecida. O discurso da mesma também trazia maior credibilidade quanto à falsa idade afirmada. Tudo levava a crer, portanto, que essa, de fato, teria a idade informada.
Desse modo, após fartas indagações acerca da idade da infante, acreditando nisso, ambos direcionaram-se ao motel mencionado na peça acusatória. Chegaram a trocar carícias, todavia inexistiu a conjunção carnal. Fato esse até mesmo levantado na denúncia.
Por esse norte, não há qualquer dúvida de que o ato libidinoso tenha sido consentido. É dizer, inexistiu o emprego de violência ou mesmo resistência por parte da menor.
Nesse diapasão, indiscutivelmente a conduta é atípica, pois inexiste a figura do dolo. O tipo penal descrito na peça proemial reclama comportamento volitivo doloso. Não é o caso, óbvio. Assim, é impositiva a absolvição do Réu, maiormente quando o conjunto probatório revelado pela acusação autoriza o reconhecimento do erro de tipo, previsto no art. 20 do Código Penal.
De fato, o Réu fora levado a erro pela própria vítima.
Com esse enfoque, de toda conveniência salientar o magistério de Cezar Roberto Bitencourt, in verbis:
“Erro de tipo é o qual recai sobre circunstância que constitui elemento essencial do tipo. É a falsa percepção da realidade sobre um elemento do crime. É a ignorância ou a falsa representação de qualquer dos elementos constitutivos do tipo penal. “ (BITENCOURT, Cesar Roberto. Erro de tipo e erro de proibição. 6ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 150)
(não existem os destaques no texto original)
Com o mesmo sentir, estas são as lições de Paulo César Busato, ad litteram:
“O engano sobre qualquer elemento objetivo formal da pretensão conceitual de relevância compõe uma necessária afetação do compromisso para com a produção de um resultado. Como se sabe, o dolo é compromisso com a produção do resultado.
Sempre que se deseja a produção de um resultado, ou, no mínimo, se compromete com tal produção no plano subjetivo, anuindo com sua produção, é imprescindível falar em uma adequada compreensão de tal ilícito. A razão é elementar: a característica do dolo, seja direto ou eventual, é a previsão. Não é possível falar em dolo sem previsão e a previsão inclui o conhecimento. Se não for possível afirmar concretamente o conhecimento – em função do erro –, não é possível previsão, logo, tampouco é possível a afirmação do dolo. “ (BUSATO, Paulo César. Direito penal: parte geral. São Paulo: Atlas, 2013, p. 639)
(itálico conforme o original)
A esse propósito, oportuno mencionar a orientação jurisprudencial:
PENAL. ESTUPRO. ABSOLVIÇÃO – NECESSIDADE. DESCONHECIMENTO DA IDADE DA VÍTIMA. ERRO DE TIPO. ARTIGO 20 DO CÓDIGO PENAL. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
1. Impõe-se a absolvição quando o apelante pratica a ação típica incorrendo em erro sobre circunstância elementar, o que afasta a tipicidade da conduta. 2. O error aetatis afasta o dolo e consequentemente a adequação típica da conduta. 3. Recurso provido. (TJMG – APCR 1.0456.06.049698-5/001; Rel. Des. Pedro Vergara; Julg. 25/02/2014; DJEMG 10/03/2014)
APELAÇÃO CRIMINAL.
Entrega de cigarro a adolescente (art. 243, eca). Pedido de absolvição por erro de tipo (art. 20, caput, cp). Alegado desconhecimento da menoridade. Procedência. Aplicação dos princípios da exclusiva proteção dos bens jurídicos, intervenção mínima e proporcionalidade. Reconhecimento da atipicidade dos fatos descritos na denúncia (art. 386, inc. III, cpp). Recurso provido. (TJPR – ApCr 0901787-4; Joaquim Távora; Terceira Câmara Criminal; Rel. Juiz Conv. Benjamim Acacio de Moura e Costa; DJPR 12/02/2014; Pág. 778)
E mais ainda. Os professores João Daniel Rassi e Alessandra Orcesi Pedro Greco, em uma das passagens de sua brilhante obra acerca do tema em vertente, revelando reflexões acerca do critério da idade, destacam que:
“Não se trata, contudo, de um elemento de natureza absoluta. Como elemento do tipo, ele é normativo e, no caso específico, poderá ser interpretado de acordo com o que foi estabelecido como critério legal de menoridade no Estatuto da Criança e do Adolescente, ou seja, é considerado menor, ou criança, aquele que não atingiu 12 anos. A previsão estatutária da idade de 12 anos abre ensejo para que o intérprete utilize o aspecto da sociologia da sexualidade já amplamente exposta no Capítulo 1.
Assim, a elementar idade da vítima não é absoluta quando se estiver diante de um menor entre 12 e 14 anos, caso em que sua vulnerabilidade será constatada no caso concreto, ou seja, se houve ou não abuso na relação sexual entre o maior e o menor, . . . “ (GRECO, Alessandra Orcesi Pedro; Rassi, João Daniel. Crimes contra a dignidade sexual. 2ª Ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 116)
Não discrepando dessa ótica, ao contrário disso, até indo mais além do que essa linha de entendimento antes apresentada, o renomado Maximiliano Roberto Ernesto Führer leciona que:
“Com efeito, por via transversa, o tipo penal estabelece de forma absoluta que o menor de 14 anos, o doente mental ou deficiente não portador do ‘necessário discernimento’, e o que não pode oferecer resistência estão proibidos de contato amoroso com imputáveis, mesmo que esta seja a sua vontade. Na prática, a lei restringe os parceiros sexuais daquelas pessoas aos menores e aos absolutamente irresponsáveis ou inimputáveis.
( . . . )
A vida e a dignidade no viver passam necessariamente pelos efeitos da pulsão sexual.
Em função disto, temos que a presunção absoluta é francamente inconstitucional e impõe vivências subtraídas de fração significativa e essencial, vitimizando ainda mais as pessoas vulneráveis que pretende proteger. “ (FÜHER, Maximiliano Roberto Ernesto. Novos crimes sexuais. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 176)
Em arremate, mostra-se imperiosa a absolvição do Acusado, mais precisamente em razão da ausência de tipicidade penal na conduta visualizada pela acusação. (CPP, art. 386, inc. III)
3 – EM CONCLUSÃO
Espera-se, pois, o recebimento desta Resposta à Acusação, onde, com supedâneo no art. 397, inc. III, do Código de Ritos, pleiteia-se a ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA do Acusado, em face da atipicidade da conduta delitiva. Não sendo esse o entendimento, o que se diz apenas por argumentar, reserva-se ao direito de proceder em maiores delongas suas justificativas defensivas nas considerações finais, protestando, de logo, provar o alegado por todas as provas em direito processual penal admitidas, valendo-se, sobretudo, dos depoimentos das testemunhas infra-arroladas.
Sucessivamente, é de se esperar, após a colheita das provas em destaque, o julgamento direcionado a acolher os argumentos da defesa, findando em decisão de mérito absolutória (CPP, art. 386, inc. III).
Respeitosamente, pede deferimento.
Cidade (CE), 00 de março do ano de 0000.
Fulano(a) de Tal
Advogado(a)
ROL TESTEMUNHAL (CPP, art. 401)
01) FULANO .X.X., residente e domiciliado em Cidade (CE), na Av. Des. Moreira, nº. 000, apto. 333;
02) FULANO .X.X., residente e domiciliado em Cidade (CE), na Av. Des. Moreira, nº. 000, apto. 333;
03) FULANO .X.X., residente e domiciliado em Cidade (CE), na Av. Des. Moreira, nº. 000, apto. 333;
04) FULANO .X.X., residente e domiciliado em Cidade (CE), na Av. Des. Moreira, nº. 000, apto. 333;
Data Supra.