Apelação Criminal

EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Processo:

Apelante:

Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

RAZÕES DE APELAÇÃO

Egrégio Tribunal,

Colenda Câmara,

Nobres Julgadores,

Douta Procuradoria de Justiça.

A r. sentença, condenou o apelante à pena de 05 (cinco) anos e 04 (meses) de reclusão, em regime inicial semiaberto e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, por, em tese, ter praticado o crime previsto no Art. 157 “caput” do Código Penal.

Data vênia, em que pese o conhecimento do MM. Juiz prolator da r. sentença, entende-se que não existem nos autos elementos necessários e irrefutáveis que ensejam tal decisão, conforme se passa a demonstrar.

I. DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE

No que tange aos requisitos extrínsecos, trata-se o presente recurso cabível e adequado, ante a r. sentença de fls. 217-228, assim como tem por satisfeito a tempestividade, dada a decisão do MM. Juiz, às fls. 242.

II. SÍNTESE DOS FATOS

Consta da exordial, que no dia 13 de dezembro de 2018, o apelante e outro, na Rua Alves de Almeida, altura do nº 800, por volta das 11:00, supostamente abordaram os entregadores Francisco Daniel Carneiro de Lima, Cícero Augusto de Oliveira e Washington Pereira Teixeira Ribeiro, e subtraíram certa quantidade de carteiras de cigarros.

Durante a instrução do apelante e outro, foram ouvidas novamente as testemunhas, a saber, as três vítimas e o um dos Policiais Militares que realizaram a prisão em flagrante dos acusados.

Finda a instrução, o ilustre magistrado, com base nas provas colhidas, sentenciou o apelado pena de 05 (cinco) anos e 04 (meses) de reclusão, em regime inicial semiaberto e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa, por, em tese, ter praticado o crime previsto no Art. 157 “caput” do Código Penal.

É desta decisão que se recorre.

III. DO DIREITO

A) DA FRAGILIDADE DAS PROVAS

No inquérito policial, no termo de depoimento às fls. 03-05, os policiais militares informaram que em patrulhamento de rotina, foram irradiados via COMPOM a respeito de um roubo a carga de cigarros e em patrulhamento localizaram um veículo com suspeito na Av. Taubaté, 1.250, onde se depararam com o apelante e outro, fazendo a descarga de caixas de cigarros e, após a abordagem e identificação, informam que o apelante e outro “confessaram informalmente” a participação no roubo, sendo dada voz de prisão em flagrante a ambos e um terceiro que teria feito a receptação da mercadoria.

De pronto, ressalto que outorgo valor probante aos depoimentos dos policiais, não vislumbrando empecilhos ou impedimentos em seus depoimentos, que devem ser analisados como os de qualquer outra pessoa, e, no caso em tela, nota-se algumas inconsistências nos depoimentos dos policiais, sobretudo no tocante à suposta confissão informal, vez que não há comprovação alguma a seu respeito nos autos.

Nesse sentido, segue entendimento do Tribunal de Justiça de Sergipe:

DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL – HOMICÍDIO QUALIFICADO NAS FORMAS CONSUMADA E TENTADA – SENTENÇA DE IMPRONÚNCIA – MATERIALIDADE DELITIVA COMPROVADA – INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA – DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS BASEADOS EM SUPOSTA CONFISSAO INFORMAL DE CORRÉU – INVALIDADE – TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA – IMPRONÚNCIA CABÍVEL – ARTIGOS 413 E 414 DO CPP. I – Não são válidos para configurar os indícios suficientes de autoria os depoimentos dos policiais que fazem referência à suposta confissão informal de corréu, na qual é identificado como mandante do crime o Apelado, porquanto aquela não tem validade por violar o disposto no art. 5º, incisos LVI e LXIII, da CF/88, e no art. 6º, V, do CPP, sendo aplicável, neste caso, a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada. II – Ausentes os requisitos autorizadores da pronúncia, cabe ao juiz impronunciar o denunciado, com fulcro nos artigos 413 e 414 do CPP. III – Apelação Criminal conhecida e improvida. Unânime.

(TJ-SE – ACR: 2010310446 SE, Relator: DES. EDSON ULISSES DE MELO, Data de Julgamento: 31/08/2010, CÂMARA CRIMINAL)

Oportunamente ressalto que as razões do apelante não se fundam tão somente na incerteza e inconsistência dos depoimentos dos policiais que alegam a confissão informal, mas em todo um conjunto de fatos que afasta a certeza de autoria do delito ao apelante imputado.

Às fls. 06 do referido inquérito policial, a testemunha Francisco Daniel Carneiro de Lima, em seu depoimento relata toda a dinâmica do roubo, e após seu depoimento, passou-se ao reconhecimento pessoal do apelante e outro réu, que estavam no Distrito Policial, neste momento a testemunha NÃO RECONHECEU NENHUM DELES COMO SENDO UM DOS AUTORES DO ROUBO sofrido na data.

Essa mesma declaração foi dada pelas outras das vítimas: Cícero Augusto de Oliveira Santos, as fls. 07, e Washington Pereira Teixeira Ribeiro, as fls. 08, ambos declararam, no reconhecimento pessoal que NÃO RECONHECERAM NENHUMA DAS PESSOAS PERFILADAS COMO AUTORES DO ROUBO.

Cumpre ressaltar que as três testemunhas estiveram presentes também na audiência de instrução, onde ratificaram o depoimento dado em sede policial, desse modo resta evidente a dúvida e a incerteza quanto à participação e culpa do apelante no ato ilícito.

No processo penal, a dúvida não pode militar em desfavor do réu, haja vista que a condenação requer a demonstração cabal da autoria do crime, e aqui não há sequer que se falar em dúvida, vez que as três testemunhas, tanto em sede policial, quanto na audiência de instrução, alegaram com certeza não reconhecer nenhum dos dois acusados como autores do roubo.

Na hipótese de constarem nos autos elementos de prova que conduzam a dúvida acerca do crime, a absolvição é medida que se impõe, em observância ao princípio do in dubio pro reo, fundamental do direito penal que prevê o benefício da dúvida em favor do réu, e o não reconhecimento do apelante, por duas vezes, por todas as três vítimas do roubo, traz dúvidas razoáveis sobre a culpa do apelante.

É pertinente demonstrar o entendimento jurisprudencial acerca do tema:

Roubo duplamente majorado. Subtração, mediante grave ameaça, exercida com emprego de arma de fogo e concurso de pessoas, de roupas e correntes de estabelecimento comercial. Pretendida absolvição por insuficiência de prova. Admissibilidade. Dúvida quanto à autoria. Acusado não reconhecido pela vítima. Negativa em juízo. Ausência de certeza para firmar condenação criminal. Princípio do in dubio pro reo. Apelo provido para absolvê-lo com base no artigo 386, VII, do CPP.

(TJ-SP – APL: 00045946220118260587 SP 0004594-62.2011.8.26.0587, Relator: Otávio de Almeida Toledo, Data de Julgamento: 27/08/2013, 16ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 29/08/2013)

Apelação. Roubo. Sentença absolutória. Insurgência ministerial. Pleito de condenação. Inviabilidade. Acusado não reconhecido pela vítima ou por testemunhas presenciais. Negativa do réu. Dúvida a prevalecer em favor do acusado. Absolvição mantida. Apelo ministerial improvido.

(TJ-SP – APL: 00031691020148260097 SP 0003169-10.2014.8.26.0097, Relator: Guilherme de Souza Nucci, Data de Julgamento: 23/02/2016, 16ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 23/02/2016)

Ainda, em seu depoimento em sala de audiência, segundo fls. 220-221, a vítima Francisco Daniel Carneiro de Lima disse que não houve emprego de arma, às fls. 221 a vítima Cícero Augusto de Oliveira Santos alega que “ele não mostrou arma nem fez menção de estar armado”, e ainda ao ratificar que não reconhecia os acusados, diz que “não possuem o mesmo porte físico, acredita que não sejam eles”. Por fim, a policial militar Priscila Salino, às fls. 221-222 em seu depoimento diz que “a vestimenta informada não coincidia com a de nenhum dos réus” (grifo nosso).

Corroborando os fatos narrados, cita-se entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo:

Roubo (art. 157, § 1º, do cp). Emprego de grave ameaça após a subtração de uma garrafa de bebida alcoólica. Pretendida absolvição por insuficiência de prova. Admissibilidade. Dúvida quanto à autoria. Acusado não reconhecido pela vítima, igualmente não se colhendo de outros depoimentos segurança quando à autoria delitiva. Ausência de certeza para firmar condenação criminal. Princípio do in dubio pro reo. Apelo provido para absolvê-lo com base no artigo 386, VII, do CPP.

(TJ-SP – APL: 00005124220098260624 SP 0000512-42.2009.8.26.0624, Relator: Otávio de Almeida Toledo, Data de Julgamento: 30/08/2016, 16ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 31/08/2016)

“APELAÇÃO CRIMINAL – ROUBO QUALIFICADO – AUSÊNCIA DE PROVAS INEQUÍVOCAS DA AUTORIA – ABSOLVIÇÃO COM BASE NO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. – “A prova colhida na fase investigativa apta a sustentar uma condenação deve ser confirmada em juízo e, ainda, estar em consonância com os demais elementos probatórios, sob pena de ofensa ao princípio do contraditório assegurado pela Constituição Federal. – Existindo dúvidas quanto à autoria, a absolvição é medida que se impõe, por força do princípio do in dubio pro reo. ” (TJ-MG – APR: 10024088399886001 MG Relator: Silas Vieira, Data de Julgamento: 16/07/2013, Câmaras Criminais / 1ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 26/07/2013) (grifo nosso)

B) DA DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME

Importante também elucidar, que o apelante, em seu depoimento em audiência ás fls. 222, informou que possui dois estabelecimentos comerciais, um bar e uma adega e afirma não ter nenhuma participação no roubo, apenas havia comprado os cigarros de um rapaz que os ofereceu e se identificou apenas como “Tito”, com o qual negociou a compra e foi abordado pelos policiais militares enquanto descarregava a mercadoria negociada. O apelante não tinha noção da quantidade de carteiras de cigarros, iria fazer a contagem após descarregar, conhecia o “Tito” por ser cliente, frequentador da adega, motivo pelo qual, não imaginou que pudesse ser produto de roubo.

Ademais no que tange a grave ameaça, não consta nada nos autos, nenhuma prova robusta de que em algum momento o roubo foi cometido de forma ameaçadora em desfavor das vítimas, como relato dos próprios, supra mencionado, mais uma vez, devendo se valer em seu favor o princípio do in dubio pro reo, consagrado em nossa Carta Magna.

Restando assim, nenhuma outra medida a ser imposta, senão a desclassificação do crime de roubo, previsto no Art. 157 “caput” do Código Penal, vez que o apelante apenas negociou a compra dos cigarros, sem saber a procedência dos produtos.

APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO MAJORADO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA RECEPTAÇÃO. EMENDATIO LIBELLI. DEFINIÇÃO JURÍDICA DIVERSA DADA AOS FATOS DESCRITOS NA DENÚNCIA QUE FORAM COMPROVADOS. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. APELO PROVIDO. 1. “O réu se defende dos fatos que são descritos na peça acusatória, e não da capitulação jurídica dada na denúncia. Assim sendo, a adequação típica pode ser alterada tanto em primeira instância quanto em segundo grau, via emendatio libelli.”

(STJ, AgRg no HC 201343/RS). 2. Os fatos narrados na denúncia que foram comprovados durante a instrução criminal se adequam à definição jurídica do delito capitulado no art. 180, caput, do CPB, sendo de rigor proceder à

emendatio libelli, com a consequente desclassificação do crime de roubo majorado pelo emprego de armas e concurso de agentes para receptação simples. 3. De acordo com a Súmula 269 do Superior Tribunal de Justiça, somente é admissível a adoção do regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais, o que não se verifica no caso concreto, devendo ser mantido o regime estabelecido na sentença recorrida. 4. Recurso a que se dá provimento. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso e lhe dar provimento, para desclassificar o crime de roubo majorado para receptação simples, e em consequência reduzir a pena aplicada de 8 (oito) anos e 4 (quatro) meses de reclusão e 16 (dezesseis) dias-multa para 2 (dois) anos e 15 (quinze) dias de reclusão e 11 (onze) dias-multa, nos termos do voto da Relatora. Fortaleza, 20 de março de 2018

DESEMBARGADORA MARIA EDNA MARTINS Presidente do Órgão Julgador e Relatora.

(TJ-CE 01032965820158060167 CE 0103296- 58.2015.8.06.0167, Relator: MARIA EDNA MARTINS, Data de Julgamento: 20/03/2018, 1ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 20/03/2018)

E ainda, se este não for o entendimento dos ilustres julgadores, deve-se ressaltar, no que tange a grave ameaça, que sobre tal, não consta nada nos autos, nenhuma prova robusta de que em algum momento o roubo foi cometido de forma ameaçadora em desfavor das vítimas, como relato dos próprios.

Restando assim, nenhuma outra medida a ser imposta, senão, em último

caso, a desclassificação do crime de roubo, previsto no Art. 157 “caput” do Código Penal, que prevê para sua classificação a “grave ameaça ou violência a pessoa”, ora se pelas declarações das vítimas em audiência, em nenhum momento é dito que ouve violência ou grave ameaça, não há como se proceder ao perfeito enquadramento dos fatos no tipo penal do Art. 157, “caput” do códex, sendo, no máximo e ainda assim longe da medida de justiça, a desclassificação, em último caso, para crime de furto simples, previsto no Art. 155, “caput” do Código Penal.

Nesse sentido:

PENAL – ROUBO SIMPLES – AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE COMPROVADAS – DESCLASSIFICAÇÃO DO FATO PARA FURTO SIMPLES – POSSIBILIDADE – DOSIMETRIA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. – Em face de ambiguidade das provas produzidas nos autos, não passando de mera suspeita a imputação ao apelante da prática de violência durante a subtração, deve-se proceder à desclassificação do fato para o crime de furto simples, tipificado no art. 155, caput, do Código Penal. – Recurso parcialmente provido.

(TJ-MG – APR: 10049150007059001 MG, Relator: Corrêa Camargo, Data de Julgamento: 09/08/2017, Câmaras Criminais / 4ª CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 17/08/2017)

E ainda:

APELAÇÃO CRIMINAL. ROUBO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA FURTO. AUSÊNCIA DE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA. POSSIBILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. NÃO OCORRÊNCIA. DIREITO DE RECORRER EM LIBERDADE. CUSTAS PROCESSUAIS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I – Verificado que a prova coligida não demonstra as elementares do emprego de violência ou grave ameaça capazes de caracterizar o crime de roubo, impõe-se desclassificação da conduta para furto simples. II – Comprovadas a materialidade e a autoria, bem como o intuito do apelante em se apossar de bens alheios, a condenação é medida que se impõe. III – A desclassificação do delito de roubo para o de furto simples não implica na atipicidade da conduta, pois a prova dos autos não deixa dúvida de que a vontade do apelante era dirigida à subtração dos bens da vítima. IV – Correta a manutenção da prisão do recorrente quando mantidos os requisitos que ensejaram a segregação. V – O Juízo das execuções é o competente para decidir eventual pedido de isenção do pagamento de custas processuais. VI – Recurso conhecido e parcialmente provido.

(Acórdão n. 620007, 20110310360588APR, Relator NILSONI DE FREITAS, 3ª Turma Criminal, julgado em 06/09/2012, DJ 21/09/2012 p. 398)

IV. DOS PEDIDOS

Ante o exposto, requer seja o presente recurso recebido e provido, para que se determine:

  1. Seja totalmente reformada a r. sentença, julgando procedente a apelação, determinando a absolvição do apelante, nos termos do Art. 386, V e VII do

Código de Processo Penal;

  1. Não sendo esse o entendimento, requer a desclassificação do crime de roubo previsto no Art. 157, “caput” para o crime de receptação, do Art. 180 ambos do Código Penal.
  2. Ainda e, tão somente se não for nenhum dos entendimentos acima o dos nobres julgadores, requer a desclassificação para o crime de furto simples, previsto no Art. 155, “caput” do Código Penal, pois embora não provada a autoria, também não resta provada a elementar do crime de roubo.
  3. Requer ainda, se entendido que houve infração penal, seja feita a aplicação da substituição da pena restritiva de direitos, haja vista o apelante, após acolhimento de um dos pedidos subsidiários, preencher todos os requisitos que autorizam a conversão, conforme disposto no Art. 44 do Código Penal.

Termos em que,

Pede deferimento

Local / Data

Advogado

OAB/SP

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