Petição direcionada para advogados.
Possuindo previsão legal nos artigos 593 a 603 do Código de Processo Penal, o recurso de apelação é destinado ao reexame de uma ação que foi julgada em primeiro grau de jurisdição, que pôs fim ao processo com resolução de mérito.
Nas palavras de Aury Lopes Jr,
(…) é um meio de impugnação ordinário por excelência (podendo ser total ou parcial), que autoriza um órgão jurisidicional de grau supervisor a revisar, de forma crítica, o julgamento realizado em primeiro grau. (Direito processual penal – 18. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2021).
Tem por finalidade:
1) O reexame de sentenças definitivas de condenação ou absolvição proferidas pelo juiz de 1º grau (art. 593, inciso I, CPP);
2) Das decisões definitivas, ou com força definitivas, proferidas por juiz singular em casos não previstos no inciso anterior (art. 593, inciso II, CPP), aqui podemos citar como exemplo: decisão que decreta medidas assecuratórias, como sequestro de bens e arrestos;
3) De decisões do rito do Tribunal do Júri previstas nas alíneas do inciso III do artigo 593 do CPP, bem como das suas sentenças de impronúncia ou absolvição sumária (art. 416, CPP).
Para o seu processamento, como regra geral, deve primeiro ser apresentada a peça de interposição, manifestando o desejo de recorrer da sentença, no prazo de 05 (cinco) dias (art. 593, caput, CPP), e depois apresentar as razões recursais no prazo de 08 (oito) dias (art. 600, caput, CPP), mas nada impede que junto com a interposição, também seja apresentada as razões.
É permitido, também, arrazoar o recurso na instância superior, desde que requerido pela parte (art. 600, § 4º, CPP).
Como regra geral, a apelação possui efeito suspensivo (art. 597, CPP) e admite efeito extensivo (art. 580, CPP), mas não admite efeito regressivo.
Poderá ser interposta apelação subsidiária (art. 598, CPP), no prazo de 15 (quinze) dias, seja nos crimes de competência do Tribunal do Júri ou do rito comum, caso o Ministério Público no prazo legal, não venha a interpor o recurso, possuindo legitimidade o ofendido ou por qualquer das pessoas enumeradas no art. 31 do CPP (cônjuge, ascendente, descendente ou irmão), ainda que não se tenha habilitado como assistente de acusação. Neste caso, não possui efeito suspensivo.
No juizado especial criminal, a apelação possui prazo de 10 (dez) dias, devendo ser interposto juntamente com as razões recursais (art. 82, § 1º, 9099/95).
Espero ter ajudado.
Segue modelo abaixo.
AO JUÍZO DE DIREITO DA VARA CRIMINAL DA COMARCA DE _ – ESTADO DO ___
Autos sob o nº: ___________
FULANO DE TAL, devidamente qualificado nos presentes autos, por intermédio de seu defensor dativo, vêm respeitosamente, perante Vossa Excelência, inconformado com a respeitável Sentença de seq. xxxx, que o condenou nas sanções penais descritas no artigo 155, § 1º e 4º, incisos I e IV, do Código Penal, e com fundamento no art. 593, inciso I, do Código de Processo Penal, interpor RECURSO DE APELAÇÃO, requerendo seja ele recebido, com as inclusas razões recursais, e após ouvido o representante do Ministério Público, sejam os presentes autos remetidos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do __, para a devida apreciação.
Nestes termos, pede deferimento.
___, _ de __ de 2021.
OAB/, Nº__.
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO _
RAZÕES DE APELAÇÃO
Apelante: Fulano de tal
Apelado: a Justiça Pública
Autos sob o nº: xxxxxxxxxxxxxxxxxx
Origem: Vara Criminal da Comarca de _
Egrégio Tribunal;
Colenda Turma;
Ínclitos Julgadores:
Merece ser reformada a respeitável Sentença recorrida, em razão da correta apreciação das questões de fato e de direito, conforme restará demonstrado ao final.
- DO RELATÓRIO:
O Ministério Público da Comarca de __, no dia 25 (vinte e cinco) de outubro de 2017, ofereceu denúncia contra os apelante, por, em tese, ter cometido o crime descrito no artigo 155, “caput”, c/c o seu § 4º, incisos I e IV, do Código Penal.
Consta dos presentes autos que, no dia 16 (dezesseis) de outubro de 2017, por volta das 22h00min, o apelante FULANO DE TAL, de comum acordo com CICLANO DE TAL, furtaram diversos itens do estabelecimento comercial “Mercado fuleiro”, localizado na Avenida brasil, nº 01, na cidade de __, arrombando a porta do local.
Por conta da denúncia oferecida, o MM. Juiz desta Comarca recebeu a exordial acusatória no dia 03 (três) de novembro de 2017, determinando a citação deles para apresentar defesa da acusação que lhe foram imputadas.
Ambos foram regularmente citados, e apresentaram Resposta a Acusação.
Em Audiência de Instrução e Julgamento, foram ouvidas 04 (quatro) testemunhas; e depois, realizado o interrogatório dos Réus.
Na fase do artigo 402 do Código de Processo Penal, o Ministério Público requereu a atualização dos antecedentes criminais dos Réus, e por esta defesa, foi requerida a oitiva de BELTRANO DE TAL como testemunha do juízo sendo deferido os pedidos, e consequentemente, a expedição de Carta Precatória para a Cidade de ___, para colher o depoimento da referida testemunha, a qual retornou devidamente cumprida.
O Ministério Público apresentou suas alegações finais, pediu a condenação dos Réus, sob o argumento de que, existente a materialidade e autoria do crime, aliadas a confissão, são provas suficientes para condená-lo.
Posteriormente, a defesa apresentou suas alegações finais, pugnando pelo afastamento da qualificadora do rompimento de obstáculo, ante a ausência de exame pericial, vez que não há nos autos justificativa para a não realização do exame pericial, que só é dispensado quando os vestígios desaparecerem; a desclassificação do crime para a modalidade tentada, vez que os réus não lograram êxito na pratica delituosa, por não haver provas que comprovem que foram os acusados que retiraram as mercadorias de dentro do estabelecimento comercial, ante a aglomeração de “curiosos”; o afastamento da majorante do repouso noturno, vez que não restou provado que os Réus se valeram da escuridão como facilitador do cometimento do crime; pede a aplicação da atenuante da confissão e que o período de prisão cautelar seja considerado para o fim de fixação do regime inicial de cumprimento de pena.
Sobreveio sentença condenatória que julgou totalmente procedentes os pedidos contidos na denúncia, condenando o apelante FULANO DE TAL como incurso nas sanções do artigo 155, § 1º e 4º, inciso I e IV, do Código Penal, fixando a pena em definitivo em 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão, e 65 (sessenta e cinco) dias-multa, a ser cumprida, inicialmente, em regime semiaberto.
Contudo, o Juízo a quo foi omisso quanto ao pedido de detração da pena já cumprida provisoriamente pelo Apelante, sendo necessário apresentar Embargos de Declaração para sanar a presente omissão. Em sentença suplementar, foi acolhido os embargos, reconhecendo a detração da pena já cumprida, contudo, deixando que o cálculo fosse realizado em sede de Execução Penal.
No entanto, a defesa não concorda com alguns argumentos apontados na sentença que justificaram a condenação do Apelante, nos seguintes termos.
É, em síntese, o relatório.
- DO DIREITO:
2.1. Do afastamento da qualificadora de rompimento de obstáculo (art. 155, § 4º, inciso I, CP). Ausência de exame pericial:
Em sua fundamentação, o Juízo a quo manteve a referida qualificadora, afirmando que o exame pericial, no presente caso, era dispensável, pois os vestígios do crime desapareceram, tendo em vista que a vítima declarou que no mesmo dia realizou a limpeza do local que havia sido bagunçado pelos Réus, e que comprou cadeados novos para poder fechar o estabelecimento comercial, de forma que eventual exame pericial em nada contribuiria para o deslinde da causa.
Data venia, a defesa não concorda com tais fundamentações.
Embora alguns vestígios do crime tenham desaparecido, a Vítima afirmou que os Réus tentaram arrombar a porta do escritório de seu estabelecimento comercial, e, até a data em que prestou depoimento em Juízo, não havia consertado.
O exame técnico em crimes não transeuntes (que deixam vestígios) possuem total relevância para o deslinde dos fatos, no sentido de evitar hipóteses argumentativas que desvirtuam a realidade, evitando incertezas que podem modificar o convencimento do julgador, e consequentemente, o resultado judicial.
Preconiza, assim, o Código de Processo Penal:
Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do Acusado.
Dessa maneira, a exigência de exame pericial no crime não transeunte é inerente ao direito de defesa do acusado, em razão de que tende a buscar um maior respaldo na prova técnica, tanto a matéria de defesa, quanto a uma justa condenação.
Diante da demonstração advinda da prova pericial, a apontar com maior precisão a autoria e a materialidade do crime, evita maiores argumentações, bem como afasta a possibilidade de condenações e penas injustas.
No presente caso, a qualificadora de rompimento de obstáculo, prevista no inciso I, do § 4º, do art. 155 do Código Penal, por deixar vestígios, exige, para a sua incidência, a realização de laudo pericial que comprove a materialidade do crime.
Dessa forma quando existir vestígios, somente um laudo pericial pode constatar se houve ou não arrombamento em um local de crime. No fato em questão, não houve essa perícia para constatar o arrombamento da porta principal, e da porta do escritório do estabelecimento comercial, ou seja, não se pode presumir que de fato houve arrombamento no local, se não há essa certeza.
Embora o artigo 167 do Código de Processo Penal permita que o exame de corpo de delito seja suprido por outros meios de prova, a sua substituição apenas pode ocorrer se o delito não deixar vestígios, se estes tiverem desaparecido ou, ainda, se as circunstâncias do crime não permitirem a confecção do laudo, senão vejamos recente decisão do Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ):
HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. FURTO QUALIFICADO. EXAME PERICIAL NÃO REALIZADO. INEXISTÊNCIA DE JUSTIFICATIVAS PARA A NÃO REALIZAÇÃO DA PERÍCIA.CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA.DESCLASSIFICAÇÃO PARA FURTO SIMPLES. REDIMENSIONAMENTO DA PENA. REGIME FECHADO. PACIENTE REINCIDENTE E CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS FAVORÁVEIS. POSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DO REGIME INTERMEDIÁRIO. SÚMULA N. 269/STJ. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.1. O Superior Tribunal de Justiça, seguindo entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, passou a não admitir o conhecimento de habeas corpus substitutivo de recurso previsto para a espécie. No entanto, deve-se analisar o pedido formulado na inicial, tendo em vista a possibilidade de se conceder a ordem de ofício, em razão da existência de eventual coação ilegal. 2. A jurisprudência desta Corte entende que, para reconhecimento das qualificadoras do rompimento do obstáculo, é imprescindível a realização de exame pericial, sendo possível a sua substituição por outros meios probatórios somente se não existirem ou tenham desaparecido, ou se as circunstâncias do crime não permitirem a confecção do laudo.3. No caso em análise, o Tribunal local, ao apreciar a questão, não apresentou justificativas para a não realização da perícia. Assim, de rigor o afastamento da qualificadora.4. Ainda que presente a agravante da reincidência, o paciente teve a pena-base fixada no mínimo legal e foi condenado a pena privativa de liberdade inferior a 4 anos de reclusão. Dessa forma, é cabível o regime semiaberto. Súmula n. 269/STJ. 5. Habeas corpus não conhecido. Concedida a ordem, de ofício, apenas para afastar a qualificadora, redimensionar a pena do paciente e fixar o regime semiaberto.(HC 420.597/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 21/11/2017, DJe 28/11/2017- grifo nosso).
Não existe nos autos quaisquer justificativas plausíveis acerca da não realização do exame pericial, pelo contrário, deveria ter sido realizado o exame, tendo em vista que o Juízo a quo utilizou como justificativa essa suposta destruição da uma porta do escritório do mercado para exasperar a pena do Apelante nas circunstâncias judiciais.
Ocorre que esta afirmação se encontra isolada das demais provas coligidas nos autos, posto que nenhuma das testemunhas afirmou ter visto essa porta do escritório destruída, e nem os Réus confessaram, o que somente seria comprovado pela prova pericial, o que não ocorreu.
Assim, fica evidente que a referida qualificadora não merece prosperar, pois o crime de furto em caso de rompimento de obstáculo deixou vestígios, e neste caso não houve perícia para comprovar o rompimento da porta do estabelecimento comercial, sendo inviável a aplicação da qualificadora supracitada.
2.2. Da desclassificação do crime de furto para sua forma tentada (art. 14, inciso II, do Código Penal):
O Juízo a quo rejeitou o pedido de desclassificação do crime de furto para a sua modalidade tentada, sob o fundamento de que, mesmo que por breve espaço de tempo, houve a inversão da posse dos objetos, por conta de que os Réus tiveram tempo hábil para consumir alguns produtos, bem como para separar e acondicionar os produtos que pretendiam levar, consumando o crime, no que discorda a defesa.
Embora o entendimento que predomina nos Tribunais superiores, de que não é exigível a posse tranquila da res nos crimes de furto e roubo (teoria da amotio ou apprehensio), deveras ressaltar que os Réus sequer estiveram na posse precária dos bens.
Testemunha crucial dos fatos, a testemunha do juízo foi o primeiro a chegar no local, o que é comprovado pelo Boletim de Ocorrência, bem como pelos depoimentos dos policiais militares e dos próprios Réus.
Em suas declarações, narrou que, ao chegar no local, deixou o seu veículo em frente a porta do mercado com as luzes acesas, e viu que os cadeados estavam cortados.
Que, passados menos de cinco minutos, e antes da chegada da Polícia Militar, FULANO DE TAL abriu a porta do estabelecimento e já saiu rendido, momento em que avistou que havia vários mantimentos embalados, mas estes ainda estavam dentro do mercado. Que, com a chegada dos policiais, FULANO foi detido e seu comparsa foi encontrado dentro do estabelecimento.
Importante ressaltar que os fatos narrados pela testemunha estão em harmonia com a versão apresentada pelos Réus.
Ambos os réus afirmaram que tinham a intenção de furtar carnes e bebidas do mercado, porém, quando estavam no interior do local consumindo bebida alcoólica, avistaram o farol de um veículo, e logo em seguida, ouviram o bombeiro militar ordenando a saída deles de lá, isso tudo em menos de cinco minutos desde a entrada deles no estabelecimento. Por conta disso, não conseguiram subtrair nenhum mantimento.
Para reforçar a tese, a vítima afirmou que, além do prejuízo que arcou com os mantimentos danificadas, não sentiu a falta de nenhuma outra mercadoria, até porque, os Réus saíram de lá presos em flagrante, o que impediu o sucesso criminoso.
Em que pese o depoimento dos policiais militares, que afirmaram terem visto mercadorias na parte externa do estabelecimento, é forçoso lembrar que se formou aglomeração de populares em frente ao estabelecimento, e que após acionada, a equipe policial levou cerca de dez a quinze minutos até chegar no local, período de tempo suficiente para que “curiosos” alterassem o lugar onde as mercadorias estavam acondicionadas.
No mais, até a própria Vítima, que chegou após os policiais militares, afirmou não saber se as mercadorias foram retiradas pelos Acusados ou por outra pessoa, por conta da aglomeração de populares no local.
Dispõe o art. 14, inciso II, do Código Penal:
Art. 14. Diz-se o crime:
(…)
II – tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. (grifo nosso)
No presente caso, não houve inversão da posse, pois nenhum dos Réus conseguiu sair do estabelecimento comercial com qualquer produto, pois a ação delituosa foi frustrada pela chegada do bombeiro militar, circunstância alheia à vontade deles, que os flagrou no momento em que estavam alocando os mantimentos para serem levados dali. Dessa forma, a conduta deles somente chegou a fase de execução do iter criminis.
Nada foi retirado do estabelecimento comercial pelos Réus, e embora a Vítima amargure o prejuízo pelos mantimentos que estragaram, isto pode ser reparado na esfera cível em uma eventual ação de indenização por danos materiais, em respeito ao Princípio da Fragmentariedade.
Tecidas tais considerações, pugna pela desclassificação do crime de furto qualificado (artigo 155, “caput”, c/c o seu § 4º, incisos I e IV, do Código Penal) para sua forma tentada, requerendo a diminuição da pena de um a dois terços, nos termos do artigo 14, inciso II, c/c o seu parágrafo único, do Código Penal.
2.3. DA DOSIMETRIA DE PENA:
O Apelante postula para que seja reduzida a pena-base, eis que lhe são favoráveis às circunstâncias judiciais (art. 59, CP) que foram exasperadas pelo Juízo a quo, sendo, manifestamente incabível e inadmissível a permanência do quantum de pena fixado, que agravou de forma imoderada a pena-base.
Foi considerado desfavorável a culpabilidade do Apelante, sob o fundamento de que sua conduta se reveste de alto grau de reprovabilidade, tendo em vista que ele sabia da ilicitude de suas ações e lhe era esperado conduta diversa.
A culpabilidade pode ser entendida como sendo o grau de menosprezo do agente perante o bem jurídico lesado ou a reprovação social que o crime e o autor do fato merecem, de acordo com o caso concreto.
Todavia, embora possuísse plena consciência da ilicitude do fato, tal fator não pode ser considerado a ponto de macular tal circunstância. A simples afirmação de que a culpabilidade é desfavorável ao Réu, por ter consciência da ilicitude não justifica, por si só, a valoração negativa dessa circunstância, motivo pelo qual não pode ser sopesada, pois não aponta maior reprovabilidade da conduta, já que é inerente ao cometimento de qualquer tipo penal. Neste sentido, entende o Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ):
HABEAS CORPUS SUBSTITUTO DE RECURSO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. CULPABILIDADE, MOTIVOS E CONSEQUÊNCIAS. ARGUMENTOS INERENTES AO TIPO. REDUTORA DA PENA. ART. 33, § 4º DA LEI 11.343/06. FIXAÇÃO EM PATAMAR DIVERSO DO MÁXIMO. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO IDÔNEA. ILEGALIDADE. APLICAÇÃO DE 2/3. REDIMENSIONAMENTO DA PENA PARA PATAMAR INFERIOR A 4 ANOS. PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL. PRIMÁRIO. POSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO DO REGIME ABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. CABIMENTO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.1. O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade. 2. A jurisprudência pátria, em obediência aos ditames do art. 59 do Código Penal e do art. 93, IX, da Constituição Federal, é firme no sentido de que a fixação da pena-base deve ser fundamentada de forma concreta, idônea e individualizada, não sendo suficiente referências a conceitos vagos e genéricos, máxime quando ínsitos ao próprio tipo penal.3. A culpabilidade foi considerada elevada pelo fato de o acusado ter consciência da ilicitude de sua conduta. Ocorre que “a consciência da ilicitude do fato não justifica a exasperação da pena-base, porque é elemento que diz respeito à culpabilidade em sentido estrito, assim definida como elemento integrante da estrutura do crime em sua concepção tripartida, e não à culpabilidade em sentido lato, a qual se refere a maior ou menor reprovabilidade do agente pela conduta delituosa praticada” (HC 287.449/MG, Ministro ROGÉRIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, julgado em 5/3/2015, DJe 12/3/2015). 4. Quanto aos motivos e às consequências, estes foram valorados em elementos inerentes ao tipo penal – lucro fácil e efeitos produzidos pela ação criminosa, o maior ou menor vulto do dano ou perigo de dano e o sentimento de insegurança trazido pela ação criminosa – configurando, assim, fundamentação genérica e inidônea para exasperação da pena-base, de acordo com a jurisprudência desta Corte Superior.5. Em relação à redutora do art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, o Juiz de primeiro grau não motivou a escolha da fração e o Tribunal de origem, ao mantê-la, não apresentou argumentação válida. Nesse contexto, mostra-se ilegal a aplicação da redutora em patamar diverso do máximo previsto no art. 33, § 4º da Lei n. 11.343/2006, porquanto ausente motivação concreta que o justifique. Precedentes. 6. Tendo em vista o redimensionamento da pena, necessário fixar o regime mais adequado. No caso, tendo a pena ficado em patamar inferior a 4 anos, paciente primário, com circunstâncias judiciais favoráveis, mostra-se adequado o regime aberto, nos termos do art. 33, §§ 2º e 3º, do Código Penal, bem como a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos. 7. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para redimensionar a pena do paciente e fixar o regime aberto, substituída a pena corporal por duas medidas restritivas de direitos, a serem estabelecidas pelo Juízo das Execuções Penais.(HC 382.187/ES, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 21/03/2017, DJe 28/03/2017 – Grifo nosso)
Nestes termos, deve ser reconhecida a culpabilidade como circunstância judicial favorável.
No mais, considerou que as circunstâncias são desfavoráveis ao Apelante, porque ele cometeu o crime em concurso de pessoas, arrombou a porta do estabelecimento para nele adentrar, tentou arrombar a porta do escritório (fato que não ficou comprovado nos autos), bagunçou o local, além de causar o prejuízo à vítima pela perda de parte dos objetos do furto, vez que se tratavam de mantimentos perecíveis, incorrendo em flagrante bis in idem, haja vista que todos estes fatores já são elementares do crime de furto qualificado imputado a ele, não podendo servir para exasperar a pena base.
2.4. DA DETRAÇÃO PENAL:
Em sede de Embargos de Declaração, o Juízo a quo reconheceu a detração da pena já cumprida, contudo, deixou que o cálculo fosse realizado em sede de Execução Penal, o que causa maior transtorno ao Apelante.
A detração penal, nos termos do § 2º do artigo 387 do Código de Processo Penal (incluído pela Lei nº 12.736/2012), deve ser realizada pelo Juiz no momento em que é prolatada a sentença condenatória, permitindo a fixação de regime inicial de cumprimento de pena menos gravoso, com a detração do tempo de prisão provisória na sentença, senão vejamos:
Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória:
(…)
§ 2o O tempo de prisão provisória, de prisão administrativa ou de internação, no Brasil ou no estrangeiro, será computado para fins de determinação do regime inicial de pena privativa de liberdade.
Dando ao juiz de conhecimento competência para realizar a detração, antes conferida apenas ao juiz da execução, a fim de que sejam evitadas situações em que o acusado tenha que aguardar a decisão do Juiz da Execução Penal, permanecendo nessa espera em regime mais gravoso.
O Apelante foi preso em flagrante na data de 16/10/2017, e esta prisão acabou sendo convertida em prisão preventiva durante Audiência de Custódia, ficando preso até 27/11/2018, data em que fugiu do SECAT desta Cidade. Dessa forma, o Acusado ficou preso provisoriamente por 01 (um) ano, 01 (um) mês, e 11 (onze) dias.
Considerando que o Apelante foi condenado a pena de 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão, em regime semiaberto, sendo efetuada a detração, a pena do Apelante cairia para 03 (três) anos, 06 (seis) meses e 19 (dezenove) dias, o que, com arrimo no artigo 33, § 2º, alínea c, do Código Penal, o regime inicial de cumprimento de pena seria o regime aberto.
Importante asseverar que a detração penal somente é mais benéfica ao réu quando conduz à fixação de um regime inicial mais benéfico ao Apenado do que se fosse considerada tão somente a reprimenda total, como é o presente caso. Neste sentido, segue decisão do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJ-PR):
APELAÇÃO CRIME. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. CONDENAÇÃO PELO TRIBUNAL DO JÚRI. ALEGAÇÃO DE DECISÃO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. TESE DE LEGÍTIMA DEFESA. NÃO ACOLHIMENTO PELOS JURADOS. DECISÃO DO CONSELHO DE SENTENÇA AMPARADA NAS PROVAS DOS AUTOS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SOBERANIA DOS VEREDICTOS. DOSIMETRIA. PENA INTERMEDIÁRIA. UTILIZAÇÃO DE UMA DAS CIRCUNSTÂNCIAS QUALIFICADORAS COMO CIRCUNSTÂNCIA AGRAVANTE. POSSIBILIDADE. FRAÇÃO DE AUMENTO CORRETAMENTE FIXADA EM UM SEXTO. DETRAÇÃO PENAL SOMENTE PODE SER REALIZADA NA SENTENÇA QUANDO POSSIBILITAR A FIXAÇÃO DE REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA MENOS GRAVOSO DO QUE O CORRESPONDENTE À PENA TOTAL. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS EM FAVOR DO DEFESOR DATIVO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.(TJPR – 1ª C.Criminal – 0002827-85.2015.8.16.0147 – Rio Branco do Sul – Rel.: Naor R. de Macedo Neto – J. 30.11.2018)
Diante do exposto, requer-se seja realizada a detração penal da pena cumprida provisoriamente pelo Apelante, desde a data sua prisão em flagrante, até a data de prolação de sentença, nos termos do § 2º do artigo 387 do Código de Processo Penal.
- DOS PEDIDOS:
Diante de todo o exposto, pede-se, encarecidamente, à Vossas Excelências, que seja o presente recurso CONHECIDO, e no mérito PROVIDO, reformando a R. Sentença proferida pelo Juízo a quo, para o fim de:
a) Pelo afastamento da qualificadora prevista no artigo 155, § 4º, inciso I, do Código Penal, referente ao rompimento de obstáculo, diante da ausência de laudo pericial que comprove as circunstâncias;
b) Pela desclassificação do crime de furto qualificado (artigo 155, “caput”, c/c o seu § 4º, incisos I e IV, do Código Penal) para sua forma tentada, requerendo a diminuição da pena de um a dois terços, nos termos do artigo 14, inciso II, c/c o seu parágrafo único, do Código Penal;
c) Que sejam consideradas favoráveis as circunstâncias judiciais no que se refere a culpabilidade e as circunstâncias, reduzindo, assim, a pena-base;
d) Que seja realizada a detração penal da pena cumprida provisoriamente pelo Apelante, desde a data sua prisão em flagrante, até a data de prolação de sentença, nos termos do § 2º do artigo 387 do Código de Processo Penal, para fins de fixação de regime inicial de cumprimento de pena;
Termos em que,
Pede e espera deferimento.
Como forma de Direito e de Justiça!!!
____, _ de ___ de 2021.
OAB/, Nº ___