Artigo 7º do Código Penal Militar Territorialidade e Extraterritorialidade 1

Artigo 7º do Código Penal Militar: Territorialidade e Extraterritorialidade

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Introdução

A aplicação da lei penal no espaço é um dos temas mais relevantes do Direito Penal, especialmente quando se trata da jurisdição militar, que opera em contextos específicos e frequentemente além das fronteiras territoriais do Estado. O Artigo 7º do Código Penal Militar (CPM) trata da territorialidade e da extraterritorialidade da lei penal militar, prevendo as hipóteses em que esta se aplica tanto dentro quanto fora do território nacional, inclusive em situações envolvendo aeronaves e embarcações militares brasileiras e estrangeiras.

Esse artigo tem importância estratégica, pois amplia o alcance da jurisdição penal militar a fim de garantir a integridade, a disciplina e a proteção das instituições militares, mesmo em espaços atípicos e transnacionais.

Neste artigo jurídico, discutiremos detalhadamente:

  • A territorialidade da lei penal militar;
  • As hipóteses de extraterritorialidade;
  • A extensão territorial a embarcações e aeronaves;
  • A aplicabilidade em naves estrangeiras;
  • O conceito jurídico de navio militar;
  • As consequências práticas e jurídicas da aplicação do art. 7º do CPM;
  • E, por fim, uma seção de perguntas frequentes (FAQ).

1. Redação do artigo 7º do Código Penal Militar

Art. 7º Aplica-se a lei penal militar, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido, no todo ou em parte no território nacional, ou fora dele, ainda que, neste caso, o agente esteja sendo processado ou tenha sido julgado pela justiça estrangeira.

§ 1° Para os efeitos da lei penal militar consideram-se como extensão do território nacional as aeronaves e os navios brasileiros, onde quer que se encontrem, sob comando militar ou militarmente utilizados ou ocupados por ordem legal de autoridade competente, ainda que de propriedade privada.

§ 2º É também aplicável a lei penal militar ao crime praticado a bordo de aeronaves ou navios estrangeiros, desde que em lugar sujeito à administração militar, e o crime atente contra as instituições militares.

§ 3º Para efeito da aplicação deste Código, considera-se navio toda embarcação sob comando militar.


2. Territorialidade: a regra geral

O caput do artigo 7º estabelece como regra a aplicação da lei penal militar aos crimes cometidos no território nacional, no todo ou em parte. Trata-se do princípio da territorialidade, amplamente aceito no Direito Penal.

Finalidade

Esse princípio visa a garantir a soberania estatal sobre os fatos criminosos praticados dentro do território nacional, sendo a Justiça Militar o foro competente quando os crimes atentam contra a hierarquia, a disciplina ou outras normas específicas das instituições militares.


3. A exceção: extraterritorialidade da lei penal militar

Ainda no caput, o dispositivo prevê a aplicação da lei penal militar a crimes cometidos fora do território nacional, inclusive nos casos em que o agente esteja sendo processado ou já tenha sido julgado no exterior.

Justificativas:

  • Defesa da soberania e da ordem institucional militar;
  • Reforço da disciplina em missões no exterior;
  • Aplicação da legislação brasileira para militares em território estrangeiro (missões de paz, intercâmbios, operações conjuntas).

Situações típicas:

  • Crimes cometidos por militar brasileiro em missão oficial fora do Brasil;
  • Condutas ofensivas às instituições militares em bases estrangeiras com jurisdição compartilhada;
  • Repressão a deserções, insubordinações ou violações de ordens durante operações externas.

4. A primazia da soberania nacional: mesmo diante de julgamento estrangeiro

O artigo 7º ressalta que a aplicação da lei penal militar independe de o agente ter sido julgado ou estar sendo processado no exterior. Isso significa que, ainda que o militar tenha sido responsabilizado penalmente por um tribunal estrangeiro, a jurisdição penal militar brasileira pode se sobrepor — respeitando os limites de convenções internacionais.

Repercussão:

  • Possibilidade de dupla persecução penal (no Brasil e no exterior);
  • O julgamento estrangeiro não impede a responsabilização sob a legislação militar brasileira;
  • Reforço à ideia de que os militares brasileiros, em qualquer lugar do mundo, estão sujeitos às leis nacionais.

5. A aplicação subsidiária das convenções e tratados internacionais

O caput ressalva a aplicação da lei penal militar “sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional”. Isso significa que, havendo tratado internacional em sentido contrário, a norma internacional prevalecerá, conforme o princípio da primazia do direito internacional convencional sobre a lei infraconstitucional (art. 5º, §2º, CF).


6. O §1º e o conceito de “território por extensão”

O §1º do artigo 7º amplia o conceito de território nacional ao incluir aeronaves e navios brasileiros sob comando militar ou ocupados por ordem legal, mesmo quando estejam:

  • Em águas internacionais;
  • Em espaço aéreo estrangeiro;
  • Fundados em portos estrangeiros;
  • Em trânsito ou operação conjunta fora do país.

Implicações práticas:

  • A aplicação da lei penal militar acompanha o militar em qualquer parte do mundo, desde que ele esteja em ambiente juridicamente considerado nacional;
  • A jurisdição militar pode ser exercida sobre crimes praticados em aviões militares, navios de guerra ou aeronaves civis sob ordem militar;
  • Inclui aeronaves ou embarcações privadas ocupadas militarmente por ordem legal.

7. A natureza da ocupação militar

A ocupação militar referida no §1º deve estar baseada em ordem legal de autoridade competente, o que exige:

  • Documento oficial (ordem de missão, portaria, despacho);
  • Destinação da embarcação ou aeronave a fins militares (transporte de tropas, armamentos, logística, comando).

A embarcação ou aeronave pode ser de propriedade privada, desde que esteja formalmente afetada a uso militar temporário.


8. O §2º: ampliação da jurisdição em aeronaves ou navios estrangeiros

O §2º trata de uma hipótese de excepcional extraterritorialidade, prevendo que a lei penal militar se aplica a crimes cometidos em navios ou aeronaves estrangeiros, desde que:

  1. O crime ocorra em local sujeito à administração militar brasileira;
  2. O crime atente contra as instituições militares brasileiras.

Situações abrangidas:

  • Embarcações estrangeiras atracadas em bases navais brasileiras;
  • Aeronaves estrangeiras pousadas em aeroportos militares sob jurisdição nacional;
  • Missões conjuntas ou compartilhadas com controle militar brasileiro.

Requisitos cumulativos:

Ambos os requisitos devem estar presentes: jurisdição brasileira e lesão a interesses militares. Essa norma visa proteger a ordem militar em ambientes multinacionais ou fronteiriços.


9. O §3º: conceito de navio militar

“Para efeito da aplicação deste Código, considera-se navio toda embarcação sob comando militar.”

Este parágrafo é essencial para diferenciar embarcações comuns de navios militares. A definição não depende da propriedade (pública ou privada), mas sim da presença de:

  • Comando militar designado oficialmente;
  • Destino funcional vinculado a atividades militares.

Essa definição jurídica é estratégica para:

  • Aplicar a lei penal militar a condutas praticadas a bordo;
  • Estabelecer a jurisdição correta no julgamento de infrações.

10. Exemplos práticos de aplicação do artigo 7º

a) Crime cometido por militar em missão no exterior

Um sargento brasileiro em missão de paz no Congo pratica violência contra colega de farda. Ainda que o país anfitrião o processe, o Brasil poderá julgar o caso na Justiça Militar, com base no art. 7º.

b) Crime praticado a bordo de navio militar brasileiro em águas internacionais

Durante travessia atlântica, um marinheiro agride superior hierárquico. Mesmo em alto-mar, o fato ocorre em território nacional por extensão, sendo competente a Justiça Militar.

c) Crime praticado por civil a bordo de navio militar

Um civil a bordo de navio da Marinha (sob convite oficial) pratica furto contra militar. Se o ato afetar a ordem militar, o civil poderá ser julgado pela Justiça Militar (art. 9º c/c art. 7º).


11. Jurisprudência sobre o artigo 7º

STM – Precedente 1:

“A jurisdição da Justiça Militar da União aplica-se aos fatos ocorridos em território estrangeiro, desde que praticados por militares da ativa e relacionados às funções castrenses.”
(STM, Apelação nº XXXXXX)

STM – Precedente 2:

“Ainda que o crime tenha ocorrido em embarcação de uso misto, sob regime de comando militar, aplica-se a norma do art. 7º, §1º, do CPM.”
(STM, HC nº XXXXXX)


12. Discussões doutrinárias

A doutrina penal militar reconhece que o artigo 7º reflete:

  • O princípio da personalidade ativa, segundo o qual o militar é sempre responsável por seus atos, onde quer que esteja;
  • A preservação da ordem castrense como valor superior ao princípio da territorialidade restrita;
  • A necessidade de proteger a soberania e integridade funcional das Forças Armadas no plano internacional.

Autores como Célio Lobão, Paulo Tavares e Ademar de Queiroz apontam que o dispositivo está em consonância com os padrões do Direito Penal Internacional e das Convenções de Genebra.


13. Limites da aplicação da lei penal militar no exterior

Apesar de seu alcance, o artigo 7º deve ser interpretado conforme:

  • Tratados internacionais ratificados pelo Brasil (ex.: acordos SOFA – Status of Forces Agreement);
  • Princípios de soberania dos Estados estrangeiros;
  • Regras de não bis in idem (proibição de dupla punição pelo mesmo fato).

O Ministério Público Militar e o STM devem atuar em colaboração internacional, quando necessário.


14. Reflexos na prática forense militar

O art. 7º impacta diretamente:

  • A competência da Justiça Militar da União em processos transnacionais;
  • A atuação da Defensoria Pública Militar em missões internacionais;
  • A cooperação jurídica internacional entre o Brasil e outros países;
  • A aplicação de leis militares em embarcações civis temporariamente militarizadas.

FAQ – Perguntas Frequentes sobre o Artigo 7º do Código Penal Militar

1. O que estabelece o artigo 7º do CPM?
Define que a lei penal militar se aplica a crimes cometidos no Brasil e também fora dele, mesmo que o agente já tenha sido julgado no exterior.

2. O que é “território nacional por extensão”?
São aeronaves e navios brasileiros sob comando militar ou ocupados por ordem legal, mesmo no exterior.

3. Um crime cometido em missão de paz no exterior pode ser julgado no Brasil?
Sim. A Justiça Militar da União pode julgar militares por crimes praticados no exterior.

4. Se um navio é privado, mas está em uso militar, aplica-se o CPM?
Sim, desde que haja ordem legal de ocupação ou comando militar.

5. Um crime cometido em navio estrangeiro pode ser julgado pela Justiça Militar?
Sim, desde que o local esteja sob jurisdição militar brasileira e o crime atente contra instituições militares.

6. O que significa “crime contra instituições militares”?
São infrações que violam a disciplina, a hierarquia ou a integridade funcional das Forças Armadas.

7. O julgamento estrangeiro impede o julgamento militar no Brasil?
Não. A jurisdição militar brasileira pode se sobrepor, salvo tratado em sentido contrário.

8. Qual o conceito de “navio” para fins do CPM?
Toda embarcação sob comando militar, independentemente da propriedade.


Conclusão

O artigo 7º do Código Penal Militar é uma das normas mais complexas e estratégicas do ordenamento jurídico castrense. Ao tratar da territorialidade e extraterritorialidade da lei penal militar, o dispositivo reforça a soberania do Estado brasileiro sobre seus militares, garantindo que a disciplina e a ordem institucional sejam preservadas, mesmo fora das fronteiras nacionais.

Com a ampliação do conceito de território para incluir navios e aeronaves, e com a previsão de jurisdição sobre crimes praticados em ambientes estrangeiros ou multinacionais, o artigo 7º reafirma o papel central das Forças Armadas como instituições permanentes e essenciais ao Estado. Sua correta aplicação é essencial para a segurança jurídica, a justiça penal e a proteção da soberania nacional.

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