Introdução
O Código de Processo Penal Militar (CPPM), instituído pelo Decreto-Lei nº 1.002, de 21 de outubro de 1969, constitui a base normativa que regula os procedimentos da justiça penal militar no Brasil. Diferentemente do processo penal comum, que segue as disposições do Código de Processo Penal (CPP), o CPPM apresenta particularidades próprias, refletindo a natureza e a estrutura das Forças Armadas e das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares estaduais.
No bojo dessa legislação, o Artigo 11 do CPPM assume papel relevante ao tratar da designação do escrivão do inquérito militar. Embora à primeira vista possa parecer um detalhe meramente burocrático, a escolha do escrivão e a obrigação de compromisso de sigilo representam garantias fundamentais para a regularidade, a legalidade e a imparcialidade da investigação.
Neste artigo, vamos analisar detalhadamente o conteúdo do Artigo 11, explorando sua importância, suas consequências práticas e sua conexão com os princípios constitucionais e processuais penais. Além disso, serão discutidas comparações com o processo penal comum, a função do sigilo no inquérito e o papel crucial desempenhado pelo escrivão na formalização dos atos processuais.

Texto do Artigo 11 CPPM
O dispositivo legal estabelece:
“Art. 11. A designação de escrivão para o inquérito caberá ao respectivo encarregado, se não tiver sido feita pela autoridade que lhe deu delegação para aquêle fim, recaindo em segundo ou primeiro-tenente, se o indiciado fôr oficial, e em sargento, subtenente ou suboficial, nos demais casos.
Parágrafo único. O escrivão prestará compromisso de manter o sigilo do inquérito e de cumprir fielmente as determinações dêste Código, no exercício da função.”
Atribuições e Funções do Escrivão no Inquérito Militar
1. O escrivão como garantidor da formalidade
O escrivão tem papel central na documentação e formalização dos atos do inquérito policial militar (IPM). Cabe a ele lavrar termos, certidões, registrar declarações, manter os autos organizados e assegurar que as diligências sejam devidamente documentadas.
Essa função é essencial, pois no processo penal — tanto comum quanto militar — os atos documentais constituem a prova formal das diligências realizadas. Sem a atuação do escrivão, a investigação ficaria comprometida pela falta de registro fidedigno.
2. Hierarquia e disciplina na escolha do escrivão
A lei prevê critérios específicos para a designação do escrivão, de acordo com a posição hierárquica do indiciado.
- Se o investigado for oficial, o escrivão deve ser primeiro ou segundo-tenente;
- Se o investigado for praça, o escrivão deve ser sargento, subtenente ou suboficial.
Essa regra assegura que não haja quebra da hierarquia militar e que as funções sejam exercidas em um ambiente de respeito ao posto ou graduação do investigado. Evita-se, por exemplo, que um soldado atue como escrivão em inquérito contra um coronel, o que poderia gerar constrangimentos ou comprometer a imparcialidade.
3. O compromisso de sigilo
O parágrafo único do artigo é categórico: o escrivão deve prestar compromisso de manter o sigilo do inquérito.
Esse sigilo é fundamental para:
- Preservar a honra do investigado;
- Garantir a eficácia da investigação, evitando vazamentos que prejudiquem diligências;
- Resguardar informações estratégicas das Forças Armadas ou da segurança pública.
Além disso, o escrivão se compromete a cumprir fielmente as determinações do CPPM, o que reforça sua responsabilidade funcional e legal.
A Importância do Escrivão no Inquérito Militar

1. Segurança jurídica
A presença do escrivão garante que todos os atos processuais tenham validade jurídica, já que o registro formal é requisito essencial para que os autos possam ser utilizados posteriormente em uma ação penal.
2. Transparência e imparcialidade
Ainda que o inquérito militar seja marcado pelo sigilo, a atuação do escrivão proporciona maior transparência, pois cria uma cadeia documental clara, onde é possível verificar as diligências realizadas e as ordens do encarregado.
3. Responsabilidade funcional
O escrivão é responsável não apenas pela escrita, mas também pela guarda e integridade dos autos do inquérito. Qualquer irregularidade em sua conduta pode comprometer a investigação e acarretar sanções disciplinares ou penais.
Comparação com o Processo Penal Comum
No processo penal comum, o escrivão de polícia exerce função semelhante à do escrivão no inquérito militar. Ambos são responsáveis pelo registro dos atos investigativos. No entanto, existem diferenças marcantes:
- Hierarquia: no CPPM, a designação leva em conta o posto ou graduação do indiciado, em respeito à disciplina militar. No CPP, essa preocupação não existe, pois não há estrutura hierárquica equivalente.
- Compromisso formal: no processo penal comum, o escrivão já assume, por força do cargo público, o dever de legalidade e sigilo. No CPPM, a lei exige um compromisso específico para cada inquérito, reforçando a gravidade da função.
- Estrutura organizacional: enquanto o escrivão da polícia civil é servidor de carreira, no âmbito militar a função pode ser exercida por diferentes patentes, o que reforça a flexibilidade, mas também exige cuidado na escolha.
O Sigilo do Inquérito Militar
O sigilo é um dos aspectos mais relevantes do artigo. Ele não apenas protege a investigação, mas também resguarda direitos fundamentais.
1. Proteção da honra do investigado
O militar investigado, até que haja denúncia formal, é presumido inocente. O sigilo evita exposição desnecessária de sua imagem e carreira.
2. Garantia da eficácia investigativa
Se informações sobre diligências fossem divulgadas, haveria risco de destruição de provas, fuga de envolvidos ou até ameaça a testemunhas.
3. Sigilo relativo
Embora o inquérito seja sigiloso para o público, isso não impede que a defesa do indiciado tenha acesso aos autos, conforme assegurado pela Constituição Federal (art. 5º, LXIII). Assim, o sigilo não é absoluto, mas relativo, equilibrando interesses públicos e privados.
Consequências do Descumprimento do Compromisso
O escrivão que violar o compromisso de sigilo ou não cumprir fielmente as determinações do CPPM pode ser responsabilizado em diferentes esferas:
- Administrativa/disciplinar: pode responder a processo administrativo disciplinar no âmbito da instituição militar.
- Penal: pode incorrer em crimes como violação de sigilo funcional (art. 326 do Código Penal Militar).
- Processual: os atos praticados com violação de normas podem ser anulados, comprometendo toda a investigação.
Relevância do Artigo 11 para a Justiça Militar

O artigo reforça três pilares essenciais da justiça militar:
- Hierarquia e disciplina;
- Formalidade dos atos processuais;
- Compromisso com a legalidade e o sigilo.
Sem a figura do escrivão, o inquérito policial militar perderia sua confiabilidade, já que a documentação das diligências é indispensável para o Ministério Público Militar oferecer denúncia ou arquivar o caso.
Perguntas Frequentes (FAQ)
1. Quem pode ser designado escrivão em um inquérito militar?
Depende da condição do indiciado:
- Se for oficial, deve ser primeiro ou segundo-tenente;
- Se for praça, deve ser sargento, subtenente ou suboficial.
2. O encarregado do inquérito sempre escolhe o escrivão?
Não necessariamente. A autoridade que delega o inquérito pode já designar o escrivão. Se não o fizer, a escolha será do encarregado.
3. Qual é a principal função do escrivão no IPM?
Registrar, formalizar e manter os autos do inquérito, garantindo sua integridade e validade jurídica.
4. O sigilo do inquérito impede o advogado do investigado de acessar os autos?
Não. A Constituição assegura à defesa acesso pleno aos autos, mesmo que o inquérito seja sigiloso em relação ao público externo.
5. O escrivão pode ser responsabilizado por vazamento de informações?
Sim. A violação do compromisso de sigilo pode gerar responsabilidade administrativa, penal e processual.
6. Qual a diferença entre o escrivão militar e o escrivão da polícia civil?
O escrivão civil é servidor de carreira; já no âmbito militar, a função é designada conforme o posto ou graduação do indiciado.
7. Existe prazo para designação do escrivão?
A lei não estipula prazo, mas a designação deve ocorrer de imediato, para que o inquérito possa se desenvolver regularmente.
8. O escrivão precisa assinar todos os atos do inquérito?
Sim. A assinatura do escrivão autentica os documentos e garante sua validade.
9. O escrivão pode atuar em mais de um inquérito ao mesmo tempo?
Pode, desde que seja formalmente designado e cumpra fielmente as funções em cada caso.
10. O que acontece se não houver designação de escrivão?
A ausência de designação compromete a validade dos atos processuais, podendo gerar nulidades.
Conclusão
O Artigo 11 do Código de Processo Penal Militar não é apenas um dispositivo burocrático, mas uma verdadeira garantia processual. Ele assegura que a investigação militar seja conduzida com respeito à hierarquia, à disciplina e à legalidade, além de resguardar os direitos fundamentais dos investigados.
O escrivão, ao assumir compromisso de sigilo e de fidelidade às normas do CPPM, torna-se peça-chave na engrenagem da justiça militar. Sua atuação é indispensável para que o inquérito policial militar tenha validade, transparência e eficácia, servindo de base sólida para o Ministério Público Militar e para o julgamento da Justiça Militar.
Para saber mais sobre a atuação em direito processual penal militar, visite nossa página de serviços.
E para acompanhar as últimas discussões jurídicas e atualizações sobre o processo penal militar, siga nossa página no Facebook.