Introdução: Acesso à Justiça como Pilar da Proteção Feminina
A Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, representa uma das maiores conquistas da sociedade brasileira na luta contra a violência doméstica e familiar. Criada com o propósito de proteger os direitos das mulheres e de combater práticas discriminatórias enraizadas na cultura patriarcal, a lei introduziu instrumentos jurídicos, assistenciais e preventivos fundamentais.
Entre seus dispositivos mais relevantes, destaca-se o Artigo 28, que assegura à mulher vítima de violência o direito de acesso à Defensoria Pública e à Assistência Judiciária Gratuita, tanto na fase policial quanto judicial, garantindo atendimento específico e humanizado.
Esse artigo simboliza a concretização do princípio constitucional do acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da CF/88), servindo como ponte entre a vítima e o Estado na busca por proteção, reparação e dignidade.
Em um contexto no qual muitas mulheres não possuem condições financeiras para contratar advogados particulares, a atuação da Defensoria Pública e de serviços de assistência jurídica gratuita é essencial para que o sistema de justiça se torne verdadeiramente inclusivo e igualitário.

🟣 1. O Texto Legal do Artigo 28 da Lei Maria da Penha
Art. 28. É garantido a toda mulher em situação de violência doméstica e familiar o acesso aos serviços de Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita, nos termos da lei, em sede policial e judicial, mediante atendimento específico e humanizado.
A norma é clara e objetiva: toda mulher vítima de violência doméstica deve ter assegurado o direito de acesso gratuito à justiça, sem distinção de renda, status social ou estado civil. O foco está no caráter humanizado do atendimento, o que representa um avanço civilizatório no tratamento da mulher em situação de vulnerabilidade.
🟣 2. O Acesso à Justiça e o Princípio da Igualdade Material
O artigo 28 concretiza o princípio da igualdade material, previsto no art. 5º da Constituição Federal, que impõe ao Estado a obrigação de tratar desigualmente os desiguais, garantindo condições reais para que todos possam exercer seus direitos.
Assim, a assistência jurídica gratuita não é um favor estatal, mas um direito fundamental, especialmente quando se trata de mulheres submetidas a situações de violência doméstica e familiar — circunstâncias que, muitas vezes, as afastam de sua autonomia econômica.
A previsão do artigo 28 busca, portanto, eliminar as barreiras financeiras e institucionais que impedem a mulher de buscar proteção e justiça.
🟣 3. A Importância da Defensoria Pública no Atendimento às Mulheres
A Defensoria Pública desempenha papel central na aplicação do artigo 28 da Lei Maria da Penha. Sua atuação vai além da representação judicial: ela envolve acolhimento, orientação jurídica, intermediação com órgãos de proteção e articulação com políticas públicas.
A atuação defensória deve observar os princípios da:
- Humanização do atendimento;
- Interdisciplinaridade, com apoio de assistentes sociais e psicólogos;
- Sigilo e respeito à intimidade da mulher;
- Celeridade, especialmente em casos que exigem medidas protetivas urgentes.
A Resolução nº 128/2018 do Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (CONDEGE) reforça a necessidade de atendimento especializado e humanizado para mulheres em situação de violência, alinhando-se integralmente ao comando do art. 28.
🟣 4. Atendimento Específico e Humanizado: Mais do que um Direito, uma Necessidade
O atendimento humanizado significa reconhecer que a mulher que busca ajuda não é apenas uma parte em processo judicial, mas uma pessoa que vive traumas, medo e vulnerabilidade emocional.
Assim, os profissionais que atuam na Defensoria Pública e nos núcleos de atendimento devem adotar uma postura empática, acolhedora e não revitimizadora.
🔹 Isso implica:
- Ouvir a vítima sem julgamentos;
- Garantir privacidade durante o atendimento;
- Explicar de forma clara seus direitos e os próximos passos;
- Evitar perguntas ou condutas que reforcem a culpa da vítima;
- Facilitar o acesso a redes de apoio (assistência social, saúde, abrigo, etc.).
O atendimento humanizado é o ponto de encontro entre o direito e a dignidade. Ele transforma a experiência da mulher diante do sistema de justiça, tornando-a mais respeitosa e eficaz.
🟣 5. A Defensoria Pública como Instrumento de Inclusão Social

Ao garantir o acesso gratuito à Defensoria Pública, o artigo 28 atua como instrumento de inclusão e justiça social, pois permite que mulheres em situação de vulnerabilidade possam:
- Solicitar medidas protetivas de urgência;
- Ingressar com ações de alimentos, guarda ou divórcio;
- Participar de processos criminais contra o agressor;
- Requerer indenizações por danos morais e materiais;
- Acompanhar o andamento processual sem custos.
Essas garantias fortalecem a autonomia feminina e combatem a impunidade, permitindo que a mulher rompa o ciclo da violência com o amparo jurídico necessário.
🟣 6. A Interligação do Artigo 28 com Outros Dispositivos da Lei Maria da Penha
O artigo 28 se conecta com outros dispositivos da lei, formando uma rede de proteção:
- Art. 9º: assegura assistência à mulher em situação de violência em áreas de saúde, segurança, educação e habitação;
- Art. 27: determina que, em todos os atos processuais, a mulher deve estar acompanhada de advogado;
- Art. 30: estabelece a necessidade de prioridade processual nos casos de violência doméstica.
Esses dispositivos, em conjunto, fortalecem a atuação da mulher no sistema de justiça e garantem um tratamento integral e digno.
🟣 7. Acesso em Sede Policial: O Primeiro Contato com o Estado
O artigo 28 menciona expressamente a sede policial como ponto inicial do atendimento. Isso significa que, ao registrar uma ocorrência, a mulher tem direito a:
- Ser orientada sobre a Defensoria Pública;
- Receber acompanhamento jurídico para medidas protetivas;
- Ter acesso a informações claras sobre o processo;
- Evitar ser constrangida ou descredibilizada.
Muitas Delegacias de Defesa da Mulher (DDM) já contam com núcleos da Defensoria Pública, o que possibilita respostas rápidas e acolhedoras, especialmente em casos de urgência.
🟣 8. Acesso em Sede Judicial: Garantia de Representação e Defesa Técnica
Na esfera judicial, a Defensoria atua de forma ativa e estratégica, representando a vítima em todos os atos do processo. Isso inclui:
- Protocolar pedidos de medidas protetivas;
- Representar a vítima em audiências e instruções;
- Requerer indenizações e reparações de danos;
- Monitorar o cumprimento das medidas impostas ao agressor.
O acompanhamento técnico da Defensoria impede que o processo se torne burocrático e distante da realidade da vítima, garantindo efetividade e justiça.
🟣 9. A Relevância do Atendimento Multidisciplinar
O art. 28 deve ser interpretado em conjunto com a política de atendimento multidisciplinar prevista no art. 29 da própria lei, que prevê equipes formadas por:
- Defensores(as) públicos(as);
- Psicólogos(as);
- Assistentes sociais;
- Profissionais de saúde e de segurança pública.
Essa integração assegura um olhar completo sobre a situação da mulher, contemplando dimensões jurídicas, emocionais, sociais e econômicas.
🟣 10. Jurisprudência e Entendimento dos Tribunais
A jurisprudência brasileira reconhece que a falta de acesso à Defensoria Pública pode configurar violação de direitos fundamentais.
Veja-se, por exemplo:
STJ – HC 525.476/SP (2020)
“A ausência de assistência jurídica gratuita a mulheres em situação de violência doméstica, quando comprovada sua vulnerabilidade, representa afronta aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do acesso à justiça.”
Esse entendimento reforça que o acesso à assistência jurídica gratuita é obrigatório, não podendo o Estado alegar falta de estrutura como justificativa.
🟣 11. Políticas Públicas e Avanços Recentes
Nos últimos anos, diversos estados brasileiros implementaram núcleos de atendimento integral à mulher, com atuação direta da Defensoria Pública.
Exemplos incluem:
- Nudem (Núcleo de Defesa da Mulher) – presente em várias Defensorias Estaduais;
- Centros de Referência de Atendimento à Mulher (CRAMs);
- Parcerias interinstitucionais com tribunais e secretarias estaduais.
Essas políticas ampliam o alcance do art. 28 e reduzem a subnotificação dos casos de violência doméstica.
🟣 12. Desafios e Perspectivas
Apesar dos avanços, ainda existem desafios estruturais e culturais:
- Falta de defensores em algumas regiões;
- Dificuldade de acesso em áreas rurais e comunidades ribeirinhas;
- Preconceito e desinformação sobre o papel da Defensoria Pública;
- Necessidade de capacitação contínua dos servidores.
Superar essas barreiras exige investimentos públicos, políticas de inclusão digital e campanhas de conscientização, garantindo que o artigo 28 seja plenamente efetivo em todo o território nacional.
🟣 Conclusão: O Artigo 28 como Garantia da Dignidade e da Cidadania Feminina

O Artigo 28 da Lei Maria da Penha é mais do que um dispositivo jurídico — é um instrumento de empoderamento e dignidade.
Ele reafirma que o Estado tem o dever de garantir o acesso efetivo à justiça, proporcionando atendimento gratuito, humanizado e especializado às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.
Cumprir o art. 28 é fazer justiça social, proteger direitos humanos e fortalecer a democracia.
A mulher que busca ajuda não deve enfrentar sozinha o sistema de justiça — ela tem o direito de ser ouvida, representada e respeitada.
🟣 FAQ – Perguntas Frequentes sobre o Artigo 28 da Lei Maria da Penha
🔸 1. O que significa “assistência judiciária gratuita” no contexto da Lei Maria da Penha?
Significa que a mulher vítima de violência doméstica tem direito a advogado gratuito, prestado pela Defensoria Pública, desde o registro da ocorrência até o julgamento do processo, sem precisar pagar custas ou honorários.
🔸 2. A Defensoria Pública pode atuar mesmo que a mulher tenha renda?
Sim. O critério principal é a vulnerabilidade decorrente da violência, e não apenas a renda. Mesmo mulheres com emprego formal podem ter direito à Defensoria se a situação as coloca em risco ou dependência econômica.
🔸 3. O atendimento precisa ser feito por profissional mulher?
Não obrigatoriamente, mas a preferência é recomendada para garantir conforto e empatia durante o atendimento. Muitas Defensorias contam com núcleos compostos majoritariamente por defensoras mulheres.
🔸 4. A mulher precisa de advogado para pedir medidas protetivas?
Sim. Segundo o art. 27 da Lei Maria da Penha, ela deve estar acompanhada de advogado, podendo ser um(a) defensor(a) público(a). Isso garante que o pedido seja bem fundamentado e processado com agilidade.
🔸 5. O que é atendimento humanizado?
É o atendimento baseado na escuta ativa, empatia e respeito, que busca compreender a situação da mulher sem julgamentos, garantindo privacidade, acolhimento e apoio integral.
🔸 6. Onde a mulher pode procurar ajuda jurídica gratuita?
Ela pode procurar a Defensoria Pública do Estado, os Núcleos de Atendimento à Mulher (Nudem), ou os Centros de Referência de Atendimento à Mulher (CRAMs). Em locais sem Defensoria, a OAB e faculdades de Direito podem prestar assistência gratuita.
🔸 7. O que fazer se não houver Defensoria Pública na cidade?
A mulher pode recorrer ao juiz da comarca, que determinará o encaminhamento do caso para assistência jurídica conveniada ou advogados dativos. A falta de estrutura não pode impedir o exercício do direito.
🔸 8. A Defensoria atua apenas em causas criminais?
Não. A atuação é ampla, abrangendo causas cíveis (como guarda, pensão, divórcio, partilha) e criminais, garantindo proteção integral à mulher e aos filhos.
🔸 9. É possível denunciar a ausência de atendimento humanizado?
Sim. A mulher pode registrar queixa junto à própria Defensoria Pública, à Ouvidoria da Mulher ou ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), relatando a falta de acolhimento ou eventuais condutas inadequadas.
🔸 10. O artigo 28 se aplica a mulheres trans?
Sim. O entendimento atual da doutrina e da Defensoria Pública é que a Lei Maria da Penha protege todas as pessoas que se identificam e vivem socialmente como mulheres, abrangendo também mulheres trans e travestis.
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