Agravo em execução

EXMO. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DE EXECUÇÕES PENAIS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

PROC. VEP: 10000006/048000-1

RG: 04138326-6

, já qualificado nos autos, vem, pelo Defensor Público infra assinado, não se conformando com a decisão de fls. 415 que indeferiu pedido de comutação interpor o presente recurso de

Agravo em Execução

com fulcro no art. 10007 da Lei 7210/84, pelos fundamentos de fato e de direito apresentados nas razões anexas.

Seguem, ainda, as peças a seguir relacionadas, necessárias à formação do instrumento:

Carta de Execução de Sentença, fls. 02;

Folha de cálculo de pena, fls.380/382

Ficha disciplinar, fls.30001/30002;

Decisão Agravada, fls.415

Parecer favorável do Conselho Penitenciário, fls.30007

Nestes Termos,

P. Deferimento.

Rio de Janeiro, 14 de novembro de 2019.

RAZÕES DE AGRAVANTE

Agravante: 

RG: 04.138.326-6

PROC. VEP: 10000006/0484000-1

EGRÉGIO TRIBUNAL, 

COLENDA CÂMARA 

Insurge-se a Agravante contra a r. decisão recorrida que indeferiu o pedido de COMUTAÇÃO DE PENA e, não obstante o brilho do magistrado que a proferiu, merece ser reformada pelas razões abaixo aduzidas:

Trata-se de Apenado condenado por infringência ao art. 157§3º, in fine c/c art. 2000, ambos do CP, na forma da Lei 8072/0000 à pena de 25 anos, que cumpriu mais de  1/3 da pena antes de 25/12/000000 e que não cometeu qualquer falta grave, conforme faz prova cópia do cálculo de pena e do histórico disciplinar. Ou seja, a Recorrente, com base no art. 2º do Decreto nº 3.226/000000 tem direito à comutação de pena, vez que preenche todos os requisitos objetivos e subjetivos necessários, a saber, lapso temporal, não cometimento de falta grave nos últimos doze meses, sendo certo que o parecer do Conselho Penitenciário é  favorável.

Contudo, o i. Juízo a quo, interpretando extensivamente norma que restringe direitos, entendeu que as restrições do art. 7º do Decreto Presidencial também se aplicam à comutação de pena, quando, por disposição expressa, o citado art. 7º somente é aplicável ao indulto. Em razão de tal entendimento, o benefício foi indeferido, em evidente desrespeito aos princípios insculpidos na Constituição da República Federativa do Brasil e no direito material e processual penal.

A fundamentação esposada na decisão ora agravada no sentido de que a comutação é uma forma de indulto parcial não merece prosperar, pois, comutação “é indulgência consistente em se mudar ou tocar (comutar) uma pena por outra. É substituir a primitivamente imposta, que era de caráter mais grave por outra mais benigna ou menos grave” (Vocabulário Jurídico, 4ª ed. Ed. Forense, de Plácido e Silva, PAG, 460), ao passo que indulto, derivado do latim indultus, significa perdoar, indulgenciar.

Cumpre consignar, também, a área de incidência dos efeitos de ambos, delimitando as suas consequências. Ora, a comutação é causa de DIMINUIÇÃO DA PENA, enquanto que o Indulto é causa de EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE, atingindo os efeitos executórios penais da condenação, abrangendo as medidas de segurança e as penas acessórias, inobstante deixe íntegros os efeitos da condenação na esfera da responsabilidade civil.

A par da lição de Mirabete, observando que o indulto pode ser total (ou pleno), ou parcial (ou restrito), ressalta que a Constituição “refere-se especificamente ao indulto e à comutação (art. 84, XII) atendendo a distinção formulada na doutrina: no indulto há o perdão da pena; na comutação se dispensa o cumprimento de parte da pena, reduzindo-se a aplicada, ou substituindo-se esta por outra menos severa” (Execução Penal, Atlas, 7ª ed., p. 417, grifei).

Como bem observou o Des. RICARDO BUSTAMANTE, apesar do ilustre professor admitir que o indulto parcial ou restrito recebe a denominação de comutação, “não foi por esse conceito que se guiou o legislador constitucional ao editar as regras de atribuições do Presidente da República. Lá, como visto, indulto e comutação são tratados de forma diferenciada porque espécies diferentes. A lei, e sobretudo a Carta Magna, não contêm palavras ociosas. Desse modo, se comutação fosse de fato o indulto parcial não haveria necessidade de a norma constitucional referir-se à comutação porque, se o Presidente já tem poderes para conceder o indulto total ou pleno, logicamente o tem para conceder o parcial, pois quem pode o mais pode o menos” (voto vencido no Agravo 371/2000, Primeira Câmara Criminal do TJRJ).

Além disso, brilhantemente, concluiu o ilustre Desembargador que “parece mais acertado definir indulto parcial, em contraste com o indulto total, como aquele que exclui determinados tipos de infração ou de penas, ou seja, o indulto pleno alcança indistintamente todos os condenados que preencham determinados requisitos objetivos e subjetivos, tais como cumprimento de certa parte da pena e ausência de falta grave, como vem acontecendo nos diversos decretos, enquanto o indulto parcial exclui algumas infrações ou alguns tipos de pena ou de regime de execução, como também vem acontecendo nos decretos anteriores quanto aos crimes tidos como hediondos.

Conforme citado no voto do eminente Desembargador, essa é a conceituação que faz o STF por sua 1ª Turma, in verbis:

“EMENTA: – Indulto coletivo – Latrocínio. Crime Hediondo.

Decreto presidencial nº 668, de 16/10/10000002.

Lei 8072/0000, de 25.07.0000.

  1. O Decreto presidencial, que concede indulto coletivo, pode ser parcial, ou seja, beneficiar os condenados por certos delitos e excluir por outros”. 

(HC 74.132/SP – Rel. Min. Sydney Sanches – grifos nossos)

Ao julgar Embargos Infringentes e de Nulidade nº 150/00 no Agravo 371/2000 (trechos do voto vencido acima citados), a E. Seção Criminal do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro se pronunciou no mesmo sentido, consoante se observa da ementa abaixo transcrita:

“EXECUÇÃO PENAL.

Comutação de Pena.

Segundo a Constituição Federal, indulto e comutação de pena são institutos distintos (art. 84, XII – “Compete ao presidente da República: XII- conceder indulto e comutar penas …”)

O decreto nº3226/000000 não vedou a comutação aos chamados crimes hediondos ou mesmo aos reincidentes. E, em assim sendo, faz jus o embargante a comutação de sua pena.

Embargos providos – voto vencido.

(Emb. Infring e Nulidade nº 150/00 – Relator Des. Salim José Chalub – por maioria – julg. em 0000/05/2012) (grifos nossos)

Mas, ainda que se entendesse que a comutação é uma espécie de indulto parcial, como vem decidindo o STJ, as regras de hermenêutica existentes não permitem concluir que as restrições do art. 7º do Decreto 3226/000000 se estendam à comutação de pena. Tal conclusão viola o senso lógico se observada a estrutura da redação do precitado decreto, bem como se comparado aos Decretos dos anos anteriores, que estendiam, expressamente, as restrições à concessão do indulto à comutação.

Como bem observou o brilhante Magistrado MOACIR PESSOA DE ARAÚJO, em trecho do seu voto, “a discussão sobre ter a comutação a natureza de indulto perde o sentido em face da estrutura da redação adotada no Decreto 3.226/000000”, concluindo, corretamente, que “está evidente que o Presidente da República teve em mira propiciar a comutação da pena nas hipóteses contempladas nos incisos I e V do artigo 7º, tendo em vista que nenhuma vedação foi incluída no diploma legal em foco, como ocorreu nos decretos indultantes anteriores”. 

Transcreve-se, por oportuno, a ementa da decisão da 7ª Câmara Criminal do E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, relatada pelo eminente magistrado:

“EXECUÇÃO PENAL. Decreto nº 3226/000000. Comutação de pena. Extorsão, mediante sequestro. Aplicabilidade. A discussão sobre ser a comutação espécie de indulto, contida nestes autos, perde todo o sentido em face da estrutura da redação adotada no Decreto nº 3226/000000. Neste decreto, quando  a matéria tratada se refere aos dois institutos, ou está consignada a expressão genérica “benefícios” (como se vê nos arts. 4º e 8º) ou está utilizada a expressão “indulto e comutação” (como se constata nos arts. 3º, 5º e 6º). Quando a matéria se refere apenas a um dos dois institutos, a referência é feita especificamente a ele, como se verifica nos §§ 1º e 2º do art. 1º e no art. 7º (indulto) e no parágrafo único do art. 5º (comutação). Assim, não há como se estender que a comutação, somente no art. 7º, esteja abrangida pela expressão “indulto”. (TJRJ – 7ª Câm. Crim. – por maioria – Agravo  2019.076.00831 – Rel. JDS Moacir Pessoa de Araújo – julg. em 24.04.2012) (grifos do original).

De outro lado, os decretos anteriores sempre consignaram, expressamente,  a impossibilidade de obtenção de Comutação aos delitos hediondos e equiparados, como se demonstra a seguir: a) o § único do art. 2º do Decreto 2838/0008 dispôs que “a comutação de pena prevista neste artigo não beneficia o condenado por crimes hediondos…”; b) o art. 8º do Decreto 2365/0007 disse que “ os benefícios previstos neste Decreto não alcançam…”; c) o art. 7º do Decreto 2002/0006 e o art. 7º do Decreto 1645/0005 dispuseram que “Este Decreto não beneficia…”.

De fato, a discussão sobre ter a comutação a natureza de indulto perde o sentido, pois foi clara a intenção do legislador de retirar a restrição relativa ao indulto da comutação de pena. 

Fugir do raciocínio aqui traduzido é violar a Constituição, é chamar a si ato privativo do chefe do Poder Executivo, conforme já mencionado no art. 84, VII da CRFB/88, é criar novo Decreto, impondo restrições inexistentes. Repita-se, a lei não contém palavras inúteis, não cabendo ao intérprete limitar, onde não há previsão legal.

Neste sentido, permite-se a defesa colacionar a ementa a seguir:

“O decreto concessivo de indulto deve ser interpretado em sentido amplo. Desde que o texto legal não faça restrição a que a comutação atinja aqueles que já a obtiveram anteriormente, ou os que se encontram gozando os benefícios do livramento condicional, nada impede que possam ser atingidos por nova comutação” ( TJSP rec. Rel. Weiss de Andrade, RJTJSP 33/247).

Cabe colacionar, ainda, recente decisão da 5ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça deste estado, no HC nº 3.204/000000, tendo como relator o Des. Sérgio Verani:

“H.C. EXECUÇÃO. COMUTAÇÃO DE PENA. DECRETO Nº 3.226, DE 2000.X.000000. APLICABILIDADE AO CONDENADO POR CRIME HEDIONDO. O Decreto nº 3.226/000000 (Indulto de Natal) estabelece que o “o indulto não alcança os condenados por crimes hediondos” (art. 7º, I), mas ao contrário dos Decretos anteriores, não estende tal restrição à comutação, cujos requisitos para o seu benefício estão limitados aos artigos 2º e 3º desse Decreto. 

Se a norma do art. 7º refere-se apenas ao indulto, não se pode ampliar o conteúdo dessa norma penal, criando-se uma restrição não prevista legalmente. A hermenêutica, em Direito Penal, é restrita, não se podendo estender o alcance da norma em desfavor do condenado, excluindo-se o seu direito à comutação. 

Ordem concedida parcialmente.” (Acórdão – H.C. nº 2012.05000.03204 – TJRJ – 5ª Câmara Criminal – Rel. Des. Sérgio Verani).

Face ao exposto, espera e confia que seja dado provimento ao recurso e reformada a decisão para conferir ao Agravante a COMUTAÇÃO, como forma de efetivação do respeito dos direitos fundamentais do homem em limitação ao poder de punir do Estado, refletindo-se tal decisão o acatamento ao princípio da legalidade.

Nestes Termos,

P. Deferimento

Rio de Janeiro, 14 de novembro de 2019.

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