Estupro de vulnerável – Defesa – Apelação
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DA INFÂNCIA E JUVENTUDE DA COMARCA DE XXXXXXXXXXX
Processo nº XXXXXXXXXXXX
Autora: Justiça Pública
Acusado: XXXXXXXXX
XXXXXXXXXXXXXXXXXXX, já qualificado nos autos do presente processo, através de seu advogado legalmente constituído, com fundamento no Art. 593, I do Código de Processo Penal, inconformado com a sentença de folhas XXXX, apresentar sua RAZÕS DE APELAÇÃO, requerendo desde já sejam as mesmas recebidas e juntadas em seus regulares efeitos legais, e após juízo de retratação sejam remetidas a instancia superior.
Nestes Termos, Aguarda Deferimento.
Cidade, UF, data
OAB…..
RAZÕES DE APELAÇÃO
Apelante: xxxxxxxxxx
Apelado: Ministério Público do Estado de São Paulo.
Origem: processo nº xxxxxxxxxxxxx
Vara da Infância e Juventude da Comarca de XXXXXXXXXX.
EGRÉGIO TRIBUNAL,
COLENDA CÂMARA,
NOBRES DESEMBARGADORES.
O apelante foi condenado por estupro de vulnerável porque no dia 30 de Dezembro de 2013 teria tentado praticar ato libidinoso com menina menor de 13 anos.
A denúncia, sem atentar-se para a atual redação do artigo 217-A do Código Penal, descreveu “violência presumida”e “grave ameaça”que estão completamente fora de cogitação.
Ao final, a pretensão acusatória foi julgada procedente. Reconhecida a tentativa em grau máximo, a pena não foi reduzida, sendo o mesmo condenado a uma pena de 17 anos e 06 meses de reclusão em regime inicialmente fechado.
Não tendo havido violência, a rigor da redação do tipo penal, e não havendo mais a figura da violência presumida, eis que revogado o antigo artigo 224 do CP pela Lei 12015/09, mesmo assim o juízo “a quo”, condenou impiedosamente o apelante, apesar do mesmo ser primário, ter bons antecedentes e residência fixa, além de ser trabalhador.
Em que pese o apelante ter mantido relação sexual com a menor, diga-se de passagem que esta praticou tal ato por livre e espontânea vontade, tanto é que na sua oitiva junto ao Judiciário, ela mesma (vítima) chegou a afirmar tal situação, e que estava gostando do apelante, e devido a pressão familiar foi obrigada pela sua genitora a comunicar o fato a Autoridade Policial.
Em face da estrutura típica do art. 217-A, a Defesa entende injusta a condenação, por entender que os fatos narrados pela denúncia e apurados em sede de regular instrução são materialmente atípicos.
Em que pese o entendimento do nobre julgador, a r. sentença prolatada às fls. XXX deverá ser reformada.
A prova colhida não permite afirmar que os atos libidinosos tentados, se é que existiram, seriam capazes de atingir a dignidade sexual da vítima.
Antes de enfrentar a questão da atipicidade material, compete à Defesa questionar se os atos libidinosos realmente aconteceram.
Afinal, as testemunhas arroladas pelo Ministério Público ouvidas em juízo, nada trouxeram de riqueza para o presente processo, no sentido de corroborar com a denúncia apresentada pelo órgão acusador.
O apelante em sede policial afirmou que não praticou com a mesma qualquer violência sexual, pois teve a concordância da menor, e que naquela oportunidade já estava convivendo como marido da suposta vítima.
DA ABSOLVIÇÃO POR FALTA DE PROVAS
Com pequenas divergências entre os depoimentos fica claro que a vítima aguardava já habituada com a relação que vinha mantendo com o apelante, aguardava sua chegada sempre, com espontaneidade, e mantiveram um relacionamento, tal qual, que pensavam até homologar tal situação, momento em que o apelante já estava separado da genitora da vítima,e esta por não aceitar tal relação com a sua filha, a obrigou a dar queixa contra o apelante junto a Autoridade Policial, portanto Eméritos Julgadores, não se pode em hipótese nenhuma falar em prática de violência cometida pelo apelante.
De plano, fica claro que a vítima mantinha relação sexual com o apelante por livre e espontânea vontade. Não houve coação ou violência.
Por sua vez, os depoimentos da vítima são confusos e não permitem por isso mesmo afirmar se, de fato, o apelante tentou praticar algum ato libidinoso contra a vontade da mesma.
De dois modos muito diferentes a vítima verbalizou o ocorrido ao delegado, ao juiz e ao policial no momento do ocorrido:
1 -Na fase policial e em juízo, com algumas diferenças, a garota afirmou que do evento não ocorreu qualquer tipo de violência sexual, uma vez que a mesma praticara os atos por livre e espontânea vontade, e que devido a sua genitora a obrigar a prestar queixa, é que tudo isso aconteceu.
2 –A palavra da policia e das testemunhas são muito importante neste caso.Afinal, nada conseguiram provar quanto a alegação de violência sexual praticada pelo apelante, cujas partes poderiam prestar testemunho mais fiel dos acontecimentos.
Por óbvio que durante toda a instrução penal os depoimentos prestados pela vítima foram contraditórios. Não há evidência da tentativa da prática de atos libidinosos de maneira dolosa.
Quanto ao laudo psicossocial constante nos autos, impõe afirmar com veemência que ele foi contrariado pelas palavras da vítima e a de sua mãe.
Percebe-se em todos os depoimentos, independente de acusação ou defesa, que o apelante é pessoa de bem, respeitado por todas as pessoas com que convive.
A própria vítima é clara e objetiva ao dizer: “O réu para mim sempre foi muito bom, tanto que eu não quis levar a conduta a sério na primeira vez”.
Evidente que os depoimentos não foram capazes de extrair do agente a confissão que sustentaria a pretensão ministral.
Portanto, as provas existentes nos autos sobre a autoria do crime consistem nos depoimentos contraditórios da vítima, pois não havia no local dos fatos nenhuma testemunha.
Aliás, as testemunhas ouvidas em juízo não presenciaram o suposto crime, cujo conteúdo se resume aos relatos contraditórios da própria vítima.
De fato, não existem nos autos provas seguras da ocorrência de estupro de vulnerável.
Em que pese o valor da palavra da vítima nesses tipos de crimes, esta não pode ser exclusiva para sustentar o decreto condenatório, principalmente quando é isolada diante da ausência de outros elementos probatórios.
É preciso, pois, que haja prova suficiente da materialidade delitiva e da autoria para que seja proferido o decreto condenatório.No caso em questão, as provas colhidas não estão aptas a estabelecer nenhuma convicção a respeito da autoria do apelante frente ao crime previsto no artigo 217-A do Código Penal Brasileiro.
Na dúvida, deve ser aplicado o princípio constitucional in dúbio pro reo, impondo-se a absolvição do acusado.
Nesse sentido os seguintes julgados:
“A existência de simples indícios não servem como prova substitutiva e suficiente de autoria, e, assim, para embasar decreto condenatório. 2. Correta a sentença que julgou improcedente a ação penal e absolveu o réu por insuficiência de provas” (TRF 3ª R. –ACr 93.03.92175 –SP –2ª T. –Rel. Juiz Arice Amaral –DJU 27.03.1996).
“Apelação crime -Estupro-Ausentes os requisitos tipificadores do ilícito penal -Prova insuficiente para sustentar um decreto condenatório-Duvidosa a declaração da vítima ante a segurança demonstrada -Informação isolada da ofendida -Nenhuma prova existe em todo o curso do procedimento, apontando o réu como autor do crime denunciado -A absolvição do réu se impõe pela insuficiência de prova -Apelo do órgão ministerial prejudicado -provido o apelo do acusado.”
A jurisprudência também já entendeu que em caso falta de provas, principalmente em crimesde estupro, deve-se prevalecer a absolvição do acusado.O Professor René Ariel Dotti já dizia:
“A dúvida jamais pode autorizar uma sentença condenatória”.Sendo assim, a absolvição com fulcro no art. 386 VII do Código de Processo Penal é de rigor, principalmente por não ter restada comprovada à autoria do delito imposto ao apelante.DA ATIPICIDADECaso se entenda que o réu tentou mesmo praticar atos libidinosos com a garota, a Defesa passa a demonstrar a inocorrência de crime.A lei 12.015/09 acrescentou ao Código Penal o artigo 217-A, contendo o tipo penal de estupro de vulnerável. Vejamos:“Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos”.A expressão “ou praticar outro ato libidinoso”está atrelada à elementar “conjunção carnal”, revelando que o conteúdo da expressão “outro ato libidinoso” só pode ser encontrado pela análise do que seja “conjunção carnal”.
Logo, o ato libidinoso deve ter a mesma gravidade que a conjunção carnal, sob penade não preenchimento da elementar e consequente atipicidade da conduta.Percebe-se que a estrutura típica, que reúne num mesmo tipo a “conjunção carnal” e “outro ato libidinoso” exige uma única interpretação. Não são dois tipos penais em redações autônomas, mas duas condutas inseridas no mesmo contexto normativo a indicar e exigir o mesmo grau de violação ao bem jurídico.Ora, por óbvio que uma apalpadela ou uma “uma passada de mãos” não ofenderá a dignidade sexual com a mesma gravidade do coito vagínico.
Haveria, inclusive, ofensa ao princípio da proporcionalidade. Afinal, alguém que passasse as mãos na perna de uma criança seria apenado com a mesma pena destinada a quem praticou cópula vagínica ou anal.
Logo, para condenar alguém pela prática de estupro de vulnerável em decorrência de ato libidinoso, será preciso concluir que o ato se reveste da mesma gravidade da conjunção carnal.
A mesma consequência se extrai da junção do estupro e do atentado violento ao pudor empreendida pela reforma da Lei 12015/2009.
O atentado violento ao pudor continuou criminalizado no interior do atual art. 213 do CP (princípio da continuidade típico normativa), mas a atual estrutura típica impôs nova interpretação.
Isso demonstra que a atividade do legislador deve ser prudente e que reformas no sistema penal podem gerar mudanças interpretativas profundas.
Como afirmamos, a partir da reforma o estupro e o atentado violento ao pudor praticados em um mesmo contexto passaram a constituir crime único, ao contrário do que a antiga estrutura binária dos crimes permitia. A atual redação do artigo 217-A não permite outra interpretação.
Ou o ato libidinoso é grave como a conjunção carnal (v.g., sexo oral, anal) ou o fato é atípico.
Trata-se de imposição do princípio da legalidade estrita. Nesse sentido, a lição da doutrina de Gustavo Junqueira:O ataque de inopino no qual se pratica ato libidinoso permite configurar a nova redação do crime de estupro? Na antiga redação prevalecia na jurisprudência que sim, mas a matéria vinha sendo melhor analisada no sentido de que apenas deve configurar o crime a conduta que viola de forma grave a liberdade sexual.
O tapa nas nádegas por parte de rapaz que passa correndo ou o beijo roubado daquele que aproveita descuido ao cumprimentar moça não pode ser considerado crime hediondo.
Se a ofensa à liberdade sexual é mínima, a atitude deve ser compreendida, no máximo, como importunação ofensiva ao pudor, desde que presentes as elementares da contravenção penal, como já ensinava Bittencourt. Se não configura a contravenção, é fato materialmente atípico.
Como argumento de reforço à interpretação restritiva da expressão “ato libidinoso” para fins de configuração do estupro, acrescentamos outro argumento: partindo da premissa que a lei não usa palavras inúteis, é necessário esforço interpretativo para entender por que a lei utiliza a expressão “conjunção carnal” “ou outro ato libidinoso”, já que a conjunção é, em si, ato libidinoso, e a redundância seria desnecessária.
A melhor justificativa é que se trata de interpretação analógica, ou seja, após a enumeração casuística “conjunção carnal” segue-se cláusula genérica “ato libidinoso”, cuja interpretação deve ser restritivamente, para abranger apenas atos com intensidade semelhante à conjunção carnal, quedando afastadas importunações menores. (Direito Penal. 10ª edição. São Paulo, RT, 2010. p. 308-309) Observa-se que o artigo 217-A do Código Penal não foi violado no caso em tela.
Principalmente porque a dignidade sexual da menina não fora violada.
Ademais, o apelante não praticou qualquer violência sexual contra a menor ou outro crime de igual gravidade com a menor.De fato, não houve ofensa ao bem jurídico protegido.
Os depoimentos colhidos durante toda fase policial e judicial são claros nesse sentido:Contudo, convém salientar que o novo tipo penal após descrever a conjunção carnal com núcleo-típico emprega claramente a expressão “ou praticar outro ato libidinoso”.
O modo de construção do tipo em análise revela que o legislador empregou a técnica da interpretação analógica, o que faz exigir que o ato libidinoso tenha a mesma potencialidade lesiva do coito vaginal.
Nesse sentido a doutrina de Gustavo Junqueira. “A melhor justificativa é que se trata de interpretação analógica, ou seja, após a enumeração casuística “conjunção carnal” segue-se cláusula genérica “ato libidinoso”, cuja interpretação deve ser restritivamente, para abranger apenas atos com intensidade semelhante à conjunção carnal, quedando afastadas importunações menores.”
Mas a matéria vem a ser melhor analisada na nova redação, no sentido de que apenas deve configurar o crime a conduta que viola de forma grave a liberdade sexual, o que não ocorreu no caso em tela.
Não obstante, o ato libidinoso deve possuir gravidade similar a conjunção carnal (via vaginal ou anal), como por exemplo, a felação ou a penetração com objetos. Nesse sentido Gustavo Junqueira nos ensina: “Como argumento de reforço à interpretação restritiva da expressão “ato libidinoso” para fins de configuração do estupro, acrescentamos outro argumento: partindo da premissa que a lei não usa palavras inúteis, é necessário esforço interpretativo para entender por que a lei utiliza a expressão “conjunção carnal” “ou outro ato libidinoso”, já que a conjunção é, em si, ato libidinoso, e a redundância seria desnecessária.” (Direito Penal. 10ª edição. São Paulo, RT, 2010. p. 308-309).
Diante da inserção no mesmo tipo penal, o ato libidinoso constitui formula genérica que deve ser equiparada à conjunção carnal, a fórmula casuística. Mesmo que este juízo entenda que os fatos narrados na peça acusatória sejam verdadeiros, deve-se levar em consideração que o apelante não praticou nenhum outro ato libidinoso revestido de gravidade equivalente a conjunção carnal.
As condutas impróprias descritas na denúncia não podem ser consideradas crime hediondo.Se a ofensa à liberdade sexual é mínima, a atitude deve ser compreendida, no máximo, como importunação ofensiva ao pudor, desde que presentes as elementares da contravenção penal: Art. 61 da Lei de Contravenção Penal:
“Importunar alguém, em lugar público ou acessível ao público, de modo ofensivo ao pudor”.
A luz das provas produzidas nos autos pode-se constatar claramente que não estão presentes em nenhum momento os elementos da contravenção penal.
Uma vez não configurada sequer a contravenção penal, o fato é materialmente atípico.
Daí conclui-se que os atos narrados na denúncia são atípicos em face do artigo 217-A do Código Penal.
Mister ainda trazer a baila que se a condenação imposta pelo juiz “ a quo” ao apelante prevalecer, conseqüentemente os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade estarão sendo violados.
DO PEDIDO
Ante o exposto, requer-se a admissão do presente recurso e no mérito que a r.sentença monocrática seja reformada para absolver o apelante com fulcro no artigo 386, VII, do Código de Processo Penal.
Sendo superada a primeira tese requer-se, o colhimento da atipicidade, para absolver o apelante, haja vista a sustentação jurídica supramencionada, por ser medida de Direito e de Justiça.
Termos em que,Pede deferimento
Nestes Termos, Aguarda Deferimento.
Cidade, UF, data
OAB…..