AO DOUTO JUÍZO DE DIREITO DA 00ª VARA CRIMINAL DA COMARCA CIDADE/UF
PROCESSO Nº 0000000
NOME DO CLIENTE, já qualificado nos autos em epígrafe, que lhe move a Justiça Pública, por seu advogado que a esta subscreve (DOC. 00), vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, dentro do prazo legal, oferecer:
RESPOSTA À ACUSAÇÃO
com fulcro nos artigos 396 e 396-A do Código de Processo Penal, consoante às razões de fato e de direito à seguir aduzidas.
DOS FATOS
FULANO DE TAL foi formalmente acusado pela prática do crime de registro de nascimento inexiste, previsto no artigo 241 do Código Penal.
A acusação decorreu do fato de ter noticiado o nascimento de “seu filho”, no 00º Cartório de Registro Civil da CIDADE/UF. Porém, o acusado nunca foi pai e não se tem informações de alguma gestante esperando um filho seu.
Ademais, por ser muito popular na região de CIDADE/UF, o tabelião, de forma irresponsável, formalizou o registro da criança como se filho de FULANO DE TAL fosse, sem exigir nenhuma documentação. Apenas pediu a BELTRANO que posteriormente entregasse a papelada do nascimento no cartório.
Vale destacar, que mais tarde o tabelião tomou conhecimento da mentira do acusado ao encontrar um médico da cidade durante um café. Deste modo acabou por comunicar ao delegado a notícia falsa do nascimento.
Ato contínuo, o acusado uma semana depois foi preso e torturado até o momento da sua confissão, em que alegou ter praticado o crime para saciar a sua vontade de ser pai, algo impossível para ele, diante da recusa de todas as suas namoradas.
Igualmente, o acusado foi incentivado a fazer o registro por oito pessoas que estavam no hospital diante de um recém-nascido muito parecido com ele.
O inquérito foi concluído e o promotor de justiça da Comarca ofereceu a denúncia de fls. 00 e 00. A denúncia foi recebida pelo juiz, que determinou a citação do réu, nos termos do art. 396 do Código de Processo Penal.
DIREITO
DAS PRELIMINARES
Preliminarmente, necessário se faz apontar nulidade existente na exordial acusatória, vez que, flagrantemente desrespeita o disposto no artigo 157, do Código de Processo Penal, pois foi utilizado de meio ilícito, qual seja, a tortura, para se obter a “confissão” de prática de crime supostamente cometido.
Resta claro, que ao utilizarem a tortura como meio de obtenção de prova fere o previsto no artigo 5º, III da Constituição Federal, in verbis:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
Evidencia-se que diante do artigo supramencionado, que atos degradantes, desumanos, ferem direitos inerentes à pessoa humana. Estes protegidos pela nossa leia maior, qual seja, a Constituição Federal e pelo artigo 5º, II do Pacto de San José da Costa Rica (Convenção Interamericana de Direitos Humanos).
Por esse ângulo, que foi utilizado de um meio ilícito para obter uma declaração de pratica delituosa, sendo estas inadmissíveis no processo, conforme o previsto no artigo 5º, LVI, da Constituição Federal.
Dessa forma, outra sorte não resta senão declarar a nulidade de todos os procedimentos realizados até a presente fase processual, em razão de que as provas obtidas devam ser desentranhadas do processo, haja vista que violou normas constitucionais, internacionais e legais.
DO MÉRITO
Observamos que na denúncia, o acusado agiu mediante o incentivo de oito pessoas, que exacerbaram o seu desejo de ser pai, lhe provocando a realizar o registro de uma criança.
Salienta-se que houve um dano causado à parte íntima do indivíduo, à esfera que afeta a sua ânsia interior em ser pai. Neste diapasão, imperioso destacar que o autor estava em um momento fora do seu estado de consciência, sem saber divergir sobre as atitudes corretas e erradas.
Por certo, o acusado foi movido por um desejo peculiar de ter alguém registrado como seu filho, de ter uma denominação e a honra de ter um filho. A racionalidade aqui não estava presente, de modo que o acusado foi envolvido por suas emoções e estava sob a influência das pessoas que o influenciaram a registrar a criança.
Ora, diante do relatado o acusado simplesmente se dirigiu ao Cartório para registro, de modo que não se preocupou com os documentos, haja vista que não tinha esta intenção.
Ademais, vale destacar que o crime previsto no artigo 241 do Código de Processo Penal tem como núcleo do tipo o verbo “promover”, que se trata do fato de provocar o registro de nascimento inexistente.
Significa assim, que o próprio acusado teria que promover o registro da criança, o que de fato não ocorreu, dado que o acusado apenas requereu o registro e não o fez, resta claro, portanto, que a conduta destoa do possível crime intitulado.
Outrossim, ainda em análise ao artigo 241 do Código Penal, verifica-se que o tipo penal deixa expresso que o registro dever ser de nascimento inexiste¸ ou seja, criança inexistente. O que a rigor não aconteceu no caso em apreço, tendo em vista que existiu um nascimento e, com ele, uma criança.
Por conseguinte, percebe-se a ausência de tipicidade formal, esta gerada em razão da ausência de crime. Uma vez que, é cediço na Doutrina Brasileira que para a configuração do crime no sistema tripartite, faz-se necessário a presença de três requisitos, sendo eles: fato típico, ilícito e culpável.
Em continuação, observa-se que o fato típico tem como substratos a conduta, o resultado, o nexo causal e a tipicidade. De modo que, comprovada a falta de subsunção do fato a norma afasta-se o crime, visto que não estão presentes todos os elementos necessários que caracterizam o crime em seu conceito analítico.
Nesse sentido, corrobora o jurista Luiz Flávio Gomes:
“O fato típico objetivo, assim, é composto da tipicidade formal + tipicidade material ou normativa. A ausência de qualquer um desses requisitos implica naturalmente na atipicidade do fato, que pode ser formal ou material (tudo conforme a natureza do requisito faltante)”.
Data máxima vênia, em que momento o nascimento foi inexistente? A criança de fato nasceu, de forma que não houve na conduta do acusado a intenção de dolo, ouve simplesmente um estado emocional exacerbado que excedia a sua consciência estrita.
Deste modo Excelência, o ato praticado pelo acusado é nulo de pleno direito, já que no momento em que se dirigiu ao cartório para registrar a criança, sob influência de oitos pessoas e a sua forte emoção e vontade de ser pai, deixou de observar os requisitos necessários, exigidos para que pudesse realmente dar efetividade ao registro.
Portanto, a partir do momento em que o cartorário falhou na sua função de requerer os documentos necessários para efetivar o registro da criança, baseando-se apenas no fato de conhecer o suposto pai, ora acusado, acaba por transferir para si a culpa.
Resta claro então, que o acusado ao não apresentar os documentos para registro, como o laudo médico, não perfez os requisitos necessários para tal. Assim, utilizou-se de meio totalmente inócuo, afinal o registro efetuado pelo acusado não é apto a produzir qualquer efeito na órbita jurídica.
Ocorre assim, que é fato atípico, devido à ausência da tipicidade formal. Assim como, é considerado crime impossível por utilizar-se de um meio inócuo para atingir o resultado. Sem levar em consideração a emoção exacerbada e a influência presente na conduta do acusado.
DOS PEDIDOS
Ante o exposto, pleiteia-se a absolvição sumária do réu, pelo fato narrado não ser crime, vez que a conduta do Acusado não se amoldou como típica, nos termos do art. 397, III, do Código de Processo Penal.
Apenas por cautela, no caso de não ser acolhida a tese de absolvição sumária, o que não se espera, requer seja decretada a anulação do recebimento da peça acusatória tenda em vista que foi utilizado de meio ilícito, qual seja a tortura. Assim, pede-se que reconheça a nulidade de todos os procedimentos até a presente fase processual.
Enfim, em não sendo acolhidos os pedidos acima elaborados, requer sejam intimadas as testemunhas ao final arroladas, para que sejam estas ouvidas na audiência de instrução e julgamento.
ROL DE TESTEMUNHAS
(…)
Termos em que,
Pede Deferimento.
CIDADE, 00, MÊS, ANO