Revogação de prisão preventiva
AO MM. DE DIREITO DA 00ª VARA DO TRIBUNAL DO JÚRI DA COMARCA DE CIDADE/UF
NOME DO CLIENTE, vem à presença de V. Exa., através de seu procurador e advogado in fine assinado, com escritório sito na Rua TAL, onde recebe intimações (Inst. proc. anexo, doc. 00), requerer, com fulcro no art. 316 do estatuto processual penal, a
REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA
pelos motivos de fato e de direito que, a seguir, expõe:
A Delegacia de Polícia do 00ª Distrito Policial desta cidade, instaurou, contra o requerente inquérito policial. Intimado, comparecer ele regularmente, esclarecendo sua atuação no evento delituoso que lhe é imputado.
Após, findo o inquérito, a autoridade judicial requisitou a decretação da prisão preventiva do requerente. Tal pretensão, corroborada pelo digno representante ministerial, foi acatada por este r. Juízo, decretando-se a custódia cautelar.
Todavia, Exa., não tem cabida a manutenção da prisão cautelar contra o suplicante em razão do que, a seguir, se passa a expor:
a) Trata-se de pessoa residente nesta cidade há mais de 20 (vinte) anos, conforme o demonstra o anexo atestado de residência expedido pela competente Delegacia Distrital, confirmando-se ainda conta de luz anexa (cf. docs. 00).
b) o acusado não tem antecedentes criminais, em razão de que, a única distribuição contra ele constante, é aquela referente ao feito ora em curso (doc. 00). Ainda conta do afirmado no presente é fornecida pelas anexas certidões expedidas pelas Varas (00 e 00) de Execuções Penais e pela Corregedoria dos Presídios (cf. docs. 00).
c) Tendo o acusado ocupação lícita, possuindo empresa nesta cidade, conforme o demonstra documentação anexa, expedida pelo Ministério da Fazenda, pela Prefeitura desta cidade e pela Junta Comercial, além de cópias de notas fiscais expedidas pela sua empresa prestadora de serviços, estabelecida, aliás, na mesma rua de sua residência (cf. docs. 00, anexos).
Os elementos alinhados nos três pontos anteriores estabelecem claramente tratar-se ele de pessoa trabalhadora, não envolvida em eventos delituosos, tendo mais residência fixa.
Cabe aqui adentrar ao mérito da medida decretada: na espécie, efetivamente, resta comprovada a indispensabilidade da medida cautelar para que os fins do processo sejam atingidos? A prisão do requerente demonstra-se como dado essencial para que a prestação jurisdicional não se frustre quando da prolação da eventual sentença penal condenatória?
Passemos a discutir tais pontos:
Saliente-se inicialmente que o processo penal cautelar (compreensivo das denominadas medidas cautelares pessoais entre as quais se alinha a prisão preventiva) na busca da compatibilização dos interesses conflitantes em tal seara (de um lado o interesse do acusado de ver-se livre e, de outro, o interesse de segurança da sociedade), sem que se ultrapasse o limite do necessário na lesão ao direito individual que todos têm à liberdade, estabelece uma série de parâmetros aplicativos interdependentes convencionalmente qualificados como princípios, a serem observados quando a referência é feita à adoção ou não das medidas de cautela, valendo ressaltar entre tais princípios, o da necessidade e o da proporcionalidade. Analisemo-los, de per se, vertendo-se para a espécie, verificando se encontram presentes in casu:
QUANTO AO PRINCÍPIO DA NECESSIDADE
É ressabido que para externar-se a decretação da custódia preventiva devem concorrer duas ordens de pressupostos: os denominados pressupostos proibitórios (o fumus commisi delicti representado no nosso direito processual pela prova da materialidade do delito e pelos indícios suficientes da autoria) e os pressupostos cautelares (o periculum libertatis, representado na legislação brasileira pelas nominadas finalidades da prisão preventiva, trazidas na parte inicial do art. 312 do estatuto processual penal).
O princípio ora sob epígrafe expressa-se através dos denominados pressupostos cautelares, chamados comumente na doutrina brasileira de finalidades da prisão preventiva. Decorre de tal princípio que, para se ver decretada a medida coativa, deve revelar-se no caso concreto uma das três finalidades expressas pela lei: a conveniência da instrução criminal, o asseguramento da ordem pública ou a garantia da ordem pública. Na espécie sequer um de tais pressupostos se encontra evidenciado. Vejamos:
Com relação à conveniência da instrução criminal, saliente-se que, tão logo teve notícia do procedimento investigado contra si instaurado, o requerente compareceu ao órgão policial, onde ofereceu sua versão sobre o caso. Distintamente do que se alega, em momento algum influiu relativamente à produção de provas (e, saliente-se, nem poderia fazê-lo, em razão de que o fato unitariamente visualizado se deu tendo como testemunha apenas a vítima que, quando o acusado teve a prisão preventiva requerida, já prestara seu depoimento, sendo inclusive ouvida mais de uma vez, não tendo o acusado qualquer poder no sentido de fazer com que ela desdissesse o que já declarara).
Com referência ao asseguramento da aplicação da lei penal, referisse o dito no parágrafo anterior: o requerente, em momento algum, buscou fugir à eventual responsabilidade criminal, apresentando-se inclusive para depor sobre os fatos ocorridos, sendo de salientar-se não ter qualquer pretensão de furtar-se aos ulteriores termos do processo, somente não o tendo feito ainda (na fase judicial) em razão da decretação contra ele da prisão preventiva, cuja orquestração foi feita pela própria família da vítima a, unilateralmente, criar situação imaginária apta a fornecer elementos fáticos à decretação. Saliente-se mais não haver porque o acusado fugir à aplicação da lei penal em razão de que, fazendo-se projeção acerca do processo, há necessariamente de chegar-se à conclusão de que não será apenado com prisão, o que voltará a ser discutido quando tratar-se do princípio da proporcionalidade.
Relativamente ao dúctil fundamento da garantia da ordem pública, saliente-se que as certidões juntadas aos autos demonstram não ter qualquer sentido pensar-se em recidiva do acusado. Não tem ele qualquer passagem criminal anterior, em momento algum evidencia-se periculosidade na ação delitiva lhe imputada, sendo de salientar-se ainda que não é possível vislumbrar-se a periculosidade do acusado apenas pelo ato anti-social por ele praticado desde que unitariamente vislumbrado, não podendo a custódia preventiva ser decretada tendo em linha de conta somente as conseqüências do fato. A jurisprudência, aliás, em tal ponto é remansosa, valendo colacionar alguns exemplos, com referência a homicídios consumados:
“Habeas corpus – Homicídio – Prisão Preventiva – Ausência de periculosidade – Concessão da ordem. Habeas corpus. Homicídio. Prisão preventiva. Improcedência. Conduta delitiva não reveladora de periculosidade. Ordem concedida.” (Paraná Judiciário 3/244).
(…)
“Habeas corpus. Prisão preventiva. Homicídio qualificado – Réu primário, de bons antecedentes, profissão e residência definidas – Crime passional que não demonstra a periculosidade do agente – Concessão da Ordem. Ementa oficial: habeas corpus. Homicídio qualificado. Prisão preventiva decretada sob os pressupostos da garantia da ordem pública, da aplicação da lei penal e da conveniência da instrução criminal. Constrangimento ilegal. Comprovação de que o paciente, pelo ato isolado que representa o evento, se permanecer solto, não será ameaça à ordem pública e nem causará óbice à realização da instrução criminal.” (Paraná Judiciário 30/219).
QUANTO AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Por conta de tal princípio a medida cautelar a ser imposta deve, sempre e invariavelmente, ser proporcional ao apenamento projetado e á gravidade da infração praticada.
Assim, em conformidade com este referencial, o juiz deve, tendo em mãos o pedido através do qual se solicita a decretação da medida extrema, lançar os olhos para o futuro, fazendo projeção no sentido de qual será o apenamento do acusado em caso de superveniência de condenação. E, mais ainda: em caso de vislumbramento de decreto condenatório qual será o regime inicial de cumprimento de pena? Seria ainda possível a concessão de suspensão condicional da pena?
Frise-se que, tomado o direito nacional tem-se que, a rigor, a prisão preventiva somente pode ser decretada quanto se visualize condenação por infração cujo apenamento importe em imposição de regime inicial fechado, ou seja, nos termos da lei penal vigente, deve o apenamento projetado ultrapassar oito anos de reclusão. Somente assim se estará a garantir tal princípio. Isso em razão de que (veja-se o absurdo) o custodiado executa a medida e cautela integralmente em regime equivalente ao fechado. Assim, é plenamente defensável o ponto de vista no sentido de, não se projetando efeitos sancionatórios que ultrapassem oito anos de prisão e inexistentes razões impeditivas ainda que os requisitos de ordem subjetiva, todos favoráveis ao requerente), não pode o acusado sofrer a execração da prisão preventiva.
Desse exame não se pode prescindir em razão de que pode-se impor ao acusado, inadvertidamente, medida de cautela que, em termos de rigor seja exageradamente superior ao apenamento projetado. Saliente-se: é exatamente isso o ocorrente na espécie.
Observe-se a necessidade de afastar-se o aforisma no sentido de que em sede de procedimento penal cautelar não se examina o mérito, para fugir-se a pré-julgamento. Aliás, nada mais inexato, pois a própria lei determina a necessidade de examinar-se os fatos no caso concreto para deles retirar o fumus commisi delicti. Ao contrário do que comumente se admite, o exame da espécie com projeção do apenamento é fundamental, para que se tenha certeza de que o Estado não estará a cometer injustiça através de medida coativa que a prestação jurisdicional não comportará.
Façamos, destarte, o exame da espécie:
Imputou-se ao acusado a prática do delito de homicídio tentado. A admitir que teria havido infração penal (e isto, saliente-se, não é admitido neste petitório) está o próprio requerente, cessando sponte propria o seu agir. O apenamento (se houver, fique bem claro) obviamente, terá que ser fixado levando em conta o disposto no art. 15 do estatuto repressivo nos termos de que “o agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, só responde pelos atos já praticados.” Assim, ao que tudo indica, a condenação somente se poderá dar a título de lesões corporais. Ainda que se o apene na modalidade das lesões gravíssimas a sanção não poderá afastar-se muito do mínimo, em razão dos referenciais do art. 59, que lhe são amplamente favoráveis. Resultado: se condenação houver, não lhe poderá ser imposto regime outro que o aberto, verificando-se mesmo a possibilidade de concessão de sursis.
Argumente-se ainda mais: mesmo que seja acatada in totum a pretensão do Estado formalizada contra o requerente, ainda assim o apenamento não ultrapassará oito anos, o que importará na concessão de regime semi-aberto. Saliente-se que tal espécie de regime não encontra um outro correlato em termos de execução de medida cautelar, razão pela qual a execução desta não pode dar-se sob regime fechado.
Questiona-se, portanto: o que legitimaria a imposição de prisão preventiva a alguém que tudo demonstra não cumprirá, de forma alguma, apenamento sob regime fechado?
É evidente que a análise de dito princípio impõe deva ser revogada a medida de custódia.
DOS PEDIDOS
Assim, em face do exposto, requer-se a V. Exa., a revogação da medida cautelar, com designação de audiência para que possa o acusado ser interrogado, propondo-se o mesmo a assinar o termo de comparecimento a todos os atos do processo, nos moldes do art. 310, caput do Código de Processo Penal.
Termos em que,
Pede Deferimento.
CIDADE, 00, MÊS, ANO
ADVOGADO
OAB Nº